Depois da “geringonça”, efeito do voto útil pode aumentar, defendem politólogos
André Azevedo Alves (Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica), Marco Lisi (Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa) e Pedro Magalhães (Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa) comentam o impacto do voto útil nas eleições legislativas de 6 de Outubro.
A solução governativa dos últimos quatro anos poderá aumentar o efeito do voto útil nestas eleições, segundo politólogos, apesar de perder alguma força o apelo feito pelo PS em relação aos seus parceiros de esquerda, o BE e o PCP.
A agência Lusa ouviu três politólogos - André Azevedo Alves (Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica), Marco Lisi (Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa) e Pedro Magalhães (Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa) - sobre o impacto do voto útil nas eleições legislativas de 6 de Outubro.
Pedro Magalhães explica que o voto útil - que na Ciência Política é geralmente denominado voto táctico - surge quando o eleitor, “em vez de votar no partido de cujas posições se sente mais próximo ou com o qual simpatiza, vota noutro”, tipificando três situações: quando sente que o seu voto pode ser desperdiçado; quando julga que o resultado já está decidido e quer garantir a eleição de um partido pequeno; ou quando escolhe a pensar na composição do Governo.
Marco Lisi considera que a inédita solução governativa da legislatura que agora termina - na qual todos os partidos de esquerda apoiaram parlamentarmente o Governo minoritário socialista - “derrubou uma fronteira que existia entre os eleitorados dos vários partidos e isso torna tudo muito mais instável, tudo mais incerto e tudo mais volátil”.
“A questão de votar contra as próprias orientações ideológicas [voto útil] pode ter um efeito muito maior, pode ser um fenómeno muito mais forte agora nestas eleições. É expectável que, considerando o contexto, venha a aumentar”, antecipa.
Segundo este politólogo da Universidade Nova de Lisboa, as estimativas que existem de estudos nacionais e internacionais em relação às eleições legislativas em Portugal de 2005 e 2009 apontam para que o voto útil se situou entre 5% e 7%, ou seja, foi esta a percentagem de eleitores que terá mudado de voto tendo em consideração questões tácticas.
Na perspectiva de André Azevedo Alves “o voto útil continuará necessariamente a existir”, mas antevê que “o voto útil pedido pelo PS face às alternativas mais à sua esquerda” possa “diminuir um pouco e perder força” depois da geringonça.
“Porque a motivação tradicional era que, quem quisesse evitar um governo de direita, de centro-direita ou de não esquerda deveria votar no PS porque num contexto em que o PS não teria um entendimento com os partidos mais à sua esquerda, o que era relevante era que o PS ficasse à frente do PSD. A solução governativa de 2015 veio desmentir isso”, justifica.
Para este investigador do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, o PS está a apostar “em apanhar uma parte do eleitorado centrista e até de centro-direita numa perspectiva claramente de aplicação de voto útil para ter uma maioria absoluta e dessa forma, impedir que BE e PCP estejam, depois das próximas legislativas, também mais próximos do poder”.
Objectivo oposto têm bloquistas e comunistas, e Pedro Magalhães lembra que a líder do BE, Catarina Martins, numa entrevista à agência Lusa, passou explicitamente “a mensagem de que o voto útil para os eleitores do PS que não querem uma maioria absoluta, não é obviamente no PS, é neles [Bloco]”. “A coordenadora do BE usou exactamente esta linguagem e de facto existe investigação que mostra que isto, nalguns países, nalgumas circunstâncias, nalgumas eleições, é uma consideração importante”, aponta.
Na análise deste especialista do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, também o PS já está a usar esta ideia de voto útil, como “já foi evocada pelo seu líder e primeiro-ministro, António Costa, a ideia de que um PS fraco seria um PS que geraria uma situação como em Espanha, com dificuldade de entendimento”.
“Isso foi explicitamente avançado, isso é muito a pensar no terceiro tipo de voto táctico, em particular para o evitar. Pelo contrário, obviamente, quer o PCP quer o Bloco de esquerda usam o argumento exactamente inverso”, compara.