Governo escolhe Maria João Antunes para presidir ao grupo de combate à corrupção

Estratégia será preparada sob tutela directa da ministra da Justiça.

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Francisca van Dunem esteve num debate com deputados no Parlamento sobre o Orçamento do Estado para este ano LUSA/MIGUEL A. LOPES

A especialista em Direito Penal e professora da Universidade de Coimbra, Maria João Antunes, vai presidir ao “grupo de trabalho para a definição de uma estratégia nacional, global e integrada de combate à corrupção”, aprovado em Dezembro pelo Conselho de Ministros. A revelação foi feita esta segunda-feira pela ministra da Justiça Francisca Van Dunem num debate, no Parlamento, sobre o Orçamento do Estado (OE) para 2020 relativo à área da Justiça.

O objectivo deste grupo de trabalho é desenvolver e concretizar as linhas do programa do Governo relativamente ao combate à corrupção.

Na audição parlamentar na Comissão de Orçamento e Finanças, a ministra da Justiça destacou a intenção de o Governo incrementar a prevenção e a repressão dos fenómenos corruptivos, reforçando instrumentos jurídico-processuais já existentes, continuando a apostar no melhoramento dos recursos humanos e tecnológicos do Ministério Público (MP) e da Polícia Judiciária (PJ).

Ao longo da tarde foram várias as críticas que se ouviram ao Governo pelas verbas que afectou à PJ e à Procuradoria-Geral da República (PGR) na proposta do OE. A ministra tentou desmontar a tese que aponta para um desinvestimento na PJ e na PGR e que foi defendida por vários deputados. Mónica Quintela, do PSD, considerou que o Orçamento para este ano “contém proclamações de intenções muito bonitas, mas que, prática, não passam disso mesmo. Meras intenções”. A deputada fez uma longa exposição onde apontou falhas ao Governo, desde o sistema de justiça que, na sua opinião, “funciona mal e muitas vezes nem funciona” à “reinserção social que não existe, continuando a ser uma mera utopia”.

Dirigindo-se à ministra, a deputada questionou-a sobre o que o OE 2020 traz de novo quanto ao “propalado” combate à corrupção e à criminalidade económico-financeira. “E respondeu de imediato: “Zero. Traz-nos a diminuição do orçamento da PJ e da PGR”.

“Se há um acréscimo de 5,6% relativo ao funcionamento da PJ, devido sobretudo, ao facto de iniciarem funções novos inspectores, decorrente do concurso aberto ainda em 2015 e em 2019, porém a diminuição do investimento afecto à PJ em 22,9% é deveras preocupante e inexplicável”, disse a deputada do PSD, atirando uma mão cheia de números que evidenciam que a Judiciária necessita de mais meios e de mais recursos humanos.

“A Unidade de Combate à Corrupção em 2015 tinha 121 inspectores e hoje, pasme-se. tem 75; a Unidade de Combate ao Crime Informático tem 28 inspectores em todo o país; e a Unidade de Combate ao Tráfico de Estupefacientes tem 46 inspectores”, revelou, fixando em 970 o número de inspectores da PJ.

Sempre num tom cordato, a ministra contrariou as versões de Mónica Quintela e também de Catarina Rocha Vieira (PSD), refutando que no OE 2020 haja um desinvestimento na PJ e na PGR. “A PGR tem um aumento em todas as rubricas, menos nos fundos comunitários e relativamente à questão do combate à corrupção (…), já fiz aqui a demonstração que relativamente à PJ, que é a responsável por esta área, o Governo fez um investimento em recursos humanos e um grande investimento em termos tecnológicos”, argumentou, garantindo que a “receita maior em tecnologias de informação e comunicação deste orçamento é da PJ. Em face disto é difícil falar-se em desinvestimento.”

A alegada “asfixia” de meios humanos na Polícia Judiciária foi também criticada pelo deputado do CDS, Telmo Correia, tendo a ministra replicado com o investimento feito naquela polícia e com a aprovação da Lei Orgânica e do Estatuto da PJ no ano transacto.

Custas judiciais sobem

Na segunda ronda de respostas, Francisca Van Dunem abriu a porta a um aumento das custas judiciais para os grandes litigantes, na sequência de uma questão colocada por José Manuel Pureza. O deputado do BE questionou-a se o “Governo está disponível para não só diminuir custas excessivas, mas também aumentar custas para quem as caras são baratas, os grandes litigantes, ou para baixar o número de processos necessários para que seja considerado grande litigante”.

“Temos vários problemas associados aos litigantes e a um conjunto de operações que vai ser preciso fazer para equilibrar - reduzir de um lado e aumentar do outro. Essa é uma análise sobre a qual não queria neste momento avançar. Prontamente falaremos disso quando apresentarmos o diploma relativo ao direito”, respondeu.

Ao PÚBLICO, José Manuel Pureza vê nas palavras da ministra da Justiça o prenúncio de um aumento das custas judiciais para os grandes litigantes. “Não vejo outra cosia”, disse o deputado do BE.

Já em resposta à deputada Catarina Rocha Ferreira, a ministra prometeu para breve apresentar a nova Lei de Política Criminal, já que a anterior, conforme indicou a deputada, já caducou no ano passado.

A ministra reconheceu ainda que existe uma “injustiça” na cobrança de IVA a 23% nos processos de inventário tratados pelos cidadãos nos notários quando nos tribunais não existe o pagamento desse IVA, admitindo que o assunto merece ser repensado.

Já André Ventura (Chega) deteve-se no investimento feito na aquisição de 150 cabines telefónicas para as prisões por forma a facilitar o contacto dos reclusos com as famílias quando não existe a satisfação de reivindicações dos guardas prisionais e dos oficiais de justiça. Segundo Van Dunem, a introdução das cabines telefónicas corresponde a um projecto experimental e que segue o exemplo ensaiado em vários outros países para minimizar o problema do tráfico de telemóveis nas cadeias.

A reactivação de tribunais e de juízos de proximidade no interior do país, o plano de aproximar a justiça dos cidadãos e a aposta na simplificação e informatização da justiça foram outras notas positivas referidas pela ministra, apesar do pessimismo de alguns deputados.

A despesa total consolidada da Justiça para 2020 é de 1.504,7 milhões de euros, representando um acréscimo de 7,3% face à estimativa para 2019, indica a proposta de OE 2020.

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