PS quer abandono de animais tratado com mais dureza
Projecto do PS rectifica algumas entorses da lei que pune maus-tratos, enquanto um do PAN tenta aumentar molduras penais.
O grupo parlamentar do PS apresentou na Assembleia da República um projecto destinado a rectificar algumas das entorses da lei que pune os maus-tratos aos animais de companhia. E aproveitou a oportunidade para fazer punir com mais dureza o crime de abandono.
Os socialistas querem que quem for condenado por delitos graves nesta matéria possa ser privado do direito de detenção de bichos durante dez anos. Neste momento, a lei estabelece um período máximo de cinco anos.
Apesar de a legislação em vigor ser da responsabilidade do PS, em acordo com o PSD, o grupo parlamentar socialista vem agora reconhecer as insuficiências do regime jurídico vigente: “A prática de mais de cinco anos das forças de segurança, magistrados judiciais e Ministério Público, associações zoófilas e cidadãos empenhados (...) veio confirmar muitos dos receios expressos” pouco depois da aprovação das novas leis, em 2014 e 2014, refere o preâmbulo da proposta.
Uma das principais novidades passa por punir com pena de prisão até um ano ou multa quem coloque o animal em perigo de vida abandonando-o ao seu destino. Actualmente, a moldura penal para este delito não vai além dos seis meses.
Os socialistas mantêm, porém, a moldura penal máxima dos maus-tratos e da morte intencional dos bichos (o chamado animalicídio) no tecto máximo dos dois anos.
PAN quer penas de prisão até três anos
Já um projecto do PAN também submetido recentemente à apreciação parlamentar prevê que a morte intencional possa ser punida nos casos mais graves com até três anos de cadeia. E coloca nesse patamar de especial gravidade a circunstância de o autor do crime ser proprietário do animal, ter usado veneno ou tortura para lhe tirar a vida ou ainda ter sido motivado “pela avidez, pelo prazer de matar ou de causar sofrimento, para excitação ou por qualquer motivo torpe ou fútil”.
Na sua exposição de motivos, o Partido Pessoas-Animais-Natureza recorda que vários estudos académicos têm estabelecido co-relacionamento entre os crimes contra as pessoas e os crimes contra os animais: “Os agressores no âmbito da crueldade animal cometem amiúde violência contra humanos”. Disso parece ser indício o recente esquartejamento de uma cadela na margem sul de Lisboa perpetrado pelo ex-companheiro da dona, como forma de retaliação para com a mulher.
Tentativa de animalicídio também será punível
A lei actualmente em vigor não deixa claro se quem matar um animal de companhia sem o maltratar – com um tiro, por exemplo – pode efectivamente ser punido.
Se o projecto do PS for aprovado, essa dúvida deixará de existir, diz o procurador Raúl Farias, um dos maiores especialistas em Portugal neste tipo de questões. A proposta estabelece ainda que a tentativa de animalicídio também é punível, o que não acontece actualmente. “Ou seja, se alguém apontar à cabeça de um animal e falhar o tiro também pode ser condenado”, explica o mesmo magistrado.
Porém, assinala Raúl Farias, o projecto de diploma continua a não definir com exactidão o conceito de animal de companhia – muito embora já determine que essa definição inclui os animais errantes.
Os socialistas optaram por continuar a não estender a protecção contra maus-tratos aos restantes bichos que não os de companhia, como, por exemplo, os animais de pecuária. Já o PAN quer alargar este regime a todos os vertebrados sencientes, ou seja, capazes de percepcionar sensações e sentimentos. Seja como for, deixa de fora actividades como as touradas, ao prever que os maus-tratos só são puníveis “fora de actividade legalmente permitida ou autorizada”.
Ao contrário do PS, este partido quer ver castigados não apenas os maus-tratos físicos como também os psicológicos. E punir também quem utilizar, ceder ou explorar animais para práticas sexuais, ainda que sem fins lucrativos.
O PAN justifica esta necessidade “face às notícias que começam a ser sistematicamente difundidas e que espelham este tipo de situações em vários países”. Nos últimos anos, vários Estados-membros da União Europeia criminalizaram estas práticas, refere o grupo parlamentar, citando um parecer da Ordem dos Advogados que aborda questão.
Para Raúl Farias, apesar de o projecto socialista resolver algumas dúvidas jurídicas levantadas pela lei vigente, não dá uma resposta a todas as questões, uma vez que só altera o Código Penal, e não o Código de Processo Penal.