Trocas genéticas explicam variação da pelagem de diferentes espécies de lebres

Equipa de internacional coordenada por investigadores portugueses estudou a genética das lebres das ilhas Faroé.

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Lebre-variável das ilhas Faroé Harald Bjørgvin

As trocas genéticas entre diferentes espécies de lebres têm um papel “recorrente” na variação da cor da pelagem – concluiu uma equipa internacional, liderada por investigadores do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (Cibio-InBio), da Universidade do Porto.

Publicado na última edição da revista Proceedings of the National Academy of Sciences, visava compreender as diferenças de cor da pelagem no Inverno da espécie lebre-variável (Lepus timidus), explica um comunicado do Cibio-InBio.

Para isso, os investigadores estudaram a variação genética ao longo de todo o genoma da população de lebre-variável das ilhas Faroé (arquipélago localizando entre a Noruega e a Islândia), que ao longo das gerações passou a apresentar coloração cinzenta durante o Inverno. A população de lebre-variável das ilhas Faroé formou-se a partir da introdução de lebres em 1855.

“Os registos históricos indicam que, inicialmente as lebres das ilhas Faroé mudavam a pelagem para branco no Inverno. No entanto, ao longo das gerações cada vez mais lebres passaram a mudar para cinzento e, actualmente, todas as lebres desta população apresentam coloração cinzenta durante o Inverno”, adianta o centro de investigação.

Os investigadores, que além das bases genéticas das lebres das ilhas Faroé, analisaram também populações da Escandinávia e dos Alpes e de mais cinco espécies da Europa e da América do Norte. Concluíram, à semelhança de uma investigação anterior, que um gene chamado Agouti é “o responsável pelas diferenças de cor”. “O gene Agouti, que tinha sido anteriormente associado à variação de cor da pelagem na lebre-americana, é também responsável pela variação semelhante na lebre variável”, explica o comunicado.

José Melo Ferreira, coordenador do artigo, explica que a sequência de ADN do gene Agouti que faz com que as lebres-variáveis sejam cinzentas no Inverno “foi incorporada através de hibridação com a lebre-ibérica”. “Muito provavelmente foi quando as duas espécies coexistiram no Sul da Europa há milhares de anos, e muito antes de a lebre-variável ter sido introduzida nas ilhas Faroé”, refere o investigador do Cibio-InBio citado no comunicado.

Este estudo, acrescenta José Melo Ferreira, vem assim mostrar como os processos independentes de introgressão (hibridação) são responsáveis pela variação de cor que permitiu a adaptação ao local. “Estes resultados mostram que, no processo evolutivo, por vezes as mesmas soluções podem ser encontradas para os mesmos problemas. É como se a evolução se repetisse.”

No caso das lebres das ilhas Faroé, a selecção natural teve “um papel crucial” na adaptação a um ambiente que é tendencialmente mais rochoso, com menos neve e “grande incidência de caça por humanos”, adianta o Cibio-InBio: “Estes processos de adaptação a ambientes com cobertura de neve mais efémera poderão, assim, ser fundamentais para a adaptação rápida às alterações climáticas.”