Vizinhos tentam embargar obras “ilegais” no Teatro do Bairro Alto

Condomínio alega que a EGEAC está a fazer obras que põem em perigo um troço do Aqueduto das Águas Livres. Projecto de reabilitação do teatro ainda não está aprovado, mas câmara diz que os trabalhos em curso não precisam de licenciamento. Empresa diz que o aqueduto não corre riscos.

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No Teatro do Bairro Alto funcionou, durante muitos anos, a Cornucópia Nuno Ferreira Santos

A administração do condomínio Residências de São Bento acusa a empresa municipal de cultura de Lisboa (EGEAC) de estar a fazer obras ilegais nas traseiras do Teatro do Bairro Alto que põem em risco um troço do Aqueduto das Águas Livres. O condomínio pediu na semana passada à câmara de Lisboa que embargue os trabalhos, mas tanto a autarquia como a EGEAC dizem que eles são legais e que o aqueduto não corre perigo.

O Teatro do Bairro Alto, onde funcionou durante muitos anos a Cornucópia, foi arrendado pela EGEAC depois da reorganização da rede de teatros municipais de Lisboa. O edifício tem entrada pela Rua Tenente Cascais, mas nas traseiras existe um logradouro situado por cima do Aqueduto das Águas Livres, ao qual se acede pelo Largo Hintze Ribeiro. Esse troço do aqueduto, conhecido como Galeria da Esperança, delimita o jardim do condomínio em toda a extensão. Entre esse jardim e o logradouro do teatro há um desnível de vários metros.

Nem todo o terreno que está por cima do aqueduto pertence ao teatro – que é de um proprietário privado a quem a EGEAC paga renda. Existe uma faixa, situada no limite do jardim do condomínio, que é municipal, e onde a EGEAC quer criar uma saída de emergência para o teatro. Apesar de a câmara ainda não ter aprovado a cedência dessa faixa de terreno à sua empresa de cultura, esta começou há algumas semanas a mexer ali.

Acontece que o projecto de reabilitação do teatro ainda não teve despacho favorável dos serviços de Urbanismo da câmara, o que leva o condomínio a considerar que estas obras são ilegais. A autarquia nega-o. “Os trabalhos executados até ao momento não carecem de licenciamento”, garante a câmara em respostas ao PÚBLICO.

O projecto de remodelação do edifício entrou nos serviços camarários em Janeiro deste ano e até ao momento ainda está “em apreciação”, confirma a autarquia. Também confirmado está que “o processo de cedência [do terreno municipal] está em apreciação nos serviços do Património” e que estes “estão a acompanhar as acções em curso por parte da EGEAC.”

E que acções são essas, afinal? “A EGEAC apenas implantou um tubo para passagem de infra-estruturas eléctricas e de segurança e um gradeamento junto à saída de emergência”, responde esta entidade. A empresa sustenta que os trabalhos “se destinam à reabertura do espaço em condições de segurança” e que “não carecem de licenciamento da câmara”, tendo sido “validados pela Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC)”.

Para Teresa de Melo Ribeiro, advogada do condomínio privado, as explicações não colhem. “Não concordo e não subscrevo. Estão a ocupar ilegal e indevidamente um terreno municipal. Além disso, a DGPC pronunciou-se apenas com base num projecto. Quem licencia as obras é a câmara municipal”, afirma.

A DGPC confirma ao PÚBLICO que emitiu um “parecer favorável condicionado” a todo projecto, incluindo a colocação de um gradeamento por cima do aqueduto. “A referida guarda metálica foi fixa não no aqueduto, mas num novo murete (com cerca de 20/30 centímetros de altura), executado sobre o muro de suporte de terras de cronologia aparentemente mais recente que a construção original do aqueduto”, adianta aquele organismo.

21 centímetros

No seu parecer, a DGPC impõe duas condicionantes para dar luz verde aos trabalhos. Que “não ocorra a afectação do troço do Aqueduto das Águas Livres e que o monumento classificado mantenha a sua integridade” e que “todos os trabalhos da obra que impliquem mobilização de terras sejam alvo de acompanhamento arqueológico”.

No requerimento que enviou à câmara, Teresa de Melo Ribeiro argumenta que estas condições não estão a ser respeitadas. “As obras e trabalhos que estão neste momento a ser executados no local pela EGEAC, para além de estarem a ser executados sem a necessária licença, estão a pôr em risco a integridade do troço do Aqueduto das Águas Livres”, acusa, sublinhando a ocorrência de “sucessivas descargas de material e a movimentação, circulação e manobra de um elevado número de veículos ligeiros e pesados”.

A advogada cita uma informação técnica dos serviços da câmara que alerta para o perigo de tal situação. “A circulação e manobra de veículos de cargas/descargas sobre o aqueduto no terreno municipal pode ser incompatível com a capacidade de carga do aqueduto”, diz esse documento, onde também se lê que “a profundidade do aqueduto relativamente ao pavimento à superfície varia, sendo que num dos locais da sondagem o aqueduto se apresentou apenas a 21 centímetros da superfície”.

A EGEAC garante que “a integridade do aqueduto está assegurada e foi devidamente acompanhada pela EPAL, a proprietária do monumento”. Diz também que as intervenções a que se refere o projecto de remodelação, que aguarda aprovação municipal, estão “previstas para 2020” e que incluem “a colocação, na orla do aqueduto, de uma cortina vegetal que aumenta a privacidade da vizinhança e protege o monumento.”

“Todos os passos têm tido uma articulação estreita com diversos serviços da câmara, DGPC e Inspecção-Geral das Actividades Culturais”, refere a empresa. “A articulação estreita não é suficiente para ultrapassar as exigências legais”, comenta a advogada do condomínio, que não desarma. “Conto continuar em cima do assunto e assegurar que as normas legais são respeitadas.”

Até agora, nem a câmara nem a EGEAC deram resposta ao requerimento de embargo. O Teatro do Bairro Alto tem abertura marcada para 11 de Outubro.

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