Johnson marca eleições para 12 de Dezembro com a bênção (e os votos) de Corbyn
Líder trabalhista deu luz verde ao agendamento de legislativas e o Parlamento britânico aceita a proposta do Governo para convocar eleições para o fim do ano.
À quarta tentativa, dirigentes, deputados e partidos políticos britânicos chegaram finalmente a um acordo, esta terça-feira, para a realização de eleições antecipadas, que a maioria acredita ser a única forma de desbloquear o “Brexit”. Com o apoio do Partido Trabalhista, o Governo de Boris Johnson conseguiu fazer aprovar na Câmara dos Comuns o agendamento de legislativas para o dia 12 de Dezembro. Uma data diferente da que a oposição gostaria – sugeriu o dia 9 – mas que não impede o país de ir às urnas.
No mesmo dia em que o Conselho Europeu oficializou o (terceiro) adiamento da data da desfiliação do clube europeu, até Janeiro de 2020, a mudança de posição de Jeremy Corbyn – que aceitou finalmente que os riscos de um “Brexit” sem acordo a 31 de Outubro tinham desaparecido – foi fundamental para a marcação das eleições, estendendo a mão ao Partido Conservador, que não tem maioria na câmara baixa de Westminster.
A aprovação da proposta de lei na generalidade nem precisou de uma votação: foi acolhida por aclamação. Já a emenda apresentada pela oposição para adiantar a data das legislativas para 9 de Dezembro recebeu 295 votos a favor e 315 contra. A votação do texto final teve 438 votos contra 20. Para o processo legislativo ficar definitivamente concluído, fica a faltar a autorização da Câmara dos Lordes, na quarta-feira.
Depois de ter perdido uma votação Câmara dos Comuns, na segunda-feira, para tentar agendar a eleição para o dia 12 de Dezembro – foi a terceira tentativa de antecipar o acto eleitoral –, o Governo acolheu esta terça-feira uma sugestão dos Liberais-Democratas e do Partido Nacional Escocês (SNP) e avançou com a sua própria versão de um plano alternativo. Em vez da maioria de dois terços, exigida por lei, para aprovar uma moção e convocar eleições antecipadas, o executivo apresentou uma proposta de lei temporária, mas com o mesmo propósito.
A vantagem desta via era que exigia apenas maioria simples, a desvantagem é que permitia a apresentação de emendas. E nestes longos três anos e meio de “Brexit” e de votações desconcertantes na Câmara dos Comuns de Westminster, não faltaram casos de mudanças súbitas de prioridades do Governo e do sentido de voto dos deputados, por causa de emendas que alteraram, em grande medida, o propósito inicial das moções e propostas.
Um novo normal que, num dia em que o Parlamento procurava resolver em seis horas um procedimento legislativo que, habitualmente, duraria vários dias, fez com que o risco de uma emenda poder voltar a baralhar as contas ao Governo e à oposição fosse elevadíssimo. E o “fantasma” das emendas pairou durante largas horas sobre o futuro da proposta de lei, esta terça-feira.
Se a declaração de intenções do Partido Trabalhista fez crer que a votação da proposta do Governo seria uma mera formalidade para abrir caminho para as primeiras legislativas natalícias no Reino Unido desde 1923, a apresentação de emendas que pretendia abrir a votação a jovens de 16 e 17 anos e aos cidadãos europeus, levou Downing Street a ameaçar retirar a sua proposta de lei e lançar o processo de novo para a estaca zero.
Labour, Liberais-Democratas e SNP mostraram-se disponíveis para votar favoravelmente estas emendas, mas o speaker-adjunto da Câmara dos Comuns, Lindsay Hoyle, acabou por não as levar a votos.
Afastado esse cenário, a principal dúvida da votação estava relacionada com a data concreta das legislativas. O Governo propôs novamente o dia 12 de Dezembro, mas o Partido Trabalhista, os Liberais-Democratas e o Partido Nacional Escocês (SNP) propuseram fixar a data no dia 9, para permitir que os estudantes universitários – que entram de férias no dia 13 e que são uma componente relevante do seu eleitorado – não tivessem constrangimentos no exercício do seu voto. Venceu o Governo.
“Campanha radical”
O tabuleiro começou a virar para o lado do Governo na manhã desta terça-feira, quando Corbyn decidiu chutar para canto as suas indecisões e assumir, de uma vez por todas, e contra os conselhos de vários elementos da sua própria bancada – que consideram um erro avançar para eleições nos termos definidos por um Boris Johnson claramente favorito –, que o Partido Trabalhista estava “preparado” para ir a votos “independentemente da data que a câmara escolher”.
“Ouvimos a União Europeia confirmar a extensão da aplicação do prazo do artigo 50 até 31 de Janeiro, por isso, nos próximos três meses, a nossa exigência de retirar o no-deal de cima da mesa foi garantida”, justificou o líder do Labour, adoptando logo de seguida um discurso clássico de pré-campanha.
“Vamos agora lançar a campanha eleitoral mais ambiciosa e radical que este país já viu. Mal posso esperar por ir para as ruas. O Labour vai estar em todas as cidades e vilas deste país a oferecer uma mensagem de verdadeira esperança nos temas em que o Governo nada oferece”, prometeu.
Do lado do Governo, a estratégia para as eleições já está a ser preparada há alguns meses. Johnson quer atirar para cima da oposição e do Parlamento a responsabilidade pelo adiamento do “Brexit” – os termos “traição”, “capitulação”, “guerra” ou “dia do juízo final” foram recorrentemente utilizados pelo primeiro-ministro e sua equipa – e esta terça-feira voltou a insistir nessa via.
“Em virtude do obstrucionismo parlamentar constante, só há um caminho para cumprirmos o ‘Brexit’ e o mandato que nos foi dado pela população: actualizarmos este Parlamento e oferecermos uma escolha às pessoas”, atirou Boris Johnson. Temos eleição.