Supremo Tribunal aceita recurso sobre dragagens no Sado

Juízes justificam decisão excepcional com a “grande relevância económica” da empreitada.

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Rui Gaudencio

O Supremo Tribunal Administrativo (STA) admite julgar o recurso de uma decisão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCA) que aceitou a providência cautelar contra as dragagens no rio Sado, revelou esta noite o Clube da Arrábida, a associação ambientalista que intentou a acção que visa a suspensão da empreitada.

Em Junho, o TCA tinha dado provimento parcial ao recurso apresentado pelo Clube da Arrábida e mandou o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (TAF) voltar apreciar a providência cautelar que tinha sido rejeitada em primeira instância. Nesse acórdão, o TCA admitia a possibilidade de ter sido violado o dever de audiência prévia de cidadãos e grupos interessados antes da adjudicação.

Agora, na decisão conhecida esta terça-feira, o supremo aprecia de forma contrária.

O acórdão do STA, de dia 27 de Setembro e notificado esta terça-feira às partes envolvidas, começa por reconhecer que “em princípio, as decisões proferidas em segunda instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA”, para justificar que “excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.

Neste caso, os juízes conselheiros aceitam o recurso por considerar que as “quaestiones juris” em causa “reclamam a intervenção do Supremo” e porque “a empreitada em causa é, pelo seu objecto, de grande relevância económica”. A excepcionalidade é admitida “não obstante” tratar-se de uma providência cautelar.

Em concreto, o Supremo Tribunal entende que as críticas apresentadas pela APSS à decisão da segunda instancia “não são destituídas de razão de ser”. Entre essas críticas, este novo acórdão conclui que “avultam duas”. Que “houve, deveras”, a audiência prévia que o Tribunal Central admitia não ter existido, e que os juízes desembargadores silenciaram o problema da tempestividade da acção principal (na parte relativa à invalidade do contrato)”, o que constitui “erro de julgamento”.

Os juízes do STA dizem que o “acórdão [do TCA] impressiona pela sua aparente aceitação de que a validade dos contratos está facilmente à mercê de terceiros”. O acórdão do supremo, a que o PÚBLICO teve acesso, conclui que “o TCA fundou a sua pronúncia no vício de preterição de uma audiência prévia. Absteve-se, contudo, de esclarecer em que procedimento ela se verificou.

À luz do referido art. 40, que exige tal audiência aquando da “adopção de planos”, parece que o vício, a existir, ocorreu no procedimento de aprovação do Plano Estratégico adoptado pela Resolução do Conselho de Ministros n.° 61-AJ20l5, de 20/8 — a qual não vem questionada no presente meio cautelar. E, se assim realmente for, o aresto recorrido gerará uma imediata perplexidade; pois afirma a provável nulidade de um negócio por causa de um vício de trâmite ocorrido num procedimento diferente do pré-contratual e que culminou numa Resolução não sindicada.”

Com esta fundamentação, o Supremo Tribunal Administrativo decide aceitar o recurso com que a administração portuária pretende evitar a decisão da providência cautelar.

Última esperança contra dragagens

Os ambientalistas dizem que a providência cautelar objecto deste “ping-pong” de recursos “pode ser uma das últimas esperanças para travar o início das dragagens no rio Sado”, previstas arrancar neste mês de Outubro.

O presidente do Clube da Arrábida já disse, esta noite, que o acórdão do supremo é ainda “um mero despacho de admissão do recurso”, e a decisão final do mesmo, pelo que a associação mantém a “esperança” que “o STA venha a julgar improcedente o referido recurso, obrigando assim o TAF a reavaliar a providência cautelar em causa”. 

“Independente daquela que venha a ser a decisão final do STA, o Clube da Arrábida continua e continuará sempre a considerar que a razão está do seu lado, que as dragagens que a APSS pretende levar a cabo são o maior atentado ambiental alguma vez realizado no rio Sado, sabendo ainda que não está sozinho, como o demonstra o número de associações defensoras do ambiente que se juntaram a esta “luta” e aos mais de mil cidadãos anónimos presentes na manifestação que ocorreu no passado dia 28, em Setúbal”, refere um comunicado assinado por Pedro Vieira, presidente desta associação ambientalista.

A empreitada de Melhoria das Acessibilidades Marítimas ao Porto de Setúbal foi adjudicada, no valor de quase 25 milhões de euros, à empresa Mota-Engil e as obras, sendo que as dragagens, para a retirada de 3,5 milhões de metros quadrados do leito do rio, apenas podem ser feitas, de acordo com a Declaração de Impacto ambiental, no período entre os meses de Outubro e Maio.

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