Parlamento Europeu condena exploração infantil em Madagáscar, onde 47% dos menores trabalham
Estima-se que 11 mil crianças trabalhem no sector da mineralização de mica em Madagáscar. Parlamento Europeu pede uma abordagem com o país para discutir a questão das empresas que recorrem ao trabalho infantil.
Madagáscar é o quinto país do mundo com mais jovens que não frequentam a escola. Em 2018, 47% de todas as crianças malgaxes entre os 5 e os 17 anos estavam envolvidas em algum tipo de trabalho infantil — 86 mil destas trabalhavam no sector de mineração. A ilha africana, apesar de ter uma quantidade razoável de recursos naturais, está entre os países mais pobres do mundo.
Foi devido a estes e a outros dados que o Parlamento Europeu aprovou esta quinta-feira uma resolução que denuncia o trabalho infantil no país, acto que, segundo aquela entidade europeia, viola a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.
De acordo com o documento, o PE pede à União Europeia (UE) e aos seus Estados-membros que cooperem com Madagáscar a fim de adoptar e aplicar de “legislação, políticas, orçamentos e programas de acção que contribuam para a plena observância de todos os direitos da criança”. À Comissão Europeia, os eurodeputados pedem uma abordagem para discutir a questão das empresas mineiras que recorrem ao trabalho infantil, a fim de “assegurar que nenhuma parte da sua produção seja directa ou indirectamente importada na UE”.
Os membros do Parlamento esperam que o Orçamento da EU para 2021-2027, que está ainda a ser negociado, “reflicta o compromisso de erradicar o trabalho infantil até 2025”, incitando todas as empresas da UE a respeitarem os princípios do comércio equitativo e das mercadorias e materiais obtidos de acordo com a ética.
Em Novembro de 2019, uma investigação da associação humanitária Terres des Hommes concluiu que as crianças madagascarenses representavam mais da metade do número de mineiros à procura de mica em Madagáscar — os últimos números dão conta de 11 mil crianças a trabalhar neste sector. A mica cobre um grupo de diferentes minerais utilizados na indústria electrónica e automóvel e está presente em vários produtos do nosso dia-a-dia, que vão de tintas para correctivos do solo, a cabos, produtos de maquilhagem e telemóveis.
E Madagáscar é o terceiro maior exportador mundial de mica, actividade que em 2017 representou um lucro de 6,5 milhões de dólares.
Os investigadores da associação humanitária descobriram ainda que o dinheiro que as crianças mineiras ganham num dia não é suficiente para pagar uma refeição. Além disso, estão constantemente expostas a condições de trabalho duras e pouco seguras. “Isso causa-lhes dores de costas e de cabeça devido ao calor e à falta de água ou de oxigénio nas minas, dores musculares por causa do trabalho repetitivo e árduo de transporte de cargas pesadas, bem como tosse e problemas respiratórios frequentes devido às partículas finas de mica, para além de arriscarem a vida devido à implosão de minas ou a deslizamentos de terras”, lê-se na resolução aprovada esta quinta-feira pelo Parlamento Europeu.
Outro dos problemas é que, segundo o PE, o sector da mica em Madagáscar é tributado através de um conjunto de disposições complexas e que os níveis de tributação das exportações são relativamente baixos, o que nem sempre proporciona benefícios directos às comunidades mineiras. Em todo o Madagáscar, apenas 40 licenças de exploração foram aprovadas, o que quer dizer que as restantes minas são exploradas de forma ilegal.
“Embora se tenham registado alguns progressos na redução do trabalho infantil, estima-se que ao ritmo a que essa redução se verifica, 121 milhões de rapazes e raparigas ainda serão vítimas de trabalho infantil em 2025”, revela o Parlamento Europeu.
O PÚBLICO viajou a convite do Parlamento Europeu