Empresas cortam viagens e presenças em feiras de negócios
Indústrias exportadoras limitam deslocações ao estrangeiro para reduzir riscos de contágio com o Covid-19. Nos negócios, o ambiente é tranquilo.
Até ao momento, não há sinais de consequências negativas da epidemia de coronavírus Covid-19 na economia portuguesa. Apesar das perdas na capitalização bolsista em diferentes praças, o cenário na indústria portuguesa é de relativa tranquilidade. As exportações ou os fornecimentos externos seguem dentro da normalidade e há confiança em que as cadeias de abastecimento se poderão manter sem problemas. A mudança fundamental, por agora, é a redução das viagens e de presenças em feiras de negócios por parte de empresas portuguesas. E aquelas que mantêm presença em feiras recorrem a representantes locais e deparam-se com uma dificuldade inesperada: muitos hotéis deixaram de oferecer tarifas flexíveis com possibilidade de reembolso.
No sector metalúrgico e metalomecânico, que representa quase 20% das exportações portuguesas, “há empresas que estão a cancelar participações em feiras”, confirma o vice-presidente da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal (AIMMAP), Rafael Campos Pereira. Utrecht (Países Baixos) e Paris (França) serão palco dos próximos certames internacionais e, para reduzir o risco de contágio, há quem tenha pagado a participação e não vá comparecer.
Neste sector, que exportou quase 20 mil milhões de euros em 2019, estão também a ser reduzidas viagens de visita a clientes e fornecedores no estrangeiro, tal como alguns clientes e fornecedores estão a anular viagens programadas até Portugal, refere o mesmo responsável. As empresas da AIMMAP “acompanham com atenção e sem alarmismo” a evolução do panorama mundial da doença. “O cenário mudou significativamente, com a entrada da doença em Itália. “Passa a estar mais perto de casa. Antes, era um problema na China, para onde exportamos residualmente [cerca de 200 milhões em 2019] e a quem compramos matéria-prima e componentes em quantidades pouco significativas e que eram substituíveis com alguma facilidade até a partir de Portugal”, sublinha.
Não há notícias de empresas que tenham suspendido a produção ou que se queixem de redução de actividade, conclui. No mundo automóvel, a indústria de produção de componentes produz em ambiente de normalidade, diz o secretário-geral da AFIA, Adão Ferreira. Mas entre retalhistas e representantes, há medidas em curso: por exemplo, a Toyota Europa limitou as presenças no próximo Salão de Genebra e o representante da marca em Portugal, o grupo Salvador Caetano, decidiu não viajar para a Suíça.
Não enviam representantes
Situação semelhante aconteceu entre as três dezenas de empresas que estavam inscritas na Gulfood, uma feira de produtos alimentares e bebidas no Dubai realizada esta semana. Algumas delas decidiram não enviar representantes e contrataram localmente quem gerisse os respectivos stands. Para a próxima ProWein, dedicada aos vinhos, em Düsseldorf, também há empresas a repensar a presença. Mas aqui o inesperado foi o facto de os hotéis da cidade, com medo de perder receitas de cancelamentos, terem deixado de oferecer tarifas com possibilidade de reembolso.
A Autoeuropa, em Palmela, é um dos maiores exportadores nacionais. Até agora, “não houve nenhum impacto”, diz fonte da empresa. “As fábricas que produzem componentes para nós continuam em laboração, não há quebras de produção”, assegura. E em termos de exportações, a China comprava sobretudo os modelos Scirocco (que já não se produz) e a Sharan (que é residual), já que o mercado chinês para o T-Roc é abastecido por fábricas específicas naquele país.
O sector do calçado não se sente afectado pela redução da actividade económica na China. A associação do sector, a Apiccaps, diz que “não há uma emergência sectorial” e desconhece que haja empresas afectadas por cortes na actividade ou no fornecimento de matéria-prima. “China e Hong Kong valem 30 milhões em exportações. Mesmo com um crescimento de 20% em 2019, são mercados pequenos para nós”, destaca Paulo Gonçalves, da Apiccaps.
A Itália suscita maiores preocupações, porque metade dos componentes de que a indústria nacional necessita vêm daquele país. “Em exportações, a Itália representa 40 milhões, mas em importações vale 100 milhões em peles e componentes”, acrescenta.
Ao contrário do calçado, que compra apenas sete milhões em matéria-prima à China, o sector têxtil e vestuário vive maiores preocupações. O sector da confecção, representado pela ANIVEC, diz estar a sentir na pele a redução da actividade e problemas no fornecimento, como é o caso da empresa do presidente, a Calvelex. O presidente da ATP, por seu lado, disse ao jornal Dinheiro Vivo, que as empresas podem viver mais um mês sem problemas com o stock que têm.
Fonte do Governo disse ao PÚBLICO que nos próximos dias se vai reunir com diferentes associações empresariais, para avaliar que dificuldades sentem as indústrias e acertar agulhas em planos de intervenção para lidar com factores externos ou no plano interno, quando ou se a doença se manifestar em Portugal.