Um Governo para enterrar de vez a “geringonça”
Se a nomeação dos ministros foi uma decepção que traduzia conformismo e falta de ideias, a organização das secretarias de Estado, os nomes escolhidos e a sua lógica operacional dão-nos conta de uma preocupação em executar políticas que diluem a ideia de um Governo preocupado com a sobrevivência.
Uma das maiores dores de cabeça do novo Governo é ter na sua orgânica demasiadas áreas de sobreposição. Como as que se dedicam ao interior, com o desenvolvimento regional, a valorização do interior, as florestas, o planeamento ou o desenvolvimento rural a pretenderem acudir a um problema com a mesma causa. Mas, também neste particular, a sobreposição denuncia um voluntarismo que não deve merecer uma rejeição liminar.
Porque, ao contrário da anterior, a orgânica do segundo Governo de António Costa tem na sua matriz uma clara preocupação executiva e não apenas um objectivo de gestão corrente. Se a nomeação dos ministros foi uma decepção que traduzia conformismo e falta de ideias, a organização das secretarias de Estado, os nomes escolhidos e a sua lógica operacional dão-nos conta de uma preocupação em executar políticas que diluem a ideia de um Governo preocupado com a sobrevivência.
Numa declaração desta terça-feira, o primeiro-ministro deu corpo a esta vontade ao anunciar a contratação de mil quadros superiores para fornecerem aos ministérios capacidade de estudo, de planeamento e de tomada de decisão. O Estado precisa deste reforço desesperadamente se quiser ter políticas públicas com qualidade e profundidade. Mas num país onde há tanto para fazer, igualmente importante era uma definição de prioridades. As respostas dadas pela orgânica e pela escolha dos nomes são a esse propósito satisfatórias.
A economia ganha uma centralidade indiscutível (colmatando um problema que aqui denunciámos reiteradamente), a acção climática também, a modernização do Estado ganha peso, as assimetrias territoriais ganham um ministério e o investimento em infraestruturas obtém um novo músculo. Há áreas críticas a merecer relevo, como a transição digital, a inclusão ou as migrações. E ao nível dos secretários de Estado, este é um Governo que capta académicos, autarcas ou gestores e procura trazer para o centro do poder protagonistas de diferentes partes do país.
Os Governos são como os melões – só se sabe o que valem quando actuam -, mas este merece o benefício da dúvida. Porque se implica riscos, sendo o maior o desmantelamento da Agricultura e a subordinação de um dos importantes recursos económicos do país, a floresta, à óptica da conservação, também pressupõe uma visão.
Em vez de focar o seu mandato na distribuição, este modelo empenha-se na criação de riqueza, nas reformas do Estado e na gestão do território. Faz-se assim o funeral da era da troika e das contingências que impuseram a “geringonça” e regressa-se ao fundamental: a uma ideia de país que tem de ser mais próspero, moderno e competitivo para dessa forma se tornar mais justo e solidário.