Republicanos travam chamada de testemunhas e carimbam absolvição de Trump

Votação final vai acontecer na quarta-feira, depois das eleições primárias no Iowa e do discurso sobre o Estado da União.

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Donald Trump foi acusado de abuso de poder e obstrução do Congresso Reuters/LEAH MILLIS

Como num mau filme de advogados e tribunais em que o final se torna evidente logo nos primeiros minutos, o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, viu confirmada a sua absolvição no julgamento em que é acusado de abuso de poder e obstrução do Congresso. Esta sexta-feira, na última votação no Senado que ainda podia manter o processo em aberto por mais alguns dias ou semanas, os senadores do Partido Republicano travaram a hipótese de serem ouvidas testemunhas (51-49) e selaram o resultado final, que vai ser posto no papel na próxima quarta-feira.

A grande novidade foi a argumentação usada por alguns senadores republicanos para dizerem que não precisavam de ouvir testemunhas – e, com isso, carimbarem a decisão final a favor da absolvição do Presidente Trump.

Em vez de considerarem que Donald Trump está inocente porque não há provas de uma troca de favores entre a Casa Branca e a Ucrânia, esses senadores disseram que a troca de favores em causa não é motivo para um impeachment.

Ou seja, mesmo que uma testemunha dissesse, sob juramento no Senado, que a Casa Branca congelou 391 milhões de dólares em ajuda militar à Ucrânia, em 2019, para que o Presidente ucraniano participasse num plano para prejudicar um dos principais adversários políticos de Donald Trump, o democrata Joe Biden, isso não seria motivo para uma destituição.

A absolvição do Presidente norte-americano nunca esteve em dúvida porque seria preciso uma maioria de dois terços no Senado – ou 67 senadores em 100 – para garantir uma condenação. Com 53 senadores no lado do Partido Republicano, a maioria deles 100% fiéis a Trump, e apenas 47 no lado do Partido Democrata, nunca houve dúvidas sobre o resultado final.

Mas, até esta sexta-feira, ainda havia uma questão em aberto: entre os 53 senadores republicanos, haveria pelo menos quatro dispostos a juntarem-se aos democratas para que fosse possível intimar testemunhas, adiando assim a votação final sobre a culpa ou inocência do Presidente Trump?

Os olhos do Partido Democrata estavam postos no antigo conselheiro de Segurança Nacional norte-americano, John Bolton, que afirma, no manuscrito de um livro revelado esta semana pelo New York Times, que Trump lhe disse que congelou a ajuda militar à Ucrânia em troca de informações que prejudicariam Joe Biden.

Ou seja, segundo Bolton, o Presidente norte-americano tentou mesmo interferir no resultado das próximas eleições, em Novembro, para reforçar as suas hipóteses de ser reeleito. Nos sonhos do Partido Democrata, pelo menos quatro senadores republicanos apoiariam a audição de Bolton, sob juramento, e o que ele viesse a revelar, nas próximas semanas, poderia convencer outros republicanos a condenarem o Presidente Trump.

"Inadequado”, mas não condenável

O Partido Democrata começou a acordar do sonho na noite de quinta-feira, quando um dos quatro republicanos que ainda estavam indecisos sobre a convocação de testemunhas, o senador Lamar Alexander, anunciou que ia votar contra. Mas as razões que avançou para a sua decisão acabaram por representar uma mudança no guião que estava escrito à partida (segundo o qual, o Presidente estava inocente porque não havia provas de qualquer pressão sobre a Ucrânia para prejudicar Joe Biden).

“Não precisamos de mais provas de que o Presidente pediu à Ucrânia que investigasse Joe Biden e o seu filho, Hunter; ele disse isso na televisão, a 3 de Outubro de 2019, e numa conversa telefónica com o Presidente ucraniano, a 25 de Julho de 2019. Não precisamos de mais provas para concluir que o Presidente reteve ajuda dos Estados Unidos para, pelo menos em parte, pressionar a Ucrânia a investigar os Biden; a acusação da Câmara dos Representantes provou isso com aquilo a que chama ‘uma montanha de provas avassaladoras'”, disse o republicano Lamar Alexander, um senador de 79 anos que cumpre este ano o seu último mandato.

Mas, apesar de ter sido convencido pelo Partido Democrata, durante o julgamento, de que o Presidente Trump se comportou de forma “inadequada”, Alexander concluiu que devem ser os eleitores a dizerem se ele deve, ou não, continuar na Casa Branca.

“A Constituição não dá ao Senado o poder para remover um Presidente do seu cargo, e de o excluir do boletim de voto nas eleições deste ano, por comportamentos inadequados”, disse o senador republicano.

Cedo se percebeu que muitos outros senadores republicanos iam apoiar-se nos argumentos do influente e respeitado Lamar Alexander para explicar os seus votos.

“Resumindo, é provável que o senador Alexander tenha expressado o sentimento do país como um todo, e tão bem como qualquer outro senador”, disse, no Twitter, o influente senador Lindsey Graham. “O senador Alexander rejeitou os argumentos de quem odeia Trump e de quem quer tirar a escolha aos eleitores de uma forma infundada.” 

“Vou ser claro: Lamar falou por muitos de nós”, disse à CNN o senador republicano Ben Sasse.

O senador Rob Portman, também do Partido Republicano, disse que “algumas das acções do Presidente [Trump] foram erradas e inadequadas”, em particular "o pedido a um país estrangeiro para investigar um potencial adversário político e o adiamento do envio de ajuda à Ucrânia”.

“Só porque algumas acções são passíveis de impeachment, isso não significa que seja do interesse do país afastar um Presidente do seu cargo”, disse o senador republicano Marco Rubio. “Não vou votar a favor do afastamento do Presidente porque fazer isso infligiria um dano potencialmente irreparável a um país já dividido.”

O anúncio de Lamar Alexander foi determinante para antecipar o fim do julgamento – com o seu voto na coluna do “não” para chamar testemunhas, só restavam três republicanos indecisos, o que era pouco para as necessidades do Partido Democrata. Mesmo que os outros três votassem a favor, um resultado de 50-50 significava uma vitória para o Partido Republicano.

O voto n.º 51

Nas horas seguintes, ao longo desta sexta-feira, dois dos indecisos – Susan Collins e Mitt Romney – anunciaram que iam votar a favor da convocação de testemunhas.

Mas ao fim da tarde, pouco antes do início das quatro horas de debate que antecederam a votação, a senadora Lisa Murkowski anunciou que ia votar contra e pôs um ponto final no suspense.

Com 51 votos a favor e 49 contra, o Senado não vai chamar testemunhas e pode avançar para a última votação, sobre a condenação ou absolvição do Presidente Donald Trump.

O capítulo final do terceiro impeachment de um Presidente dos Estados Unidos em 231 anos de história foi marcado para quarta-feira, depois das eleições primárias no Iowa (segunda-feira) e do discurso sobre o Estado da União (na terça-feira).

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