Turquia acusa Grécia de matar um migrante, Grécia nega “categoricamente”
O Presidente turco apelou a Atenas que “respeite os refugiados que chegam ao seu território”, depois de ter aberto as fronteiras com a Grécia e Bulgária e ser acusado de usar os refugiados como peões. Grécia acusou Ancara de “divulgar notícias falsas” sobre disparos sobre quem tenta chegar a território grego.
A Turquia acusou esta quarta-feira as autoridades gregas de matarem a tiro um migrante que tentava entrar no país e ferir outros cinco, acusação que o Governo grego “desmente categoricamente”.
De acordo com o gabinete do governador da cidade turca de Edirne, os militares gregos abriram fogo quando um grupo de migrantes que estava na Turquia tentou forçar a entrada na Grécia, cerca das 11:00 (08:00 em Lisboa), tendo atingido um deles no peito. A acusação acontece depois de ter circulado nas redes sociais e na imprensa internacional um vídeo que mostrava um navio da Guarda Costeira grega a disparar contra uma embarcação precária com mais de uma dezena de refugiados a bordo.
The Greek Coast Guard is acting with much more aggression & confidence than I have seen in them before
— BasedPoland (@BasedPoland) March 2, 2020
They are taking the migration challenge seriously
This vid was recorded this morning. In it, the Coast Guard shoots warning shots at the migrants & blocks their way to #Greece pic.twitter.com/f3dcECt07g
“A Turquia está a divulgar notícias falsas”, reagiu Stelos Petsas, porta-voz do Governo grego, liderado pelo conservador Kyriakos Mitsotakis, que prometeu na campanha eleitoral expulsar imigrantes e refugiados do país. “Nego categoricamente” que a Grécia tenha atirado sobre migrantes que tentavam atravessar a fronteira da Turquia para a Grécia, assegurou.
Na semana passada, o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, abriu as suas fronteiras com a Bulgária e Grécia para permitir que milhares de refugiados tentassem chegar à União Europeia - a Turquia acolhe mais de 3,5 milhões de refugiados. A decisão foi o consumar de uma ameaça tantas vezes expressa e encarada como retaliação pela falta de apoio europeu à intervenção turca na província de Idlib, no Noroeste da Síria.
Em 2016, a União Europeia e a Turquia firmaram um acordo para impedir que mais refugiados chegassem à Europa. Em troca de seis mil milhões de euros, Ancara comprometia-se a encerrar as fronteiras e a alojar no seu território milhões de refugiados. “O acordo foi baseado na premissa de a Turquia ser - ou vir a tornar-se um país seguro para pessoas que fugiam da guerra na Síria, Iraque e até mesmo Afeganistão”, disse em entrevista ao PÚBLICO Philippe Dam, director da Human Rights Watch na Europa e Ásia Central. “Mas a realidade no terreno é que a Turquia continua a não ser um país seguro para requerentes de asilo, de acordo com os critérios europeus”, continuou, denunciando que as autoridades turcas têm “empurrado” e “recambiado” muitos refugiados sírios para a zona de guerra.
Erdogan deixou de respeitar o acordo abrindo as fronteiras e a Grécia, que nos últimos anos não tem tido capacidade para gerir os fluxos migratórios, viu-se ainda mais pressionada e as autoridades gregas acabaram por usar a força contra os refugiados que tentavam chegar ao país, seja por água ou por terra. Na fronteira com a Turquia, dispararam gás lacrimogéneo contra os refugiados, muitos dos quais crianças, e, no mar, a Guarda Costeira tem tentado dissuadir, com ameaças de afundamento e disparos, embarcações que tentam chegar às ilhas gregas mais próximas da Turquia.
Erdogan tem sido acusado de usar os refugiados como peões contra a União Europeia e, esta quarta-feira, respondeu acusando a Grécia de violar tratados internacionais de direitos humanos, de “afundar barcos” e disparar balas reais contra refugiados que tentam entrar no país. “Os gregos, que usam todos os meios para impedir que os migrantes entrem no seu território – chegando a afogá-los ou matando-os com balas reais - não se devem esquecer de que, um dia, também poderão precisar de compaixão”, afirmou esta quarta-feira Erdogan.
O chefe de Estado turco recorreu à História para criticar Atenas relembrando que muitos gregos escaparam do país durante a Segunda Guerra Mundial. Chegou inclusive a pedir ao executivo grego que “respeite os refugiados que chegam ao seu território”, invocando o artigo 14.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que reconhece o direito de qualquer pessoa a pedir asilo em qualquer país, em caso de perseguição. “Os países que fecham as suas fronteiras, que afundam barcos de refugiados e os forçam a voltar estão a violar” a Declaração, disse.
O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, e o alto representante da União Europeia para a Política Externa, Josep Borrell, estão esta quarta-feira em Ancara para discutir a crise migratória com o Governo turco. Na terça-feira, os dois líderes europeus, acompanhados pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, estiveram na fronteira grego-turca para avaliarem a situação no terreno.
A presidente da Comissão Europeia louvou os esforços gregos na gestão da crise de refugiados e caracterizou a Grécia como “escudo” da União Europeia, ao dissuadir os refugiados de tentarem chegar à Europa. A União Europeia vai disponibilizar 700 milhões de euros de ajuda à Grécia.