Governo rejeita barragem no Mondego para controlar cheias
Ministro do Ambiente está contra a solução proposta pela Ordem dos Engenheiros. “Regularização do caudal do rio Ceira, um afluente do Mondego, em Coimbra, é a nossa aposta.”
O ministro do Ambiente disse este sábado que não se pode “artificializar” o leito dos rios para travar cheias, estando em curso uma intervenção no rio Ceira, solução diferente da barragem proposta pela Ordem dos Engenheiros para o rio Mondego.
“A água não é só da espécie humana. A água é de todos os ecossistemas e de todas as espécies que neles vivem. E por isso, não podemos imaginar que vamos artificializar, para sempre, o leito dos rios e o seu curso”, defendeu João Matos Fernandes, em resposta à Ordem dos Engenheiros do centro, que defende a construção da barragem de Girabolhos, a montante da Aguieira, cancelada em 2016, para “travar a repetição das cheias no Mondego”.
“Regularização do caudal do rio Ceira, um afluente do Mondego, em Coimbra, é a nossa aposta. Trata-se de um rio que corre livremente e que, com o apoio de fundos europeus, estamos a começar a regularizar, utilizando apenas métodos de engenharia natural. Trata-se do oposto daquilo que é fazer uma barragem e termos um rio com capacidade de diminuir afluência de caudais ao próprio rio Mondego”, explicou o governante.
João Matos Fernandes descarta, assim, a artificialização dos rios “já que há uma aposta contra as alterações climáticas”. “É mesmo esta que deve ser a nossa acção, e não adaptar o rio ao nosso gosto e sermos, nós, espécie humana, a adaptarmo-nos e aos nossos hábitos a aquilo que os recursos têm para no dar”, concretizou.
O ministro falava este sábado em Torre de Moncorvo, à margem da inauguração do parque ambiental Aires Ferreira, que custou cerca de 600 mil euros e foi financiado por verbas provenientes do Fundo Baixo Sabor.
Engenheiros: sem barragem, “será muito difícil” evitar cheias
O presidente da secção regional do Centro da Ordem dos Engenheiros havia defendido que sem a construção da barragem de Girabolhos, a montante da Aguieira, cancelada em 2016, “será muito difícil” travar a repetição de cheias no Mondego.
“Sem [a barragem de] Girabolhos será muito difícil travar a repetição destes fenómenos. Temos que deixar de olhar para as barragens associadas à energia, e olhar para as barragens com todas as suas funções, de regularização, de armazenamento de água, de controlo de cheias e penso que isso vai ser cada vez mais importante no futuro”, afirmou o presidente da secção regional da Ordem dos Engenheiros, Armando Silva Afonso.
Para o também docente de hidráulica na Universidade de Aveiro, face às alterações climáticas, Portugal tem de garantir mais eficiência hídrica, seja para armazenar água em tempo de seca seja para controlar os caudais em situações de risco de cheia, não acreditando que tal se consiga “fazer sem mais barragens”.
O especialista em hidráulica pela Ordem dos Engenheiros Alfeu Sá Marques, também presente na conferência de imprensa, realçou que a barragem de Girabolhos, projectada para uma zona que envolvia os concelhos de Gouveia, Seia, Mangualde e Nelas, adicionaria uma capacidade útil de regularização do Mondego de 245 hectómetros cúbicos de água (um hectómetro corresponde a mil milhões de litros), sendo que o rio tem neste momento uma capacidade de 365 hectómetros cúbicos, com as barragens de Fronhas, Raiva, Caldeirão e Aguieira.
Caso se adicionasse à construção da barragem de Girabolhos a edificação de outras duas barragens projectadas para o Mondego (Midões e Asse Dasse), passaria a haver uma capacidade útil de 889 hectómetros cúbicos, mais do que duplicando a capacidade actual, notou.
Com caudais cada vez mais elevados devido às alterações climáticas, Alfeu Sá Marques considera que a barragem da Aguieira, fundamental no controlo de cheias, não “tem capacidade” para regularizar o rio.