Atrasos dos “juízes” do Sul da Ordem dos Médicos vão ser avaliados
Conselho Disciplinar do Sul reúne-se esta terça-feira “para fazer o ponto da situação” dos processos do obstetra de Setúbal. Presidente deste órgão frisa que não haverá decisões com base “no que se diz na praça pública”.
O Conselho Disciplinar do Sul da Ordem dos Médicos (OM), que tem pendentes cinco dos nove processos contra o obstetra Artur Carvalho (os restantes quatro foram arquivados), é constituído por 17 elementos desde 2015, quando os estatutos da Ordem foram alterados e este órgão foi substancialmente reforçado de forma a poder dar resposta a um número crescente de queixas e reclamações.
O último caso, o do bebé que nasceu no hospital de Setúbal com malformações na face e a nível neurológico, ainda não deu entrada neste órgão. Será a décima queixa e o Conselho Disciplinar do Sul vai reunir-se esta terça-feira “para fazer o ponto da situação”. Só depois se poderá equacionar a hipótese de suspensão preventiva do obstetra que é acusado de não ter detectado as graves malformações nas ecografias.
É preciso perceber se os processos são pelos mesmos motivos e, caso se avance para a suspensão, o médico terá que ser ouvido presencialmente ou por escrito, explicou ao PÚBLICO o presidente deste órgão da OM, Carlos Pereira Alves, que na sexta-feira tinha garantido também que iriam ouvir o médico já nesta reunião de onde poderia sair a suspensão preventiva.
Sobre os processos que dizem respeito a Artur Carvalho, o médico nota que esta espécie de tribunal não pode tomar decisões com base apenas “no que se diz na praça pública”. “Temos que basear-nos em factos”, sublinha. “Não foram as ecografias que provocaram as malformações dos bebés. O que é preciso apurar é se as ecografias foram feitas dentro do timing adequado e se as imagens permitiam ver as malformações”, afirma. Quanto aos atrasos na avaliação dos processos, retorque que há circuitos a respeitar e estes “não podem ser simplificados”. Há também instituições que demoram muito tempo a responder aos pedidos de informação e pareceres, acrescenta. O processo mais antigo que ainda corre contra o médico data de 2013.
Antes da alteração dos estatutos da OM, o Conselho Disciplinar do Sul incluía apenas cinco médicos e os processos aglomeravam-se. Actualmente, mesmo com 17 médicos, há centenas de processos que continuam pendentes, a aguardar decisão – no ano passado eram 1466 . Em comparação, os conselhos disciplinares do Norte e do Centro tinham 185 e 337 processos pendentes, respectivamente.
“Não há justificação aparente para que se mantenham estes atrasos que não dignificam a Ordem dos Médicos e não salvaguardam os direitos dos utentes”, considera o ex-bastonário José Manuel Silva, que é o presidente do Conselho Superior da OM, uma espécie de Supremo Tribunal de Justiça da Ordem para onde os médicos que são condenados e os queixosos que se sentem injustiçados podem recorrer das decisões dos conselhos disciplinares. “Ninguém pode aceitar que haja tantos processos atrasados”, defende.
José Manuel Silva promete “analisar os números da produtividade” de cada conselho disciplinar e “exercer uma magistratura de influência no sentido de as diferenças serem colmatadas”, depois de ter recebido uma carta do actual bastonário a pedir a sua intervenção. Quanto ao caso do médico Artur Carvalho, sem conhecer os processos em que ele é acusado, o ex-bastonário limita-se a observar que “ninguém pode achar que é normal” acumular tantas reclamações.
Mas não deixa, ainda assim, de recordar que o Conselho Disciplinar do Sul tinha muitos processos pendentes e critica o Estado por “não ter colaborado, ao não aceitar a sua recomendação” no sentido de que estes médicos fossem libertados de algumas horas de trabalho no SNS para poderem dar seguimento célere às queixas.
“Eles trabalham pro bono [de graça] e analisam os processos à noite e ao fim-de-semana”, nota. O presidente do Conselho Disciplinar do Sul também enfatiza a dificuldade de dar andamento a tantos processos – “são duas a três queixas por dia” –, com apenas um jurista a colaborar e um apoio administrativo insuficiente. No ano passado, foram abertos 609 processos e encerrados 429, condenados 14 médicos, tendo quatro sido suspensos.