Esmalte de um dente revela novas pistas sobre macaco gigante
Análises a um molar de um fóssil com 1,9 milhões de anos revelam que pertenceu a uma fêmea Gigantopithecus blacki e mostram que era um ramo “irmão” dos orangotangos com um ancestral comum há cerca de dez milhões de anos.
Afinal, era uma gigante. Uma equipa de investigadores analisou um dente de um fóssil de Gigantopithecus blacki e percebeu que se tratava de uma fêmea e que esta espécie terá partilhado um ancestral comum com os orangotangos há entre dez e 12 milhões de anos, revela um artigo publicado na edição desta semana da revista Nature. O Gigantopithecus blacki é um macaco gigante extinto que foi identificado pela primeira vez em 1935 e que terá vivido no sudeste da Ásia durante o período do Pleistoceno (entre há dois milhões de anos e 300 mil anos).
Até ao momento apenas foram encontradas quatro mandíbulas parciais e vários dentes desta especial espécie de macaco. Sem restos do seu crânio, a tarefa de determinar a sua relação com outras espécies de grandes símios sempre esteve bastante dificultada e limitada. Agora uma equipa de cientistas conseguiu recuperar proteínas do esmalte de uma amostra de um molar com 1,9 milhões de anos encontrado na gruta de Chuifeng, na China, e que deram algumas importantes pistas sobre o seu passado.
As primeiras análises levaram os investigadores a perceber que o dente pertencia a uma fêmea. Para isso, recorreram a uma técnica que já tem sido usada nos testes a fósseis de restos dentários que permite, através da procura de uma proteína específica e da análise da forma como se apresenta do esmalte, determinar o sexo dos indivíduos. Mas o facto de se tratar de uma fêmea não foi a única descoberta.
O resumo do artigo adianta que outras análises realizadas posteriormente demonstraram que o Gigantopithecus é um ramo irmão dos orangotangos (género Pongo) com um ancestral comum há entre 12 e dez milhões de anos. Esta conclusão coloca a divergência do Gigantopithecus na época do Mioceno médio ou tardio, ou seja, entre há 16 milhões e 5,3 milhões de anos, propõem os autores do artigo na Nature.
O Gigantopithecus blacki era um hominídeo gigante que habitava florestas densas do Sudeste Asiático durante a época do Pleistoceno. No entanto, ainda são pouco claras as relações que esta espécie extinta de macaco gigante teve com outras espécies de macacos e sobre a divergência de espécies.
A questão do tamanho
Sabemos hoje também que tal como uma espécie de King Kong na vida real este macaco podia atingir os três metros de altura e um peso máximo a rondar os 500 quilos. Terá sido precisamente o tamanho da coroa do molar – com cerca de 2,5 centímetros de diâmetro, que serviu para as estimativas do tamanho deste gigante. A descoberta dos primeiros fósseis do Gigantopithecus remonta a 1935 e é da autoria de Gustav Heinrich Ralph von Koenigswald, paleoantropólogo que percebeu que estes restos eram vendidos em drogarias na China após serem reduzidos a pó, acreditando-se que tinham poderes curativos.
As vantagens do seu tamanho quando tinha de competir com outros animais ou desbravar terreno para percorrer a densa floresta à procura de alimentos serão óbvias. No entanto, ser muito grande também tem desvantagens. Na última era glacial do Pleistoceno, o Gigantopithecus desapareceu.
Estudos recentes sugerem que a sua extinção aconteceu quando os alimentos faltaram e justamente por causa do seu tamanho porque precisava de grandes quantidades de comida. Naquela época, as florestas foram-se transformando em paisagens de savana e deixou de haver comida suficiente para este gigante comedor de frutas que não terá conseguido adaptar-se a uma alimentação à base de raízes e folhas. Os orangotangos, os seus “irmãos”, mais pequenos, sobreviveram e ainda os conseguimos encontrar nas florestas tropicais do Bornéu e de Samatra.
As hipóteses sobre as relações entre Gigantopithecus e outros hominídeos existentes sempre foram difíceis de comprovar devido à raridade de fósseis encontrados e também, dizem ainda os autores deste artigo, de uma “validação molecular independente”. Os cientistas adiantam ainda que estas serão as proteínas esqueléticas mais antigas conhecidas e sequenciadas até a data. “A sobrevivência de um proteoma do esmalte dentário do Pleistoceno precoce nos subtrópicos expande ainda mais o alcance da análise paleoproteómica para áreas geográficas e períodos anteriormente considerados incompatíveis com a preservação genética.”
As características da sequência de proteínas analisada que usam o choque térmico como marcador permite concluir que a idade deste proteoma é aproximadamente cinco vezes superior ao proteoma ou genoma de qualquer outro mamífero publicado anteriormente, especificam. Além disso, a análise do esmalte de Gigantopithecus do Pleistoceno precoce permitiu identificar um componente biológico até agora desconhecido da formação dentária num hominídeo extinto. Por fim, os investigadores concluem: “Todos estes resultados indicam que a análise paleoproteómica do esmalte hominídeo tem o potencial de fornecer uma perspectiva molecular da evolução humana e dos grandes macacos.”