Inquilinos acusam Governo de “opções lamentáveis”
Associações de inquilinos dizem que em matéria de arrendamento houve falta de lucidez e que as medidas em vigor trouxeram ainda mais desequilíbrios aos arrendatários
As três associações que representam inquilinos em Portugal ainda não desistiram de convencer o Governo a alterar as leis que já estão em vigor com vista a apoiar inquilinos e proprietários a lidar com os efeitos da pandemia da covid-19.
Numa altura em que falta ainda publicar a portaria regulamentar que vai definir os critérios de demonstração de perda de rendimentos para justificar a mora no pagamento das rendas, assim como as condições dos empréstimos sem juros que poderão ser contraídos junto do Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), os inquilinos assinam um comunicado onde deixam vários comentários à lei em causa, e às implicações que esta vai ter na vida dos inquilinos, para voltar a insistir que haja mudanças.
“A exemplo de que se fez com o regime do layoff para simplificar a sua aplicação, também neste regime de excepção aplicado ao arrendamento o Governo tem todo o espaço e tempo para o corrigir”, argumentam.
A AIL - Associação dos Inquilinos Lisbonenses, a AICNP - Associação dos Inquilinos e Condóminos do Norte de Portugal e a INQUISET - Cooperativa de Inquilinos de Setúbal recordam que “não reclamaram ou incentivaram o não pagamento das rendas”, mas antes propuseram “medidas apropriadas que atenuariam as situações resultantes da redução ou mesmo ausência de rendimentos dos inquilinos habitacionais e não habitacionais”.
Por isso recordam que nem o Governo nem a Assembleia da República mostraram disponibilidade para discutir ou acatar sugestões de alteração, e lamentam que hoje em dia esteja em vigor uma lei aprovada “com uma minoria de votos favoráveis, unicamente o dos deputados do Partido Socialista, beneficiando da abstenção, concordante, de outros deputados”.
Forçam ainda o tom de crítica, sublinhando que a actual legislação causa desigualdades entre inquilinos, uma vez que acaba por discriminar positivamente os arrendatários do sector público, onde se pode isentar, acordar ou reduzir a renda. Já os inquilinos do sector não público terão de pagar sempre a totalidade da renda, tendo como alternativa a contracção de empréstimos junto do IHRU, “em montantes e condições que se desconhecem”.
“Os inquilinos que se endividarem junto do IHRU, quando acabar o estado de emergência, terão de pagar a renda normal mais a amortização do empréstimo, ficando sujeitos a um grande esforço mensal, durante pelo menos, 12 meses”, recordam as três associações.
Para as associações e para os inquilinos, a lei aprovada resulta de uma decisão “absolutamente lamentável”, por obrigar a que “as rendas tenham de ser pagas pelo seu valor habitual e na totalidade aos senhorios (particulares, fundos imobiliários, bancos, seguradoras, especuladores, fundações, etc.), independentemente das possibilidades dos inquilinos”, e por ter completamente descurado “de reclamar junto dos senhorios institucionais – fundos imobiliários, bancos, seguradoras, especuladores, fundações, etc., - a obrigação de contribuir com a sua quota-parte para a situação do estado de emergência, podendo abdicar de uma parte das rendas no período”.
Também as regras avançadas para o arrendamento não habitacional merecem duras críticas das associações, que acusam o Governo de ter “mão pesada” e mesmo “falta de lucidez”, ao determinarem que o pagamento dos encargos com as rendas não pagas se iniciem ou vençam um mês após o termo do estado de emergência,"ignorando que não será possível recuperar e estabilizar os rendimentos das actividades fechadas em tão curto período”.
Segundo os inquilinos, a lei em vigor “não descarta, antes obriga, ao pagamento da renda em caso da não retoma da actividade arrendatária, pressionando violentamente os inquilinos” e “sanciona com despejo se o inquilino não pagar as rendas vencidas face à situação criada e imposta pela declaração de estado de emergência”.
Os inquilinos admitem que tendo de haver empréstimos, estes devem ser contraídos exclusivamente pelos senhorios “na medida em que são os credores das rendas, podendo assim contratualizar empréstimos e, se exigível, têm a propriedade para os garantir”.