GNR põe drones a vigiar cerca sanitária de Ovar e a avisar populações isoladas
Em causa está o uso de 14 câmaras de vídeo colocadas em drones, que deverão captar imagens sem som.
A Guarda Nacional Republicana (GNR) vai usar drones para vigiar o cumprimento das medidas impostas pelo estado de emergência. Isso mesmo foi confirmado ao PÚBLICO pela GNR que precisou que a partir deste sábado vai começar “a utilizar drones na cerca sanitária de Ovar para vigilância e também drones em aldeias mais isoladas dos distritos de Vila Real, Viseu e Guarda, sobretudo para emissão de avisos sonoros de recolha ao domicílio”.
O pedido para utilizar estes dispositivos foi solicitado por esta força de segurança ao Ministério da Administração Interna que pediu um parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), que deu, esta quinta-feira, o seu aval à captação destas imagens devido à declaração do estado de emergência.
O pedido de parecer foi apresentado pelo secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna, Antero Luís, na passada segunda-feira, na sequência de uma solicitação feita pela própria GNR. Segundo o parecer da CNPD a que o PÚBLICO teve acesso, o pedido de autorização refere-se ao uso de 14 câmaras de vídeo colocadas em aeronaves pilotadas remotamente, conhecidas como drones, para vigiar a linha de fronteira entre os postos de passagem autorizados das fronteiras terrestres e entre os postos de passagem fluviais/marítimos. Incluía ainda a vigilância da cerca sanitária de Ovar e de outras que entretanto venham a ser decretadas. “As câmaras captam apenas imagens, e não som, as quais são visualizadas pelo operador da aeronave no hardware próprio do equipamento e são transmitidas em tempo real para o Centro Integrado Nacional de Gestão Operacional do Comando Operacional da GNR, em Lisboa, onde são também visualizadas”, lê-se no parecer.
Contactada pelo PÚBLICO, a GNR apenas não mencionou o recurso a este sistema de drones para vigiar as fronteiras.
No documento, assinado pela presidente da CNPD, Filipa Calvão, esta considera que o uso de drones para captar imagens potencia “o impacto dessa utilização sobre a vida privada das pessoas e sobre a sua liberdade de deslocação”. Mas reconhece a excepcionalidade do momento que se vive actualmente em Portugal, não contestando “a adequação e a necessidade de recurso a um sistema de videovigilância suportado em aeronaves pilotadas remotamente para controlo das fronteiras nacionais”.
Filipa Calvão defende, contudo, “especiais cautelas” no recurso a este sistema para vigiar a cerca sanitária de Ovar, já que esta abrange “zonas com maior densidade populacional, onde o impacto sobre os direitos fundamentais pode revestir maior intensidade”. A presidente da CNPD reconhece que “existindo enquadramento constitucional que permita a restrição à liberdade de deslocação ‘necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia’ também a restrição da privacidade na estrita dimensão que se encontra directamente dependente daquela liberdade, esteja constitucionalmente enquadrada”.
Sem negar que captar imagens através de drones afecta de facto o direito ao respeito pela vida privada, Filipa Calvão considera que essa restrição fica mitigada com o facto de não se captar som.
Lembrando que a própria Constituição determina que as restrições às liberdades individuais devem limitar-se ao estritamente necessário, a presidente da CNPD recomenda que “a captação de imagens seja feita de modo a salvaguardar a privacidade daqueles que se encontram nas respectivas casas”. Defende ainda que se deve “se possível, evitar as áreas habitacionais”. E acrescenta: “Quando tal não seja possível, (…) deve procurar assegurar-se que não sejam captadas imagens do interior das habitações, porventura determinando-se que, nessas áreas, o voo das aeronaves remotamente controladas ocorra a altitude superior”. Uma recomendação que, diz Filipa Calvão, assume “especial relevância na monitorização do respeito pela cerca sanitária no concelho de Ovar”.
No parecer dá-se conta que o pedido remetido à CNPD é omisso relativamente à garantia do direito de acesso que possuem os próprios titulares dos dados e do direito destes a exigir, em determinados casos, a sua eliminação. Por isso, Filipa Calvão recomenda “que se garanta o direito de acesso às imagens gravadas, nos termos legalmente previstos”.