Jogadores de matraquilhos lutam por reconhecimento e sonham com as Olimpíadas

Ricardo Vieira, vice-presidente da Federação Portuguesa de Matraquilhos e Futebol de Mesa, quer colocar um ponto final ao “estigma” de que esta modalidade é “amadora e de café”.

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José Coelho/Lusa

A ambição da Federação Internacional de Matraquilhos de elevar o desporto a modalidade olímpica acalenta um esforço de reconhecimento em Portugal, onde os jogadores pedem mais apoio e regularidade competitiva para chegar mais longe. A Junta de Freguesia de Seroa, no concelho de Paços de Ferreira, distrito do Porto, foi este fim-de-semana palco de um de dois eventos internacionais da modalidade em solo português, do Pro Tour da Federação Internacional de Matraquilhos e Futebol de Mesa (ITSF, na sigla em inglês).

Entre as várias mesas, que exibiam o slogan “velho jogo, novo desporto”, vários jogadores disputaram o torneio que pontuava “tanto para o ranking nacional como o internacional”, explicou à Lusa Ricardo Vieira.

Vieira é vice-presidente da Federação Portuguesa de Matraquilhos e Futebol de Mesa (FPMFM), sediada em Valongo, e presidente da Associação de Matraquilhos do Porto, além de integrar a comissão europeia da ITSF. Ao todo, conta, cerca de 400 atletas são federados em Portugal, com várias associações distritais e clubes espalhados um pouco por todo o país, com a FPMFM a reformular o modelo competitivo, até há uns anos entregues às distritais, para centralizar esse esforço.

“A partir de 2020, queremos mudar esse paradigma, porque a Federação, na sequência do que quer a federação internacional, quer reconhecer a modalidade como desporto. É preciso uma envolvência de jogadores, clubes e associações porque é uma modalidade pequena, ainda conotada como sendo de café, mesmo tendo já eventos de grande qualidade”, conta.

Pelo fim do “estigma"

Dos apoios a mais envolvimento dos jogadores, ao fim do “estigma de ser uma modalidade amadora e de café”, o plano de trabalho está traçado e, nos próximos quatro anos, o objectivo federativo é assumido: “atingir os critérios necessários” para serem reconhecidos como instituição de utilidade pública desportiva. A viver o “ano zero”, diz Ricardo Vieira, os principais caminhos serão o da formação, através de um projecto em escolas que arranca em 2020, com o nome “Uma Escola, Uma Mesa Oficial”, além do aumento do número de clubes e de competições homologadas.

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José Coelho/Lusa
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O reconhecimento da modalidade, que a Federação já anunciou como objectivo em comunicado, está alinhado com as pretensões da ITSF de reconhecer os matraquilhos como desporto olímpico, nomeadamente tornando-se “um evento de teste” nas provas a partir de 2024. É “um projecto de médio prazo”, explica Ricardo Vieira, e precisa de cerca de 40 países que vejam o futebol de mesa como desporto, para chegar ao nível “do ténis de mesa ou dos bilhares, que estão noutros patamares”, e ver também valorizadas as “condições sociais, educacionais e até de inclusão”. “A modalidade foi criada como um simulador de futebol para quem não podia praticá-lo. [...] Em Portugal, já organizámos um campeonato nacional em cadeira de rodas. Há um caminho longo e duro”, lembra.

Ao longo dos anos, e além da capacidade organizativa que o dirigente federativo vê num país que, em termos desportivos, estará “no “top-16” mundial, atletas portugueses foram somando medalhas, surgindo na mente de todos um título de campeões do mundo, momento em que o futebol de mesa se juntaria ao futebol e futsal, com selecções campeãs europeias, e ao futebol de praia, recentemente coroados campeões do mundo.

Fábio Carneiro, a promessa

Uma das “estrelas” dos matraquilhos portugueses, também chamados de “matrecos” ou de futebol de mesa, é Fábio Carneiro, um estudante de 19 anos natural de Paços de Ferreira. Tricampeão nacional de juniores, este ano foi segundo no campeonato de equipas absoluto e teve o ponto alto da carreira no Mundial: foi terceiro e trouxe para casa uma medalha de bronze.

Tudo começou, conta Fábio, com a irmã, Sandra, ela mesma uma antiga campeã nacional. “Vinha ver. Comecei a jogar e a evoluir e tenho ganho algumas coisas. Para mim isto é um desporto, gosto de jogar e gera convívio, nós somos todos amigos”, conta à Lusa. O sonho olímpico também “brilha” nas ambições do jovem atleta, que para já quer ser campeão nacional e poder jogar bem para “ser convocado para a selecção”, mas reconhece que seria “uma experiência incrível”.

Apesar de tudo, vê o nível “a baixar, com menos equipas e condições”, o que o leva a pedir “mais adesão de equipas para poder subir o nível do desporto”, embora Filipe Carvalho, de 35 anos, não concorde com a falta de crescimento. Para o campeão nacional de duplas, que começou a praticar “nas pausas do trabalho”, há evolução sobretudo nos resultados que a selecção portuguesa tem conseguido no estrangeiro, e aponta para a diferença no tipo de mesas utilizadas, bem como na falta de ritmo competitivo e de treino em comparação com outros países.

A trabalhar numa empresa de assistência técnica, Carvalho já esteve para participar em provas internacionais, mas o trabalho falou mais alto e, por isso, gostaria que o desporto fosse reconhecido, tanto para facilitar as viagens como para chegar a um ponto, “que não é fácil, de uma pessoa poder viver disto”.

Ainda assim, acalenta o sonho de poder disputar o próximo mundial, enquanto campeão nacional, numa fase em que já nota uma evolução mais estável e prolongada, por oposição a um “salto” no início. “Há sempre uma finta nova ou uma táctica, porque também se usa a táctica, como acelerar ou pausar o jogo”, explica.