No novo Canto de Avillez, Ana Moura e Zambujo são os chefes da música
No antigo espaço do Belcanto, em Lisboa, agora a música é outra: nasce o Canto, onde os jantares do chef vão ter música ao vivo, com curadoria (e presença) de Ana Moura e António Zambujo.
José Avillez gosta de trabalhar com “pessoas que têm sonhos parecidos” com os dele. Aqui, o palco é pequeno, mas dá para os sonhos dos três: os músicos Ana Moura e António Zambujo e o chef José Avillez. Gastronomia e música. O espaço é o nº 10 do Largo de São Carlos, em Lisboa. Para quem tiver dúvidas, não é preciso andar às voltas no largo – é mesmo a porta do antigo restaurante Belcanto. Mas, atenção: só deverá inaugurar no início de Fevereiro.
Desde que o Belcanto se mudou para um espaço maior, ao lado, que Avillez começou a pensar como poderia aproveitar o nº 10. A ideia inicial era juntar o espaço novo e o antigo e fazer um Belcanto maior. Mas não era esse, aparentemente, o sonho dos vizinhos do prédio.
“Tento ver em tudo uma oportunidade”, disse Avillez, na apresentação do novo restaurante, terça-feira à noite. E a ideia surgiu logo de seguida, numa conversa com Ana Moura – transformar o Belcanto no Canto, um restaurante de ambiente intimista, com comida portuguesa e música. “Tinha esta vontade há imensos anos”, confessa Ana Moura. “Tanto eu como o António [Zambujo] vimos de experiências de casas de fado, eram noites muito bonitas, em que ficávamos até às tantas a trocar ideias.”
“Não tínhamos falado do ‘até às tantas’”, brinca Avillez, no palco, junto à janela do Canto. Mas Ana Moura está lançada no seu sonho: “Faço isso às vezes em minha casa, mas gostava de oficializar. E quem melhor do que estes dois mega-parceiros?”. A ideia, explica a fadista, passa por alargar o espaço a outros criadores, “pessoas ligadas à literatura, pintores que podem até pintar ao vivo no palco, residências para artistas estrangeiros”.
“A parte gastronómica está garantida”, brinca, por seu lado, António Zambujo. Quanto à programação, terá a curadoria dele e de Ana Moura, que estarão presentes em algumas noites, enquanto noutras convidarão artistas, que se juntarão à banda residente. Quem os quiser ouvir, terá que comprar bilhete (75€), que inclui jantar e concerto, ou, numa versão “fora de horas”, com um consumo mínimo de 20€, que permite assistir apenas a um segundo momento musical, podendo consumir a partir da carta de snacks e bebidas.
“Quer um António Zambujo?”, perguntam-nos no início da noite. Bom… sim, até porque o próprio está a poucos metros, encostado ao balcão, bebendo um António Zambujo. A alternativa seria um Ana Moura, ambos materializados em cocktails da casa.
Espaço transformado
Quem conhecia o Belcanto na sua vida anterior tem dificuldade em reconhecer o espaço. Transformado pelo Studio Astolfi, junta, numa espécie de estante de madeira que se estende pelas paredes e tecto, capas de discos antigos, guitarras, gramofones, retratos de Amália e toda uma memorabilia que remete para o universo da canção portuguesa, fado mas não só.
E o que se come? As entradas dividem-se em frias e quentes e incluem perdiz de escabeche, santola recheada, tártaro de novilho ou croquetes de rabo de boi. Os pratos principais incluem arroz de marisco, bacalhau à Brás, pluma de porco alentejano, leitão ou bife do lombo. Dificilmente contornáveis são as sobremesas (escolher uma é um dilema): pudim Abade de Priscos, farófias e toucinho-do-céu.
E, enquanto elas chegam às mesas, o palco é ocupado por António Zambujo e Ana Moura, que cantam, descontraídos e sempre num diálogo próximo com o público, alimentado por pequenas simpatias. Os ecrãs dos telemóveis iluminam-se, fazem-se fotos, vídeos. É a nova vida do Belcanto, agora sem o Bel, apenas Canto; mais uma peça do universo Avillez, que continua a abrir-se a outras artes, outras histórias, outras formas de viver a gastronomia, alimentadas por cumplicidades e “sonhos parecidos”.