Porto: Café Ceuta reabre em Março — recuperado mas honrando a tradição
Histórico espaço dos anos 50 está encerrado desde Setembro, mas apenas temporariamente. Proprietários prometem respeitar imagem do histórico café.
O papel amarelado que desde Setembro cobre a frente envidraçada do Café Ceuta faz crescer o temor de que este seja mais um espaço histórico a fechar portas no Porto. Desta vez, no entanto, os proprietários dizem ser portadores de boas notícias: o Ceuta está encerrado, mas apenas temporariamente e para reabrir com novo fôlego. Se tudo correr como previsto, as obras arrancam em breve e o café estará pronto no final do primeiro trimestre de 2020.
A “palavra mais correcta” para definir aquilo que se passa no interior do número 26 da Rua de Ceuta é “remodelação”, disse ao PÚBLICO Agostinho Silva, um dos três proprietários do café. A garantia fica dada: “Tudo será feito com respeito total pela traça, a tradição e o património da casa.” Afinal, avalia, está em causa “um espaço emblemático da sociedade portuense”.
Para “honrar a tradição” do espaço, projectado em 1953 pelo arquitecto Carlos Neves e com decoração alusiva à conquista de Ceuta, era necessária esta “remodelação”, considerara Agostinho Silva, filho de um dos proprietários que geriu o negócio por mais de quatro décadas. A modernidade, avisam, só entrará nas “áreas técnicas” como a cozinha e casas de banho.
O projecto não está ainda fechado e Agostinho Silva guarda para mais tarde alguns pormenores do negócio. A conservação dos icónicos bilhares na cave, por exemplo, está ainda a ser estudada. Definido está que o Ceuta se manterá como café e restaurante, como se anuncia na fachada com a reconhecida fonte tipográfica da casa.
Durante muitos anos, o Ceuta foi ponto de encontro de estudantes e gente da cultura e geografia privilegiada para tertúlias e encontros políticos. Lá se realizou durante alguns anos uma tertúlia literária dinamizada por Fernando Fernandes, o “Sr. Livro” e fundador da Livraria Divulgação/Leitura, que morreu em Outubro de 2018.
Na página do Facebook do Café Ceuta, conta-se que Fernando Fernandes e os seus companheiros (Carlos Porto, Vítor Alegria Luís Veiga Leitão, António Emílio Teixeira Lopes, Orlando Neves, entre outros) “começavam a chegar à hora do lanche e iam ficando pela noite fora, às vezes até à hora do encerramento e, não raras vezes, vigiados de perto pela polícia política, a PIDE”.
No centro do Porto, bem pertinho do Ceuta, já não mora, desde Janeiro de 2018, a Leitura. Mais à frente, a Poetria, primeira livraria do país dedicada à poesia e teatro, tenta sobreviver ao anunciado fim das Galerias Lumière, que já têm parecer da Direcção Regional da Cultura para serem transformadas em hotel e cujo Pedido de Informação Prévia está ainda a ser analisado pela Câmara do Porto.
Para blindar o Ceuta a esse fim, os proprietários pretendem, depois da reabertura do espaço, candidatar o café ao programa camarário Porto de Tradição, que confere protecção a lojas históricas da cidade. Apesar de terem sido identificados pelo município logo na primeira fase do programa, acabaram por não obter a pontuação suficiente para ganhar o “selo” da autarquia.
O Ceuta é já dos poucos cafés dos anos 50 que resistem na cidade, acompanhado por estabelecimentos como o Aviz, aberto três anos depois, e o Embaixador, na Rua de Sampaio Bruno, junto aos Aliados, inaugurado já no final dessa década e que ainda há meses se batia para manter as portas abertas, apesar da classificação camarário de loja de tradição.