Polémica entre Joacine e Livre não acaba aqui. Caso segue para conselho de jurisdição
A assembleia do partido Livre vai entregar a polémica dos últimos dias ao Conselho de Jurisdição. A decisão foi aprovada neste domingo por unanimidade. O que está em causa e o que pode acontecer?
A Assembleia do Livre aprovou por unanimidade levar ao conselho de jurisdição (CJ) do partido as declarações e acusações trocadas nos últimos dias entre a direcção do partido e a sua deputada eleita, Joacine Katar Moreira. A decisão foi aprovada no domingo, em reunião do Livre, confirmou ao PÚBLICO o assessor de comunicação da parlamentar. Contactada pelo PÚBLICO, a direcção do Livre não prestou declarações.
De acordo com o regimento do conselho de jurisdição disponível na página do partido, este é o órgão responsável pela “defesa dos direitos e interesses constitucionais, legais e estatutariamente protegidos dos membros e apoiantes do Livre”. O conselho de jurisdição é composto por 11 membros e está dividido em três órgãos: o plenário, a comissão de ética e arbitragem e a comissão de fiscalização.
Logo no domingo, Ricardo Sá Fernandes, que é membro da jurisdição do partido, adiantou que aquele órgão “poderá ter que vir a pronunciar se sobre alguns destes factos”. Em causa está a abstenção de Joacine Katar Moreira num voto sobre a Palestina. “O Livre não vai resolver isto às três pancadas, não vai atirar para baixo do tapete. Vai enfrentar este assunto com dignidade, seriedade e respeito pelo partido “, garantiu Ricardo Sá Fernandes na SIC Notícias.
Recorde-se que a deputada justificou a sua abstenção com a “dificuldade de comunicação”, afirmando que durante três dias tentou — sem sucesso — perceber os “posicionamentos da direcção relativos ao sentido de voto” desta e de outras propostas. Mas a justificação não convenceu a direcção. À entrada da reunião deste domingo, o fundador do Livre, Rui Tavares, declarou-se “perplexo”. A expressão seria reutilizada horas mais tarde no comunicado da assembleia do Livre, já no final do encontro. No mesmo comunicado, o partido assume “as dificuldades de comunicação” e afirma estar “a trabalhar em conjunto para as resolver”.
O que está em causa
O CJ funciona como uma espécie de tribunal do partido e entre as suas funções está a emissão de pareceres, a aplicação de processos disciplinares e a impugnação das deliberações dos órgãos do partido e dos actos eleitorais.
À partida, ao que o PÚBLICO apurou, no caso em análise, o conselho de jurisdição deverá escolher uma das duas primeiras acções: a emissão de um parecer ou a aplicação de um processo disciplinar, uma vez que não estão em causa deliberações dos órgãos do partido e dos actos eleitorais, mas a abstenção de Joacine Katar Moreira no votação da proposta apresentada pelo PCP sobre a nova agressão à Faixa de Gaza e a troca de acusações que se seguiu depois disso.
O que pode acontecer
A emissão de pareceres está, de acordo com o regimento daquele órgão, “dependente de requerimento escrito, dirigido ao presidente do conselho de jurisdição” por um dos órgãos — neste caso da Assembleia, o “órgão máximo do partido no período”. Nesse requerimento deverão estar incluídas “as dúvidas cujo esclarecimento se pretenda — acompanhadas das disposições estatutárias ou regulamentares a interpretar — ou as questões de legalidade a resolver”.
No caso de estar em causa um processo disciplinar, este segue “um regimento próprio” e pode resultar em advertência, suspensão de funções (até um máximo de seis meses) ou afastamento.
A advertência trata apenas de uma “repreensão pela irregularidade, culposa, seja ela por acção ou omissão” de um membro e é aplicada a faltas leves.
Já a suspensão de funções é aplicável a “infracções nos casos de negligência grave ou de grave desinteresse em cumprir os interesses estatutários, que coloquem em causa a dignidade e honra do partido e dos seus membros”.
O infractor “fica impedido de apresentar qualquer candidatura a eleições dos órgãos do Livre ou a representar o partido externamente durante a duração da sanção”.
Já o afastamento é aplicado numa “infracção qualificada como grave”, ente as quais se incluem o incumprimento dos Estatutos e das deliberações dos órgãos do partido; desrespeito pela Declaração de Princípios (princípios programáticos do partido; condutas gravosas que revelem falta de honestidade; desrespeito pelo código de ética; apoio ou participação em listas contrárias.
“Não é o fim do Livre”
“Isto não é bom, evidentemente que não é bom”, reconheceu ainda Ricardo Sá Fernandes. Ainda assim, afastou prazos de validade ao partido fundado por Rui Tavares. “Não é o fim do Livre”, asseverou o advogado.
“É um partido muito jovem, muito inexperiente, provavelmente, algumas das coisas que se estão a passar são fruto dessa inexperiência”, procurou justificar um dos 11 membros do CJ. Sá Fernandes assumiu-se ainda “triste com o que está a passar, como todos os que estão no Livre”.
Em matéria de reuniões, os encontros do CJ estão previstos para uma frequência trimestral. No entanto, o seu presidente “pode convocar reuniões extraordinárias, quando estiverem em causa situações urgentes que exijam uma resposta em tempo útil do CJ”.