Bento XVI avisa Francisco que celibato dos padres não deve ser abandonado
Posição do papa emérito é colocada em livro numa altura em que o actual Papa terá de se pronunciar sobre a possibilidade da ordenação de padres casados na Amazónia.
O papa emérito Bento XVI defende, num livro de que é co-autor e que será publicado em França a 15 de Janeiro, a manutenção do celibato dos padres. Faz conhecer a sua posição numa altura em que se aguarda que seja divulgada a decisão do Papa Francisco sobre a possibilidade do ordenação de padres casados na Amazónia.
“Acredito que o celibato” dos sacerdotes “tem um grande significado” e é “indispensável para que o nosso caminho na direcção de Deus permaneça o fundamento da nossa vida”, defende Bento XVI, no livro Des profondeurs de nos coeurs (Do fundo dos nossos corações, em tradução livre) um livro escrito a quatro mãos com o cardeal Robert Sarah, da Guiné-Conacri, que é prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos no Vaticano. O jornal francês Le Figaro publicou no domingo um excerto do livro.
Joseph Ratzinger, de 92 anos, deixou as suas funções em 2013, e juntou-se ao ultraconservador Robert Sarah neste livro. “A semelhança das nossas preocupações e a convergência das nossas conclusões levaram-nos a colocar o fruto do nosso trabalho e da nossa amizade espiritual à disposição de todos os fiéis, tal como Santo Agostinho. Tal como ele podemos afirmar: “Silere non possum! Não posso calar-me!”, escrevem os dois padres.
Bento XVI e Sarah defendem que “é urgente, necessário, que todos, bispos, sacerdotes e leigos, redescubram um olhar de fé na Igreja e no celibato sacerdotal que protege o seu mistério”.
Em Outubro do ano passado, o sínodo dos bispos recomendou a ordenação de homens casados como padres, uma solução para enfrentar a escassez de sacerdotes na Amazónia, uma proposta histórica que pode pôr fim a séculos de tradição católica romana. A maioria dos 180 bispos de nove países da Amazónia pediu também ao Vaticano para reabrir um debate sobre a ordenação de mulheres como diáconos, sustentando que “é urgente que a Igreja promova e confira na Amazónia ministérios para homens e mulheres de maneira equitativa”, de acordo com o documento final.
O Papa Francisco tem apoiado o celibato, como conceito geral.
O momento da publicação do livro sugere que o papa emérito estará a tentar influenciar a decisão do Papa que governa a Igreja Católica. O teólogo Massimo Faggioli, da Universidade Villanova (EUA), considerou, citado pela Reuters, que era uma “falha séria” de Bento XVI. Para os muitos conservadores que se opõem ao Papa Francisco, “Bento XVI nunca se reformou”.
"Um ex-Papa nunca devia falar em público acerca de nada. Já teve a sua oportunidade. Agora é a vez do seu sucessor governar”, disse Kurt Martens, professor de lei canónica na Universidade Católica da América em Washington.
“Com grande respeito para Bento XVI, já é tempo de cumprir a sua promessa de viver ‘escondido do mundo'”, comentou John Gehring, director do programa da religião católica na organização norte-americana Faith in Public Life, citado pela Reuters.
O Papa Francisco deverá tomar uma decisão em relação a este assunto nas próximas semanas.
A Igreja Católica, que abarca quase duas dezenas de ritos diferentes, permite já sacerdotes casados nas igrejas de rito oriental e em casos em que os sacerdotes anglicanos previamente casados se convertem à Igreja. Se Francisco aceitar a proposta do sínodo, porém, será o início de uma nova era para a Igreja Católica de rito latino após mais de um milénio.