Renzi funda novo partido para recuperar o espaço político ao centro
Ex-primeiro-ministro italiano abandonou o PD e formou o Itália Viva, que já tem mais de 40 parlamentares, entre deputados e senadores. Decisão promete abanar o novo e ainda frágil governo de coligação PD-M5S, apesar de Renzi ter garantido o seu apoio.
Ao fim de vários meses de ameaças e avisos, Matteo Renzi oficializou esta terça-feira o abandono do partido pelo qual serviu como primeiro-ministro, entre 2014 e 2016, e deu o tiro de partida numa campanha de reconquista do centro político em Itália. A desfiliação do Partido Democrático (PD), de centro-esquerda, já era esperada, e com ela veio a confirmação da funcação de uma nova força política, o Itália Viva, que pode baralhar as contas ao recente, e ainda muito frágil, Governo de coligação entre o PD e a plataforma populista Movimento 5 Estrelas (M5S).
“Decidi abandonar o PD e construir, com outros, uma nova casa, onde se faça política de maneira diferente”, escreveu no Facebook o antigo chefe de Governo, há meses em choque com a ala mais à esquerda do partido, liderada pelo secretário-geral, Nicolas Zingaretti. “Depois de sete anos de fogo amigo, acredito que os nossos valores, ideias e sonhos não podem continuar a ser diariamente objecto de disputas internas”.
A dissidência, garante Renzi, não põe em causa a sobrevivência ou a estabilidade do executivo liderado por Giuseppe Conte. Antes de anunciar a decisão, o senador de Florença telefonou ao primeiro-ministro para lhe garantir que o seu apoio à actual solução governativa é incondicional, tendo voltado a fazê-lo numa publicação, esta terça-feira, no Facebook, e através de uma entrevista concedida ao diário italiano La Repubblica.
A decisão “é boa para toda a gente” e o Governo até pode beneficiar de uma “provável expansão do seu apoio parlamentar”, afiançou Renzi. Mas a mais do que previsível cisão na bancada do PD na Câmara dos Deputados e no Senado italiano – Renzi disse esta terça-feira que já tem 40 parlamentares; o PD tinha 111 deputados e os 52 senadores – só acrescenta imprevisibilidade à capacidade política e mobilizadora do Governo, particularmente dentro do Parlamento.
“É um erro”, escreveu Zingaretti no Twitter. “Particularmente numa altura em que a força do PD é indispensável para a qualidade da nossa democracia”.
Num sistema político constantemente em ebulição, visto dentro e fora de portas como um palco privilegiado para a instabilidade e a polarização, há muito que Renzi procura chamar para si a figura do político ajuizado e do estadista exemplar.
Foi essa a pele que quis vestir quando, em 2016, alocou o seu destino político à aprovação de uma reforma constitucional, votada e chumbada em referendo e, mais recentemente, quando saiu das sombras do senado italiano para agilizar uma coligação de governo entre o PD e o M5S e impedir a cavalgada do ex-vice-ministro e líder da Liga (extrema-direita), Matteo Salvini, para novas eleições – “um dos feitos que exibirei com mais orgulho no CV”, assegurou Renzi.
E é também sob o lema da moderação que o ex-primeiro-ministro pretende agora fundar um novo partido, com ideias “jovens, inovadoras e feminista” para Itália e para a Europa, por acreditar que é a pessoa certa para recuperar o espaço deixado vago ao centro e, através dele, continuar a combater o populismo.
“Não iria conseguiria responder às agressões de Salvini e à difícil coabitação com o M5S [a partir do PD]”, admitiu Renzi ao La Repubblica. “Quero passar os próximos meses a lutar contra Salvini. O mau populismo que ele representa ainda não foi derrotado”.
40 parlamentares
O novo partido que Renzi disse já ter 25 deputados e 15 senadores, não faz planos para disputar quaisquer eleições regionais ou locais nos próximos tempos, assegurou.
O plano do antigo primeiro-ministro é revelar o símbolo e as traves-mestras programáticas da nova plataforma política em Outubro, depois de reunir com outros dissidentes do PD.
A verdade é que é necessário fazer contas, até pelas especificidades dos regulamentos do Parlamento italiano.
Se para a formação de um grupo parlamentar autónomo na Câmara, bastam vinte deputados, para o Senado o caso é diferente. A lei não permite a criação de facções e os senadores devem manter-se associados ao partido que os elegeu ou passar para o grupo misto, que tem pouca margem de independência.
Segundo o Corriere della Sera, Renzi precisa de tempo para preparar a estratégia, que pode passar por uma “interpretação flexível” dos regulamentos.