Cancro: doentes não aceitam “racionamento” de fármacos e denunciam atrasos em exames
Associações sugerem a doentes que as contactem para expôr dificuldades e obter informações.
Cinco associações de doentes oncológicos juntaram-se para criticar as barreiras na aprovação de alguns medicamentos inovadores, mas também os atrasos “muito relevantes” que se têm verificado na autorização de novos fármacos já aprovados pela Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed).
Afirmando-se “totalmente contra” qualquer tipo de “racionamento no acesso aos melhores tratamentos”, alertaram, esta segunda-feira no Porto em conferência de imprensa, para o “agravamento dos cuidados de saúde em oncologia” e apelaram aos doentes que tenham dificuldades e necessitem de informações que contactem as associações.
Mas os problemas não se restringem ao difícil acesso às novas terapêuticas: há “um enorme alargamento do prazo para a realização dos exames” necessários tanto para o diagnóstico e o início do tratamento, como para o “estadiamento” da patologia, o que provoca um “agravamento significativo da doença”, afirmam. Exames “tão simples como raios X, TAC, ressonâncias, etc”, especifica Vítor Neves, da associação Europacolon Portugal (cancro digestivo).
Além da Europacolon, estiveram presentes as associações Pulmonale (cancro do pulmão), a de leucemias e linfomas, a de doentes da próstata e a “Careca Power”. Juntas, representam 35 mil novos casos de cancro por ano, com uma mortalidade superior a 18 mil pessoas.
Exigem “total transparência"
Congratulando-se pela posição pública protagonizada pelo colégio da especialidade de Oncologia e o conselho nacional da Ordem dos Médicos (OM), exigem que os processos de aprovação dos novos fármacos sejam efectuados com “total transparência”. Foi há duas semanas que o problema se tornou público, depois de o Expresso ter divulgado a carta em que o colégio de oncologia da Ordem dos Médicos que denunciava a existência de limitações e barreiras no Serviço Nacional de Saúde (SNS) no acesso a medicamentos inovadores que podem ser usados em fases mais precoces de alguns cancros.
Em causa estão vários medicamentos para o tratamento de cancros do pulmão, próstata, mama e melanoma, segundo especificou o presidente deste colégio da OM, Luís Costa. São fármacos que já estão a ser usados em casos de cancro metastizado (espalhado por outros órgãos) e que terão mostrado eficácia na redução do risco de ressurgimento da doença e no aumento de sobrevivência, quando usados em fases mais precoces. São negados, porém, quando está em causa o “risco de vida”, sendo apenas autorizados quando o doente está em “risco imediato de vida”. Uma limitação “desumana”, reagem os responsáveis das associações.
Para além dos atrasos na aprovação, pelo Infarmed, dos fármacos inovadores - que ainda estão em avaliação fármaco-económica e por isso são disponibilizados através de autorizações de utilização excepcional e programas de acesso precoce -, tem havido “atrasos muito relevantes” na autorização de fármacos pelas comissões de farmácia e terapêutica hospitalares e pela comissão nacional.
São terapêuticas que, por vezes, têm que ser submetidas à aprovação de cabimento orçamental em cada instituição, o que, devido ao “deficiente e variável funcionamento de muitas destas comissões locais e “uma certa discricionariedade, atrasa ainda mais a disponibilização dos fármacos”, criando “uma assimetria a nível nacional”.
Para um doente oncológico “o tempo é fatal, uma questão de dias, meses, pode ser o que a pessoa vai viver ou não”, lembrou Liliana Aguiar, sobrevivente de um cancro da mama e dirigente da associação “Careca Power”. "A saúde não pode ser tratada como um número”, sublinhou, pedindo aos médicos que “informem os seus doentes de todas as alternativas”. É importante que haja uma decisão “em tempo útil e não haja uma decisão tão demorada que leve a que haja necessidade” de autorizações especiais, acentuou Isabel Magalhães, da Pulmonale.