Lista Vermelha de Invertebrados: há menos insectos em Portugal

A primeira apresentação pública do projecto da Lista Vermelha de Invertebrados de Portugal Continental decorre este sábado, na Lousã, onde se reúnem mais de 40 investigadores da equipa do projecto. Resultados finais deste documento serão conhecidos em 2021.

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Escaravelho da espécie Lucanus cervus Rui Félix

A lista dos invertebrados em risco de extinção em Portugal será conhecida em 2021, mas os especialistas já têm a certeza de que há falta de informação e de que “há menos insectos de forma geral” relativamente aos números das últimas décadas, afirma à agência Lusa Carla Rego, coordenadora executiva do projecto da primeira Lista Vermelha de Invertebrados Terrestres e de Água Doce de Portugal Continental. Há também menos crustáceos de água doce devido às plantas aquáticas invasoras, às práticas humanas e às alterações climáticas.

Se é certo que o país perdeu “muita biomassa de insectos” é, no entanto, prematuro dizer que espécies estarão ameaçadas, diz Carla Rego. E lembra outro dado, este garantido: se todos os insectos polinizadores desaparecessem também desapareciam 80% dos produtos à venda nos supermercados. Carla Rego falava à Lusa a propósito da primeira apresentação pública do projecto da Lista Vermelha de Invertebrados, que decorre no sábado na Lousã, onde se reúnem mais de quatro dezenas de investigadores da equipa do projecto, que vão explicar o que está a ser feito para avaliar os riscos de extinção de invertebrados em Portugal. As conclusões finais só vão ser conhecidas em 2021.

Dentro dos animais invertebrados (os que não possuem coluna vertebral), incluem-se todos os insectos e animais como aranhas, caracóis ou lesmas e mexilhões do rio, e nem sempre são os mais queridos pela população, que chega a ter nojo ou medo, reconhece Carla Rego, do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (cE3C), da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Carla Rego, que também é vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Entomologia (SPEN) e membro do grupo de especialistas da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) em invertebrados das ilhas atlânticas, salienta a importância desse mundo para muitos desconhecidos. Só espécies de abelhas em Portugal são 680, diz. Em Portugal estima-se que existam entre 30 mil a 40 mil espécies de invertebrados, muitas delas naturais apenas do país, e a Lista Vermelha pretende conhecer as espécies ameaçadas e promover medidas de conservação. 

Aves são prejudicadas

O trabalho começou há mais de seis meses com quase uma centena de investigadores, que numa primeira fase vão avaliar 700 a 800 espécies. Houve também até agora recolha de informações em museus e colecções particulares. Carla Rego diz que há ainda muito trabalho pela frente até 2021, quando acaba o financiamento, e admite que era importante continuar o trabalho além dessa data, analisando mais espécies e analisando também todas as espécies que cabem na “Directiva Habitats” (de conservação dos habitats naturais e de espécies da flora e fauna selvagens consideradas ameaçadas, com excepção das aves, protegidas pela Directiva Aves).

E o “declínio generalizado” da população de insectos está a levar a outro declínio que é mais visível: o das aves que dependem deles. Os pardais são um exemplo, diz Carla Rego. Em Espanha, lembra a entomóloga, a prática de apanhar azeitona à noite, de forma mecânica, está a matar “milhões de aves” (que pernoitam nas oliveiras). “Quantos milhões de insectos não morrerão também?” As práticas de regadio não aconselhadas ou o excesso de eucaliptos, que consomem muita água, são outros exemplos. “Estamos a depauperar os solos, são tudo ameaças que vão ficar no documento final porque já há muitas evidências”, afirma.

O trabalho nesta área não é fácil, porque o financiamento é escasso, reconhece a cientista. “É muito complicado dar respostas porque nem sabemos o que temos, quanto mais o que temos de proteger”. Carla Rego admitiu que nas redes sociais “há grande dinamismo”, que as crianças são receptivas ao conhecimento e ao estudo dos invertebrados, mas finaliza com um exemplo: não há em Portugal um especialista em lesmas, no grupo de trabalho está uma especialista que veio de Espanha.

“Chegar aos decisores e dizer que há uma lesma ameaçada pode não ter grande efeito”, admite, acrescentando que muitas vezes é preciso proteger um habitat como forma de proteger uma espécie. E é para isso que o Livro Vermelho é necessário. As primeiras listas vermelhas em Portugal têm 30 anos e foram dirigidas a espécies de vertebrados, tendo começado a ser revistas há dois anos. Só em Março deste ano se começou a trabalhar na primeira Lista Vermelha dos Invertebrados.

“Estamos muito atrasados e, neste caso, em desvantagem porque as pessoas ou não se interessam por insectos ou têm medo deles”, lamenta a especialista. E, no entanto, sem insectos que se alimentam de dejectos, “vivíamos atolados em dejectos”, sem insectos que decompusessem madeira morta perdíamos a qualidade dos solos. Esta lista vermelha falará deles porque são o maior número de espécies no grupo de invertebrados, mas também falará de outros seres, igualmente pequenos e nem sempre queridos. Carla Rego promete informações para breve. O trabalho mais avançado é em relação a aranhas.