Sinais de mudança nas direitas
É pena que o PSD e o CDS pareçam adormecidos e envoltos em velhas guerras, antigos hábitos e vetustos tiques.
O PSD continua na sua vidinha pré-eleição directa do presidente, marcada para 11 de Janeiro, com a apresentação de candidaturas a líder a mostrarem grande investimento e cuidado cénico por parte de Luís Montenegro e Miguel Pinto Luz. Rui Rio, que já assumiu querer ser eleito de novo presidente do partido, ainda não anunciou se vai fazer uma cerimónia formal de apresentação da sua recandidatura.
Nas catitas cerimónias-espectáculo, vimos Montenegro com uma produção gráfica demonstrativa da sua vontade de devolver o D ao PSD e Pinto Luz num evento à americana, em que até levou a família para o palco. Ideias concretas zero. Nas apresentações formais de candidatura ou fora delas, os dois candidatos ainda não disseram nada que se assemelhe a uma ideia de país, um projecto de sociedade que pretenda satisfazer as necessidades dos cidadãos, melhorar a vida da comunidade. Apenas ficámos a saber que querem que o PSD ganhe eleições autárquicas e legislativas. A verdade é que ninguém percebe como querem chegar lá. Esperemos pelas moções de estratégia.
No CDS, o desatino é tal que ainda nem sequer há candidatos assumidos à liderança, quando o congresso electivo se realiza já a 25 e 26 de Janeiro, em Aveiro. Apenas Abel Matos Santos formalizou que quer ser líder. Mas ainda que tenha todo o direito e legitimidade para se candidatar, muito dificilmente sairá vitorioso. Quanto ao resto dos putativos candidatos – João Almeida, Filipe Lobo d’Ávila e Francisco Rodrigues dos Santos – até agora não passaram a fase das intenções. A dois meses da eleição do próximo presidente, o CDS não dá sinais de ter uma personalidade com capacidade e vontade de ser líder, muito menos de que essa figura tenha um projecto para o partido e o país.
Paralelamente, no universo das direitas democráticas surgem sinais de quem quer elevar o debate político a outro patamar. Uma redefinição e reconstrução da direita em Portugal que é urgente, pois ela obrigará inevitavelmente a esquerda a dar o mesmo passo em frente, a reconstruir-se e modernizar-se.
Na quarta-feira, o PÚBLICO editou uma entrevista a Manuel Monteiro em que o antigo presidente do CDS anuncia a vontade de voltar à actividade política no seu antigo partido, num contexto em que a direcção demissionária de Assunção Cristas o catapultou para a boca de cena do espectáculo mediático ao adiar para o mandato da próxima direcção a ratificação da sua refiliação.
Na entrevista ao PÚBLICO, Monteiro diz ao que vem e explica com clareza desassombrada que quer colaborar com a futura direcção do CDS e contribuir para que o “pensamento conservador triunfe”. Mas não se fica pelas intenções. Avança com propostas políticas identificáveis com o ideário político de alguma direita. Saliento a defesa de uma revisão constitucional para a criação de um Parlamento bicameral, com uma câmara de representantes eleitos pelas regiões, logo com a responsabilidade de defender os interesses destas, e uma câmara de representatividade nacional em função do número de eleitores de cada círculo.
Monteiro propõe ainda a adopção de princípios de transparência na organização do Estado, com clarificação entre sector público e privado e a adopção de procedimentos que dêem aos cidadãos o conhecimento da sua relação com o Estado. Pode concordar-se ou discordar-se das suas propostas, mas Monteiro elevou o conteúdo do debate à direita, pela profundidade e substância com que fala em política.
Simultaneamente, com lançamento marcado para 25 de Novembro, em Lisboa, e para dia 28, no Porto, surge nas livrarias o livro Linhas Direitas – Cultura e Política à Direita, coordenado por Miguel Morgado e por Rui Ramos, do Movimento 5.7. Uma obra com 84 autores que tem como objectivo trazer à luz do dia a diversidade do pensamento nas direitas portuguesas e que junta intelectuais consagrados com outros desconhecidos de várias gerações – e em que figuram antigos membros de governos, dirigentes e militantes do PSD, do CDS, da Iniciativa Liberal e da Aliança, e em que a maioria não tem filiação partidária, embora seguramente tenha simpatia e vote em partidos à direita.
Quando nas direitas, até fruto da hecatombe eleitoral do PSD e do CDS, existem manifestações de que há uma plêiade diversa, com ideias diferentes entre si, mais ou menos conservadores, mais ou menos liberais, mais ou menos defensores do Estado, mais ou menos confessionais , mas que têm pensamento próprio e que podem contribuir para o bem da comunidade, é pena que o PSD e o CDS pareçam adormecidos e envoltos em velhas guerras, antigos hábitos e vetustos tiques.
Deixo um conselho. Todos os que querem ser candidatos à liderança do PSD e do CDS devem ler a entrevista de Monteiro e o livro Linhas Direitas. E tentem de facto entrar no patamar de debate necessário sobre o futuro de que o país precisa.