Coronavírus: Parlamento pode votar “estado de emergência” já na quarta-feira à tarde
Ferro Rodrigues anunciou que o plenário de quarta-feira deverá reunir-se com um quinto dos deputados e poderá votar o estado de emergência nacional por proposta de Marcelo. O presidente do Parlamento defende que esse pedido deve ter “claramente explícitas quais as consequências para os cidadãos”. Que garante que “seguramente haverá comemorações do 25 de Abril”, embora sem saber em que condições e onde.
A reunião do Presidente da República com o Conselho de Estado anunciada para esta quarta-feira à tarde foi antecipada para a manhã desse dia. A mudança na agenda, confirmada por Belém, visa permitir ao plenário da Assembleia da República, que se reunirá nesse dia à tarde, aprovar a aplicação do estado de emergência, se essa for a decisão de Marcelo Rebelo de Sousa depois de ouvido aquele órgão de consulta e também o primeiro-ministro.
“Como órgão de soberania, a Assembleia da República não pode, obviamente, deixar de funcionar, demitir-se das suas funções, sobretudo neste momento de total urgência, devendo, antes, manter um acompanhamento permanente do evoluir da situação e uma cuidada fiscalização da acção do Governo, em total respeito pela Constituição”, notou Eduardo Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República, numa conferência de imprensa, ao início desta tarde para falar as contingências do Parlamento relativamente à covid-19.
Questionado sobre se subscreve a necessidade de ser decretado o estado de emergência no país, Ferro Rodrigues escusou-se a fazer uma apreciação sobre isso, mas desejou que no pedido que venha a ser feito pelo Presidente da República ao Parlamento “que venham claramente explícitas quais as consequências para as pessoas, para os cidadãos em geral, dessa declaração de estado de emergência”. “O estado de emergência tem diversas configurações possíveis, não é qualquer coisa que se possa decretar cegamente. (...) Sem conhecer a configuração [da declaração] não posso dizer mais nada a não ser que a iremos votar com a urgência que seja necessária”, vincou.
Plenário semanal e só com 46 dos 230 deputados
O presidente do Parlamento especificou que este órgão de soberania decidiu adoptar mais medidas de restrição, depois de já na passada semana ter suspendido todas as visitas de grupos ao edifício. Assim, Ferro Rodrigues anunciou que na reunião da conferência de líderes desta tarde vai propor que o plenário passe a funcionar apenas uma vez por semana até ao final do mês com o quórum de um quinto dos deputados, ou seja 46 deputados - excepcionalmente, poderá haver mais alguma reunião.
Nesta semana haverá a reunião de quarta-feira, tendo sido canceladas as restantes; para a próxima semana mantém-se o plenário de terça-feira, dia 24, que será para o debate quinzenal com o primeiro-ministro, e, para a semana seguinte, Ferro Rodrigues tenciona que a única reunião seja para declarações políticas dos partidos e até do Governo sobre a pandemia de covid-19, descreveu o presidente aos jornalistas.
Apesar de ser possível que o Parlamento passe a funcionar não com plenário mas apenas com a comissão permanente - um órgão mais reduzido composto pelo presidente, os líderes das bancadas parlamentares e um número reduzido e proporcional de cada partido -, Ferro Rodrigues rejeitou essa solução nesta altura argumentando que as votações, como aquela que poderá ser precisa para a declaração do estado de emergência, podem ser tomadas por essa comissão mas depois ratificadas pelo plenário. Aliás, a constituição e passagem a funcionamento pela comissão permanente têm também que ser votadas pelo plenário, por isso a reunião de quarta-feira é sempre imprescindível.
“Se houver equipas reguláveis de funcionamento do Parlamento não há qualquer necessidade urgente de transformar o plenário em comissão permanente. Não quer dizer que não possa vir a ser feito mais tarde. Vamos acompanhar a situação e o que determinam as autoridades de saúde”, acrescentou Ferro Rodrigues admitindo, no entanto, mudar de posição se os líderes das bancadas parlamentares assim o entenderem na reunião da conferência de líderes que está marcada para o final da tarde desta segunda-feira.
Mas há outras medidas de precaução que Ferro Rodrigues pretende que o Parlamento adopte para além da redução para uma reunião plenária semanal: as comissões devem reunir apenas se for mesmo necessário e apenas a mesa e coordenadores de cada bancada parlamentar; os deputados e funcionários incluídos em grupos de risco - se tiverem, por exemplo, problemas crónicos de saúde - terão as faltas justificadas. Isto depois de terem sido encerrados os serviços de contacto directo com o público como a biblioteca e a livraria, de terem sido dispensados os funcionários que sofrem de doença respiratória aguda ou de outros grupos de risco e colocados em teletrabalho aqueles que o podem fazer. “Estas medidas serão, naturalmente, actualizadas à medida que novas se revelem necessárias.”
Comemorações do 25 de Abril far-se-ão, mas não se sabe como e onde
Questionado sobre as comemorações do 25 de Abril, que incluem sempre uma sessão solene na Assembleia da República, com os deputados e centenas de convidados nas galerias, Ferro Rodrigues vincou que “seguramente haverá comemorações pela Assembleia”, mas neste momento “não se sabe em que condições e onde”.
“A Assembleia da República não pode esquecer que, se há milhões de portugueses em casa, há milhões a trabalhar e a garantir que o país funciona, que a economia não pára e que o desemprego não explode”, vincou Ferro Rodrigues. No entanto, salientou, o Parlamento “pode e deve tomar as precauções que tenham em conta as recomendações emitidas pela Direcção-Geral da Saúde e evitar o risco conhecido da covid-19”, e “deve dar o exemplo pelo trabalho e pela prevenção”. O presidente lembrou que noutros países europeus os respectivos parlamentos também adoptaram medidas restritivas, desde a suspensão de visitas até à redução mínima do plenário apenas para aprovar legislação urgente - como foram os casos da Dinamarca, Itália e França.
Eduardo Ferro Rodrigues solidarizou-se com quem está infectado com o vírus, em isolamento, vigilância ou à espera de resultados, com os profissionais de saúde, das forças de segurança e da protecção civil, e elogiou os “comportamentos exemplares de grande parte dos portugueses”. Mas reforçou o apelo para que “continuem mobilizados e cumpram as recomendações (...) evitando comportamentos que coloquem em perigo as pessoas ou a compra excessiva de bens, sendo certo que a reposição desses bens está assegurada”.