Crise política na Catalunha por desavenças entre os partidos independentistas no Governo
Presidente Quim Torra convocou a imprensa para dizer que perdeu confiança na Esquerda Republicana da Catalunha e que vai marcar eleições. Data será conhecida depois de aprovado o orçamento catalão.
O presidente do governo catalão informou esta quarta-feira que perdeu a confiança política na Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) e, por isso, vai convocar novas eleições assim que estiver aprovado o orçamento no parlamento regional. “A legislatura não tem mais percurso político se não há unidade”, afirmou Quim Torra, sublinhando que a mesma chegou “ao fim”.
O chefe do executivo não vai já convocar o sufrágio, esperando primeiro que os deputados aprovem o orçamento e só depois, provavelmente no final de Março, princípio de Abril, revelará a data do sufrágio eleitoral antecipado.
A notícia não surpreendeu depois do que aconteceu na segunda-feira, ao retomar os trabalhos a mesa do parlamento. O presidente da mesa, Roger Torrent (ERC), quis executar a ordem da Junta Eleitoral Central (JEC), confirmada pelo Supremo Tribunal, retirando o mandato de deputado a Torra, e este recusou. Torrent adiantou, então, que o voto do presidente catalão não seria contabilizado, o que levou o Juntos pela Catalunha (JxC) a não participar nas votações.
“Na segunda-feira não se respeitou o consenso independentista”, disse o chefe do executivo catalão, numa declaração institucional, e “permitiu-se que um órgão incompetente [a JEC] me deixasse sem o mandato de deputado”.
“O governo não pode funcionar sem unidade e partilha de estratégia e lealdade entre os seus parceiros. Desprotegeu-se a instituição da presidência, despindo-a da sua condição de deputado. E isso põe em risco, de forma permanente, o governo da Catalunha”, explicou Torra.
A posição avançada por Torra apanhou a ERC de surpresa, afirma o La Vanguardia, salientando que a direcção dos republicanos só se apercebeu da situação na terça-feira à noite, quando viu na agenda de quarta-feira a declaração institucional de Torra marcada para as 12h (menos uma em Portugal continental).
“Num governo de coligação, as decisões devem ser tomadas de maneira consensual”, advertiram membros da direcção da ERC, citados pelo La Vanguardia. “Se o presidente toma uma decisão unilateral, a ERC sente-se livre para tomar as suas próprias decisões”, referiram as mesmas fontes.
Mais tarde, reagindo em comunicado, o partido foi comedido na apreciação do gesto, afirmando até que partilha as “conclusões principais da comparência do presidente”, no sentido de que é preciso aprovar o orçamento para depois haver uma nova maioria que o execute.
Em tom conciliatório, os republicanos aproveitaram para felicitar o presidente catalão por manter a reunião com o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, no dia 6, por se tratar de uma vontade sobre a qual há um “consenso estratégico” entre as duas principais forças do independentismo catalão.
Palavra ao Supremo
A decisão de Quim Torra poderá vir a ser esvaziada se o Supremo Tribunal espanhol decidir do seu impedimento para continuar a exercer o cargo, por ter sido condenado a ano e meio de inelegibilidade por desobediência, ao recusar-se a retirar dos edifícios públicos os laços amarelos que simbolizam o pedido de libertação dos presos do referendo e da declaração unilateral de independência. O chefe do governo regional ainda não apresentou o recurso da sentença, cujo prazo se esgota no dia 3 de Fevereiro.
O presidente do Partido Popular, Pablo Casado, anunciou que o seu partido recorrerá à mesa do parlamento se Torra não deixar a liderança do executivo regional, por considerar que estamos perante um caso de “usurpação de cargo público”. Para o líder da oposição, “Torra já não é presidente da Generalitat, de acordo com o estatuto da Catalunha”, por isso, pede ao Governo espanhol “que vele pelo cumprimento da legalidade” ou “agirá legalmente” contra Pedro Sánchez, por “cumplicidade”.
María Jesús Montero, a porta-voz do executivo de coligação entre os socialistas (PSOE) e o Unidas Podemos, reiterou que a reunião entre Sánchez e Torra se mantém para 6 de Fevereiro e que o Governo de Madrid continua a considerá-lo como presidente do governo da Catalunha.
O vice-primeiro-ministro e líder do Podemos, Pablo Iglesias, afirmou, por seu lado, que “se houver eleições na Catalunha, se calhar haverá outro ou outra presidente, mas o Executivo terá que dialogar com quem estiver. Não poderá escolher; às vezes, é mais fácil e outras mais difícil”, acrescentou, citado pelo El País.
Carlos Carrissoza, líder do Cidadãos na Catalunha, o partido com mais deputados no parlamento regional, perguntou ao primeiro-ministro por que “deixa que seja o separatismo a marcar os tempos?”, instigando Sánchez a activar os mecanismos do artigo 155.º da Constituição, que suspende a autonomia catalã, demitindo Torra e convocando eleições.