Abbas corta relações com EUA e Israel em resposta ao plano para a Palestina
O presidente da Autoridade Palestiniana disse que nunca aceitará a solução proposta por Washington e Telavive e que não ficará para a História como quem vendeu Jerusalém. Liga Árabe rejeitou o plano.
O presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, reiterou que nunca aceitará o chamado “plano do século” da Administração Trump para o conflito israelo-palestiniano e anunciou o fim de todas as relações, inclusive de segurança, com os EUA e Israel. A Liga Árabe também o recusou, por não ter em conta os direitos e aspirações dos palestinianos.
“Informámos o lado israelita de que não haverá mais relações nem com ele nem com os Estados Unidos, incluindo de segurança”, disse ontem Abbas numa reunião da Liga Árabe, reiterando a rejeição “total” do plano “desastroso” que favorece Israel. “Nunca aceitarei esta solução. Não ficarei para a História como aquele que vendeu Jerusalém”, continuou, admitindo não ter respondido aos telefonemas de Trump, para que este não pudesse dizer que os palestinianos tinham sido consultados.
Há muito que a Autoridade Palestiniana coopera com Israel em assuntos relacionados com terrorismo, como com patrulhas na zona ocupada da Cisjordânia, sob controlo palestiniano. E assinou acordos com a norte-americana CIA, em vigor mesmo depois de os palestinianos se terem oposto às negociações norte-americanas para o plano, lideradas pelo genro e conselheiro de Trump, Jared Kushner, diz a Reuters. Washington e Israel negociaram o plano entre si, sem os palestinianos.
Abbas tem o apoio da Liga Árabe. Reunidos no Cairo, Egipto, para uma reunião de emergência, os ministros dos Negócios Estrangeiros recusaram o plano por “não ter em conta os direitos mínimos e aspirações do povo palestiniano” e garantiram que os seus membros “não vão cooperar” com os EUA e Israel na sua aplicação. Voltaram a insistir numa solução de dois Estados baseada nas fronteiras de 1967 e avisaram Telavive para não tentar avançar pela via da força.
"Não pedimos o impossível"
O líder palestiniano quer uma solução baseada nas fronteiras de 1967, alargadas por Israel na Guerra dos Seis Dias, e de dois Estados. “O plano de Trump deixa os palestinianos com apenas 11% do território palestiniano. Concordámos com as fronteiras de 1967, que é de 22%, e agora querem tirar-nos ainda mais”, disse Abbas. “Continuamos a acreditar na paz e queremos um mecanismo que aplique as decisões da comunidade internacional. Não estamos a pedir o impossível, não queremos ir contra os EUA, queremos que adopte a nossa posição.”
O plano de paz, apresentado por Trump e pelo primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, na terça-feira em Washington, permite a Israel anexar largas partes da Cisjordânia, incluindo todo o vale do Jordão, e que tenha soberania sobre os colonatos aí construídos, mesmo os ilegais pela resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU, que exige a Israel a retirada dos territórios ocupados após 1967 e o regresso dos refugiados.
Em troca, os palestinianos terão um Estado próprio disperso entre a Faixa de Gaza, partes da Cisjordânia e alguns bairros na periferia de Jerusalém Oriental, onde estará a sua capital. Os territórios estarão ligados por estradas, pontes e túneis, com Telavive a controlar as fronteiras e espaço aéreo do novo Estado. E o Hamas, que controla a Faixa de Gaza, terá de se desarmar e os palestinianos que fugiram ou foram expulsos das suas casas quando foi criado o Estado judaico, em 1948, terão de ser alojados dentro do fracturado Estado.
“Desafio qualquer um de vós a tentar ver-nos neste mapa. Se pedirem a uma criança do primeiro ano de escolaridade para desenhar o mapa de Trump, ela nem vai saber como o fazer”, disse Abbas na reunião da Liga Árabe, empunhando um mapa do plano. “Isto é uma desgraça.”
Medo do Irão
Apesar do comunicado, a Liga Árabe parece não estar tão unida sobre o “plano do século”, como Trump lhe chamou. Embaixadores do Bahrein, Emirados Árabes Unidos e Omã, que tradicionalmente defenderam a causa palestiniana, estiveram presentes na cerimónia de apresentação do plano. Já o Egipto e a Arábia Saudita agradeceram os esforços de Trump e o primeiro apelou a israelitas e palestinianos que o “estudassem” cuidadosamente, ao contrário da Jordânia, que o condenou de imediato.
A atitude destes Estados deve-se, dizem analistas, ao receio do expansionismo iraniano na região e do consolidar da aliança com os EUA. “A breve confrontação militar entre os EUA e o Irão, em Janeiro, convenceu alguns países do Golfo que Washington é o seu único protector”, disse à Al-Jazeera o jornalista palestiniano Ramzy Baroud. “Por um lado, tentam, timidamente, mostrar apoio aos palestinianos, mas, por outro, não se querem envolver num confronto político com Washington e os seus aliados.”