Quase centenária, a padaria mais antiga da Feira está uma Petiz
Ninguém reconhece a casa mais antiga e pequenina de Santa Maria da Feira, depois de uma requalificação que, aos 90 anos, a adapta aos tempos modernos com um estilo mais próximo do brunch spot. As iguarias tradicionais continuam lá, mas a grande tentação são os petiscos novos.
Em frente ao Rossio e a poucos metros da Igreja dos Loios, nasceu em 1930 uma padaria que começou por ser de Manuel Araújo e anos depois passou para a gestão da firma Mendonça e Companhia. Era uma casa modesta, com serviço apenas ao balcão, mas cedo criou reputação como fabricante de fogaça, caladinhos e outros doces locais e regionais.
Foi assim que, nos anos 1980, o estabelecimento também despertou a curiosidade de António Petiz, que até aí se dedicava apenas à lida agrícola, mas sempre sonhara ter um negócio de panificação.
O novo proprietário consolidou então a oferta da casa e assumiu por longos anos a tarefa de distribuir pão fresco de porta em porta, mas o facto é que, repartindo atenções por diferentes afazeres e mais duas pastelarias, a estética da casa-mãe começou a atrasar-se na actualização de questões que sempre ajudaram à lealdade da clientela. Nos últimos anos notava-se a falta de cuidados de vitrinismo na montra, um interior algo escuro, a ausência de lettering exterior que fizesse jus aos sabores do recheio e, sobretudo, a falta de um serviço adequado a consumidores mais exigentes.
Foi quando António passou a gestão da casa para os seus filhos Juvenal e Marco que tudo mudou. “Decidimos manter a traça da casa, mas tornando o interior mais moderno e confortável, e ajustando a oferta gastronómica aos tempos de hoje”, explica Juvenal Petiz.
No final de 2019 a reconfiguração e decoração do espaço foi entregue ao atelier do designer local Ivo Maia, que apostou na versatilidade funcional – a janela da fachada pode abrir-se para viabilizar um balcão directo para a rua, por exemplo – e numa disposição acolhedora e despretensiosa – potenciada não só pela exiguidade do espaço, mas também pelo uso de madeiras claras num único sofá de correr, acompanhado por bancos pequenos e robustas mesinhas circulares.
A nova Petiz continua mínima, é certo, mas está longe de ser minimal. Basta olhar para a vitrina e para a carta em que o chef Rui Santos aplica a sua experiência internacional: atrás do vidro, há macarons de várias e intensas cores, cheesecakes e bolos de interior red velvet, castanhas de ovos e quindins, brownies de chocolate, muffins de limão ou avelã, e bolas-de-berlim normais ou de alfarroba e beterraba; na carta, para confecção na hora e a pensar em refeições de maior sustento, há fogaça com presunto, sandes de leitão com queijo da serra, sandes de abacate e pêra em pão de girassol, tábua de enchidos ou queijos, trio de hambúrguer com rúcula e brie, ou cogumelos tortulho recheados com alheira.
As conversas têm que fazer-se em tom baixíssimo quando a música ambiente não ajuda à privacidade, mas esse é apenas um detalhe considerando que o foco da experiência está nos sabores – agora mais procurados também à sexta e sábado à noite, quando, mesmo com chuva, a esplanada da Petiz se enche de gente em procura de alimento para uma madrugada de dança nos bares ao lado.
“São estas novas gerações que vão assegurar a continuidade da casa e tínhamos que adaptar o nosso serviço para ele corresponder melhor à evolução dos hábitos de consumo”, reconhece Juvenal. “Mantemos a clientela antiga porque continuamos com as especialidades tradicionais, mas estamos a alcançar um público novo porque implementámos uma nova cozinha, com produtos de valor acrescentado como bolos sem glúten e opções mais saudáveis para quem tem restrições alimentares.”
Petiz na dimensão física, portanto; adulta e madura em tudo o resto.