Ordem dos Médicos recomenda separar doentes oncológicos com covid-19 e suspender radioterapia
Os colégios da especialidade da Ordem dos Médicos fazem recomendações sobre as restrições e cuidados a ter para limitar o risco de infecção. A ordem é rastrear à chegada os doentes oncológicos para evitar ao máximo contágios e deve ser ponderada a suspensão da radioterapia em casos positivos, sempre que possível.
Os doentes oncológicos não podem deixar de ser seguidos e tratados durante a pandemia de covid-19. Mas também é preciso evitar ao máximo que se contagiem. Conciliar as duas prioridades é o grande desafio. Por isso, é fulcral que todos façam um rastreio clínico à entrada dos hospitais e dos IPO e que, aqueles que tiverem sintomas como febre, tosse e falta de ar, sejam submetidos a testes laboratoriais para se perceber se estão ou não infectados com o novo coronavírus, defende a direcção do colégio da especialidade de oncologia da Ordem dos Médicos (OM) .
“As nossas recomendações têm três objectivos: evitar que os doentes se infectem, que os profissionais de saúde se infectem, e evitar mortes colaterais. Há mais pessoas a morrer por cancro do que por covid. Temos que manter os tratamentos dos doentes que destes precisam com os devidos cuidados”, sublinha o presidente da direcção do colégio de oncologia médica da OM, Luís Costa, que assina um conjunto de recomendações delineadas a pedido do bastonário.
À medida que a pandemia avança no país e que mais hospitais têm de responder a casos de infecção pelo novo coronavírus, aumenta a necessidade de organização dos serviços e de indicações sobre os procedimentos que devem ou não ser adoptados e os cuidados a ter para evitar o risco de infecção entre doentes e profissionais de saúde. Ainda sem normas da Direcção-Geral da Saúde (DGS) para muitas das áreas, os colégios da especialidade da Ordem dos Médicos estão a emitir recomendações para esta altura em que se prevêem restrições na capacidade de resposta dos cuidados de saúde.
Para os doentes oncológicos que necessitam de radioterapia, a regra deve ser “testar, testar, testar”, enfatiza também a presidente da direcção do colégio da especialidade de radioncologia, Margarida Roldão, para quem o ideal seria ter equipamentos e equipas dedicadas a doentes covid e não covid. “Na nossa realidade isso seria difícil de montar, há poucos serviços, e todos têm muitos doentes. Neste momento, [no caso de doentes com covid-19] o que tem acontecido é a suspensão dos tratamentos e o envio para a equipa dos hospitais de referência para a infecção pelo novo coronavírus.”
Face a uma situação que é “excepcional, inédita” e para a qual não existem “protocolos clínicos definidos”, o que o colégio de radioncologia preconiza é o rastreio laboratorial a todos os doentes antes de iniciar tratamento. Na falta de evidência clínica que suporte algumas decisões, a direcção do colégio socorre-se de algumas recomendações da ESTRO (Sociedade Europeia de Radioterapia e Oncologia) para para sugerir que, neste período excepcional, e para doentes que não sofram com o atraso no início da radioterapia, esta pode ser adiada. Mais: no caso de doentes diagnosticados com covid-19 durante o tratamento, se pondere mesmo interromper temporariamente a radioterapia.
“São situações muito difíceis”, admite Margarida Roldão. “Mas a equipa não é só médica, inclui técnicos, enfermeiros, físicos, por isso é que a realização de testes é crucial”.
Luís Costa também não tem dúvidas: os doentes não entram sem fazerem screening [rastreio clínico] e as áreas onde os infectados com o novo coronavírus são seguidos têm que estar separadas das outras. Remetendo para a experiência já conhecida de outros países e para consensos de instituições internacionais, no texto em que elenca as recomendações sustenta que o número de vindas ao hospital deve ser limitado “ao estritamente necessário para tratamentos indispensáveis ou avaliação de situações urgentes” e que se deve optar por consultas não presenciais.
“Sempre que possível, antes da vinda ao hospital de dia de oncologia, quando em tratamento oncológico activo com probabilidade de imunossupressão, os doentes devem ser contactados telefonicamente e, se reportarem tosse e febre (com ou sem falta de ar), devem ser devidamente referenciados para o serviço de urgência central hospitalar ou para sala de isolamento para doentes com suspeita de infecção” pelo novo coronavírus, especifica-se nas recomendações.
Já os que não estão em risco de imunossupressão devem permanecer em casa com vigilância através de contacto telefónico. Deve igualmente ser ponderada a utilização de terapêutica oral em vez do tratamento parentérico para minimizar tempo de permanência do doente no hospital.
Em doentes sem suspeita de infecção, mantêm-se as indicações para tratamento oncológico (cirúrgico, médico ou de radioncologia). Até ao momento, não está definido que doentes em tratamento de quimioterapia em ambulatório tenham um risco acrescido para contrair infecção, observa-se.
Em caso de infecção com complicações médicas graves e necessidade de apoio em cuidados intensivos, a decisão sobre as medidas de suporte a adoptar deve ter em conta a opinião dos oncologistas, que terão que ser ouvidos sobre esta matéria, acentua Luís Costa. Até à data, a experiência publicada não refere que os doentes oncológicos (não considerando outras comorbilidades) e com necessidade de suporte em cuidados intensivos tenham pior prognóstico, justifica.