Acne no Instagram? As mulheres russas partilham as suas imagens de beleza
A sociedade russa é ainda “muito patriarcal” e as mulheres russas ainda muito conscientes da sua aparência, seguindo padrões de beleza estritos. Mas o que acontece quando um grupo de mulheres desafia esses padrões no Instagram?
Há uma nova tendência a motivar milhares de mulheres russas a publicar selfies nas redes sociais onde mostram as suas borbulhas, celulite e perda de cabelo. O objectivo? Desafiar os estereótipos de beleza que, de acordo com os activistas dos direitos das mulheres, fomentam a baixa auto-estima e os distúrbios alimentares.
A hashtag #AllIsFineWithMe (#EstáTudoBemComigo, numa tradução livre) — que arrancou graças a uma adolescente russa que lutava contra a anorexia — é a última iniciativa para acabar com as pressões irrealistas impostas a mulheres e raparigas para que pareçam perfeitas, normalmente alimentadas por imagens alteradas nas redes sociais.
“A sociedade russa é ainda muito patriarcal, as mulheres são muito conscientes do próprio corpo, os padrões de beleza são estritos e o body-shaming, uma realidade do quotidiano”, disse Janette Akhilgova, consultora de direitos das mulheres na Rússia para o grupo Equality Now. “[Estas] Campanhas são uma forma positiva de deixar que as pessoas vejam que podem aceitar o seu próprio corpo e libertar-se dos constrangimentos que podem destruir a saúde física e mental. São sobre diversidade, inclusão e aceitação.”
Das passerelles com modelos plus size às companhias aéreas que dispensam a maquilhagem obrigatória para as suas assistentes de bordo, há um número crescente de iniciativas que promovem uma imagem corporal positiva em todo o mundo e estão a encorajar as mulheres a celebrar a sua aparência. Este novo projecto vem nesse encalço.
Como é ser mulher na Rússia?
As expectativas sociais ditam que as mulheres russas se vistam para agradar aos homens. Por diversas vezes, as feministas russas salientaram que os estereótipos de género antiquados e o conservadorismo – patentes em questões do dia-a-dia como a lei de 2017, também conhecida como a “lei da bofetada”, que descriminalizou a violência doméstica, a menos que requeira tratamento hospitalar — são ainda uma realidade naquele país.
Numa tentativa de mudar isso, a influencer Tysya desafiou os seus 1.2 milhões de seguidores a publicarem fotos deles próprios sem maquilhagem com a hashtag #SoMnoyVsyoTak ou #AllIsFineWithMe. “Na Rússia mostramos a muito poucas pessoas os nossos corpos normais”, disse Natalia Zemlianukhina, mais conhecida como Tysya, entrevistada por e-mail pela Thomson Reuters Foundation.
As raparigas que não são magras, têm acne ou outros traços diferentes são normalmente vítimas de bullying nas escolas e pressionadas a fazer dieta, continuou Zemlianukhina, acrescentando que ela própria lutou contra a anorexia – uma doença que leva a que os doentes se privem de comer devido ao receio obsessivo de ficarem gordos. “#AllIsFineWithMe diz-nos que todos os corpos são aceitáveis e bonitos. Não há corpos que precisem de ser trabalhados, melhorados ou mudados.”
Mais de 2500 pessoas usaram a hashtag e o vídeo que promove a campanha — e que conta com modelos com cicatrizes ou queimaduras — já soma um milhão de visualizações e centenas de comentários. “Eu sou como sou e tentar esconder essas falhas diligentemente é um desperdício de tempo”, escreveu uma utilizadora do Instagram, que acrescentou ter apenas uma mão devido a um defeito congénito.
“Tenho uma data de características: uma pele pouco uniforme devido ao acne e pós-acne, excesso de peso, celulite, estrias [mas] #EstáTudoBemComigo apesar de algumas pessoas tentarem convencer-me do contrário”, escreveu outra utilizadora.
No entanto, nem toda a gente apoiou a campanha, e alguns utilizadores defendem que promove estilos de vida pouco saudáveis. “Todas estas miúdas gordas que se aceitam como são vão sofrer de diabetes quando forem mais velhas”, comentou uma das utilizadoras. Akhilgova, da associação Equality Now, afirmou, por seu turno, que a campanha mostrou que algumas mulheres russas acham que os ideais de beleza nacionais são nocivos para a auto-estima das raparigas mais jovens.
“Até há poucos anos, a agenda feminista na Rússia era quase invisível, mas actualmente tem muito mais exposição”, acrescentou, por e-mail. “Este é o reflexo das novas abordagens das campanhas publicitárias, o tipo de conteúdo de beleza e moda que aparece nas revistas, e o número crescente de mensagens nas redes sociais com um foco mais positivo.”