Bateria de iões de lítio consegue carregar carros eléctricos em dez minutos
Cientistas dos Estados Unidos conseguiram que bateria de iões de lítio carregada durante dez minutos garanta autonomia de mais de 300 quilómetros de viagem.
E se fosse possível carregar a bateria de um carro eléctrico em apenas dez minutos? Uma equipa de cientistas dos Estados Unidos anunciou esta quarta-feira na revista científica Joule que já se esteve mais longe de se conseguir esse feito. Afinal, o grupo de cientistas desenvolveu uma bateria de iões de lítio para carros eléctricos que pode ser carregada em dez minutos e garantir uma autonomia de mais de 300 quilómetros. Espera-se que chegue ao mercado daqui a pelo menos três anos.
“Os veículos eléctricos só serão verdadeiramente competitivos quando conseguirem ser carregados de forma tão rápida como o reabastecimento do depósito de combustível”, refere-se no artigo científico. As baterias de iões de lítio poderão ter um papel importante para tornar os carros eléctricos mais autónomos.
Mas, conseguir que uma bateria de iões de lítio se carregue rapidamente e que “guarde” muita energia sem se degradar são grandes obstáculos. De acordo com um comunicado sobre o trabalho, quando se consegue que uma bateria de iões de lítio alcance 400 quilowatts de energia de forma rápida, começa a formar-se lítio metálico à volta do eléctrodo ânodo (o lado negativo da bateria), o que poderá deteriorar gravemente o funcionamento da bateria.
As baterias de iões de lítio usam electrólitos líquidos para transportar os iões de lítio entre o cátodo (o lado positivo da bateria) e o ânodo.
A equipa liderada por Chao-Yang Wang, cientista da Universidade Estadual da Pensilvânia (nos EUA), tentou contornar a acumulação de lítio metálico ao jogar com a temperatura do carregamento e descarregamento da bateria. Se normalmente as baterias de lítio se carregam e descarregam à mesma temperatura, agora conseguiu-se aumentar a temperatura de carregamento durante alguns minutos a 60 graus Celsius e diminuí-la no descarregamento.
“Pré-aquecemos a bateria e assim aumentámos muitas vezes a estimulação térmica do transporte de iões e a reacção cinética dentro da bateria, o que é necessário para aguentar o rápido fluxo de iões do cátodo para o ânodo durante o rápido carregamento”, explica ao PÚBLICO Chao-Yang Wang. No comunicado, realça-se que praticamente não se verificou a formação de lítio metálico à volta do ânodo.
O cientista adianta que conseguir que a bateria chegue até aos 60 graus Celsius pode encurtar drasticamente o tempo de vida da bateria, mas um rápido arrefecimento da bateria pode ser alcançado através de um sistema instalado no carro.
“Demonstrámos que conseguimos carregar um veículo eléctrico em dez minutos para percursos entre as 200 e as 300 milhas [de 322 a 483 quilómetros]”, assinala o cientista, explicando que nesses dez minutos se carrega 80% da capacidade da bateria sem se causar qualquer dano. A equipa conseguiu repetir o processo de carga 2500 vezes, gerando uma autonomia equivalente a 500 mil milhas (cerca de 805 mil quilómetros), mas 20% da bateria acabava por ficar degradada.
Preço idêntico
Chao-Yang Wang estima que estas baterias cheguem ao mercado nos próximos dois ou três anos depois de vários testes em veículos. Quanto ao preço, será quase o mesmo do de uma bateria de iões de lítio convencional, que depende de fabricante para fabricante e do volume. “Relativamente às baterias de iões de lítio, esta bateria custará apenas mais 0,4%”, indica.
Por enquanto, a equipa está a tentar alcançar outro feito: conseguir que uma bateria de iões de lítio se carregue em cinco minutos. “Assim será mesmo como reabastecer o depósito de gasolina”, realça Chao-Yang Wang.
“No passado, era universalmente aceite que as baterias de iões de lítio não deveriam operar a elevadas temperaturas porque se receavam as suas reacções secundárias”, diz. “Este estudo sugere que os benefícios de se mitigar a formação de lítio metálico à volta do ânodo a elevadas temperaturas e com uma exposição de tempo limitada ultrapassa o impacto negativo associado a reacções secundárias exacerbadas.”
O desenvolvimento da bateria de iões de lítio valeu o Prémio Nobel da Química deste ano a John B. Goodenough, M. Stanley Whittingham e Akira Yoshino. Leve, recarregável e potente, a bateria de iões de lítio é usada em telemóveis, computadores e em carros eléctricos. “As baterias de lítio também permitiram o desenvolvimento de carros eléctricos de longo alcance e o armazenamento de energia de fontes renováveis, como energia solar e eólica”, indicava-se mesmo num comunicado do prémio.
Referia-se ainda que a base das baterias de lítio foi lançada durante a crise do petróleo na década de 70 e que entraram no mercado nos anos 90. “As baterias de iões de lítio revolucionaram as nossas vidas desde que entraram no mercado em 1991. Estabeleceram a fundação de uma sociedade sem fios, livre de combustíveis fósseis, e são um dos maiores benefícios para a humanidade”, lê-se. Como têm a capacidade de armazenar energia solar e eólica, podem ser uma alternativa aos combustíveis fósseis. Portugal tem grupos de investigação a trabalhar nestas áreas.
Mas nem tudo o que diz respeito ao lítio tem sido linear. Nos últimos tempos, tem existido uma discussão sobre os custos e benefícios económicos e ambientais da exploração de lítio em Portugal.
Já John Goodenough, através de uma entrevista em vídeo divulgada na Conferência Internacional Mission 10,000: Batteries que realizou em Braga em Outubro, chamou à atenção para outras alternativas ao lítio. “A criação de alternativas à tecnologia de iões de lítio não é um problema fácil. O futuro do armazenamento de energia vai passar por conseguirmos desenvolver baterias com recurso, por exemplo, ao sódio e ao potássio, que são elementos abundantes e não apresentam os problemas diplomáticos que o lítio tem”, referiu.
Por agora, as baterias de iões de lítio continuam a ocupar um lugar importante na nossa vida. Em breve, será possível carregar o carro eléctrico enquanto se toma um café ou até em menos tempo do que isso.