Como evoluiu a couraça dos crocodilos? Fóssil da Lourinhã dá pistas
Esqueleto de antepassado dos crocodilos do tempo do Jurássico foi encontrado numa praia da Lourinhã há 20 anos. Era de um animal tão pequeno que lhe chamam Crocodilinho.
O fóssil de um pequeno antepassado dos crocodilos, com 150 milhões de anos, foi descoberto nas rochas jurássicas da Lourinhã e vem ajudar a explicar a evolução e a origem da couraça óssea presente na pele destes répteis, segundo um artigo científico publicado na revista Zoological Journal of the Linnean Society pelos paleontólogos Eduardo Puértolas Pascual e Octávio Mateus, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa e do Museu da Lourinhã.
Trata-se de um novo fóssil de crocodilomorfo do Jurássico de Portugal. Os crocodilomorfos eram o grupo de répteis que deu origem aos crocodilos modernos, explica um comunicado de imprensa da equipa.
O fóssil que resultou no artigo científico tinha sido recuperado na Praia da Peralta, na Lourinhã, em 1999, por Leandro Pereira, habitante daquele concelho. Em 2014, por intermédio de Ana Luz, sua amiga e voluntária no Museu da Lourinhã, Leandro Pereira doou a peça à colecção paleontológica do museu, como se conta no comunicado. Rica em achados paleontológicos, a Lourinhã é conhecida a nível mundial pelos fósseis de dinossauro.
O fóssil consiste em vários ossos ainda articulados entre si, como osteodermes (depósitos ósseos em forma de escamas, placas ou outras estruturas na camada dérmica da pele), vértebras, costelas e alguns ossos dos membros posteriores. Os crocodilomorfos “até agora descobertos estão muito pouco preservados e articulados”, explicaram os autores do trabalho à agência Lusa. “É um caso raro em posição de vida com boa parte do dorso preservado.”
Alcunha Crocodilinho
Como o fóssil estava parcialmente coberto por matriz rochosa, para facilitar o estudo foi levado para os laboratórios do Centro Nacional de Investigação sobre Evolução Humana, em Burgos, Espanha. Aí, foi submetido a uma microtomografia computorizada, tecnologia usada em paleontologia que permite a obtenção de imagens de secções do objecto através de raios X. Desta forma, as imagens permitiram criar modelos 3D e observar morfologias externas e internas.
Os investigadores puderam assim estudar todos os ossos e compará-los com outros crocodilomorfos da época. Várias características do novo fóssil – como a morfologia da sua armadura dérmica, formada por duas fileiras de osteodermes dorsais que se articulam através dum espinho lateral, ou a presença de osteodermes ventrais poligonais – indicam que provavelmente é membro de uma família já conhecida do Jurássico.
O nome de tal família é Goniopholididae, grupo extinto de crocodilomorfos que viveu principalmente na Europa, Ásia e América do Norte, nos períodos Jurássico e o Cretácico, e que se tinha separado da linhagem dos jacarés, crocodilos e gaviais durante o Jurássico. Formada pelos osteodermes, a sua armadura dérmica tinha sobretudo as funções de protecção, absorção de calor e estabilidade durante a locomoção. No entanto, nem a espécie nem o género do animal puderam ser determinados.
Este tipo de crocodilomorfos podia atingir mais de cinco metros de comprimento. Estimou-se que o novo fóssil mediria, porém, menos de um metro de comprimento, daí que os investigadores lhe tenham dado carinhosamente a alcunha de Crocodilinho. Também não sabem ainda se seria um juvenil ou um animal de uma espécie pequena, um mistério reservado à investigação ainda em curso.