Depois do TC chumbar as barrigas de aluguer, Presidente veta a lei
Tribunal Constitucional declarou – outra vez – inconstitucional a norma sobre o prazo para a grávida desistir de entregar a criança e Marcelo Rebelo de Sousa, que pedira a fiscalização da lei, vetou-a.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, vetou nesta quinta-feira a alteração à lei relativa à procriação medicamente assistida que incidia sobre os processos de gestação de substituição, em consequência de o Tribunal Constitucional (TC) ter declarado inconstitucionais duas normas do diploma.
“Na sequência do acórdão do Tribunal Constitucional, que [na quarta-feira] considerou inconstitucionais normas do diploma, submetido a fiscalização preventiva da constitucionalidade, o Presidente da República devolveu à Assembleia da República, sem promulgação, nos termos do artigo 279.º, 1. da Constituição, o Decreto que alterou o regime da procriação medicamente assistida (sétima alteração à Lei n.º 32/2006, de 26 de Julho)”, lê-se numa nota do site da Presidência.
O Presidente da República requereu a 26 de Agosto ao TC a fiscalização preventiva do diploma sobre procriação medicamente assistida, tendo sido esta a primeira vez que o chefe de Estado enviou um diploma para aquele órgão desde que tomou posse em 2016.Daí que este seja também o primeiro veto Presidente da República por inconstitucionalidades, na sequência de uma decisão do Tribunal Constitucional. Desde o início do mandato, o chefe de Estado já vetou politicamente outros 16 diplomas.
Nos termos da Constituição da República Portuguesa, “se o Tribunal Constitucional se pronunciar pela inconstitucionalidade de norma constante de qualquer decreto ou acordo internacional, deverá o diploma ser vetado pelo Presidente da República ou pelo Representante da República, conforme os casos, e devolvido ao órgão que o tiver aprovado”, neste caso, o Parlamento.
Numa nota publicada na página da Presidência da República quando anunciou o pedido de fiscalização, é referido que “tendo em conta o que antecede, o Presidente da República requereu a fiscalização preventiva, assim permitindo ao tribunal verificar a conformidade das normas agora aprovadas com a Constituição, à luz da sua própria jurisprudência”.
Marcelo Rebelo de Sousa justificou o envio do diploma para o TC com a convicção de que a Assembleia da República votou contrariamente a uma anterior decisão deste tribunal.
“Tratava-se de uma lei aprovada um ano depois de uma decisão do TC que tinha declarado contra a Constituição várias normas de uma lei anterior, em rigor, aliás, de várias leis anteriores, e num ponto a Assembleia votou uma solução que, na minha perspectiva, entrava em choque com aquilo que o tribunal tinha dito em 2018”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa aos jornalistas à margem de uma visita a uma comunidade religiosa, em Lisboa.
Em 19 de Julho, a Assembleia da República aprovou em votação final global a alteração ao regime jurídico da gestação de substituição, mas que não incluiu a revogabilidade do consentimento da gestante até ao nascimento da criança imposta pelo TC.
Os fundamentos do acórdão foram lidos na quarta-feira à comunicação social no Palácio Ratton, sede do TC, em Lisboa. “Ao abrigo do artigo 278.º da Constituição da República Portuguesa, o TC pronuncia-se pela inconstitucionalidade das referidas normas por violação do direito ao desenvolvimento da personalidade da gestante, interpretado de acordo com o princípio da dignidade da pessoa humana, e do direito de constituir família, em consequência de uma restrição excessiva dos mesmos”, leu a juíza relatora do TC, Joana Costa.
Na decisão, votou vencido o conselheiro Cláudio Monteiro, apresentaram declaração de voto as conselheiras Mariana Canotilho e Fátima Mata Mouros, e apresentaram uma declaração de voto conjunta os conselheiros Gonçalo de Almeida Ribeiro, Fernando Vaz Ventura, Joana Fernandes Costa e Luís Rodrigues Ribeiro.