Afinal, para onde vão os plásticos desaparecidos no oceano?

Há uma diferença entre a quantidade de plásticos que vai parar ao oceano e a que fica lá a flutuar. Para explicar este mistério, uma equipa de cientistas traçou a viagem oceânica dos plásticos.

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Pensa-se que muitos plásticos libertados no oceano voltem à costa pouco tempo depois Matthew Chauvin

Há um mistério por resolver: todos os anos milhões de toneladas de plásticos chegam ao oceano, mas apenas ficam lá a flutuar centenas de milhares de toneladas. Para explicar esta diferença, cientistas sugeriam que os plásticos desaparecidos se degradavam e viajavam para o fundo do oceano. Agora, uma equipa de investigadores da Holanda e da Nova Zelândia reaviva este caso e apresenta uma nova hipótese para o mistério dos plásticos desaparecidos. Segundo a sua investigação, a maioria do plástico que entra no oceano volta às zonas costeiras e apenas uma pequena parte chega às águas ao largo do oceano.

“Desde que a produção em massa de polímeros sintéticos começou nos anos 50, o lixo plástico foi-se acumulando e degradando nos ambientes terrestres e oceânicos”, introduzem os cientistas num artigo científico publicado esta quinta-feira na revista Scientific Reports. Se se considerasse toda a produção e emissão de plástico desde os anos 50, deveriam estar na superfície do oceano dezenas de milhões de toneladas de macroplásticos (plásticos com dimensões superiores a cinco milímetros). Contudo, haverá apenas 250 mil toneladas de macroplásticos flutuantes no oceano, de acordo com o artigo. O que acontece então ao plástico desaparecido?

Este mistério já tinha sido investigado e havia três possíveis explicações. Primeiro, o número dos plásticos que entram nos oceanos pode estar a ser sobreestimado. Depois, a quantidade dos plásticos que actualmente estão a flutuar no oceano pode também estar a ser subestimada. Estudos recentes sugerem que o valor dos plásticos a boiar no oceano pode ser de poucos milhões de toneladas. Por fim, a explicação mais usada é a de que o plástico flutuante não fica muito tempo na superfície, se degrada em microplásticos e acaba por ir para o fundo do oceano.

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Estima-se que haverá cerca de 250 mil toneladas de macroplásticos flutuantes no oceano Fundação The Ocean Cleanup

Agora, uma equipa de cientistas liderada por Laurent Lebreton, investigador da Fundação The Ocean Cleanup (Holanda), voltou a explorar este mistério. Para isso, identificou a data de produção de plástico flutuante da Grande Mancha de Lixo do Pacífico, localizada no giro (grande sistema de correntes oceânicas) do Pacífico Norte. Percebeu-se então que muitos objectos flutuantes tinham a data de produção dos anos 70, 80 e 90, o que quer dizer que o plástico demora mais tempo a degradar-se no oceano do que se pensava.

“O plástico flutuante acumulado nas grandes manchas de lixo no oceano é muito duradouro. E a maioria da contaminação por microplásticos nessas águas é o resultado da degradação de objectos que já têm muitas décadas”, refere ao PÚBLICO Laurent Lebreton, que também participou no estudo publicado em 2018 que estimou que o plástico a flutuar na Grande Mancha de Lixo do Pacífico era de 1,6 milhões de quilómetros quadrados, o que equivale a mais de 17 vezes o tamanho de Portugal continental, dos Açores e Madeira.

O verdadeiro culpado

Mas, se são tão duradouros, onde ficam esses plásticos no oceano? Para traçarem o rasto desses objectos ao longo do tempo, a equipa combinou a datação dos plásticos a modelos matemáticos que simularam a probabilidade desses detritos flutuantes terem voltado à costa depois de terem sido introduzidos no oceano, assim como a probabilidade desses objectos terem sido transportados para as águas ao largo da costa (a mais de 200 milhas náuticas).

“Os nossos modelos mostram que a maioria do ambiente costeiro tem menos de cinco anos, enquanto o plástico nas águas ao largo da costa é mais antigo”, conta Laurent Lebreton. Esta diferença entre a idade dos plásticos permitiu que a equipa desenvolvesse uma nova explicação para o caso dos plásticos desaparecidos.

A sentença foi a seguinte: quando os plásticos são introduzidos no oceano, são transportados pelas correntes ou pelo vento. Pouco depois de terem sido libertados no oceano, uma grande quantidade desses objectos volta à costa. Desses detritos, uns acabam encalhados e são recolhidos pelas actividades humanas, outros acabam mesmo por ficar na costa e há alguns que regressam ao oceano. Estes últimos plásticos repetem este ciclo com uma frequência desconhecida e são transportados para as águas ao largo da costa, onde acabam nos giros oceânicos – há dois giros no oceano Pacífico, dois no Atlântico e um no Índico.

Para Laurent Lebreton, este estudo pode ajudar decisores políticos e a indústria a criar estratégias de mitigação do plástico e motivar novos estudos científicos.

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Sistema 001, um sistema em forma de serpente que pretende retirar plástico do oceano Fundação The Ocean Cleanup

A equipa faz ainda questão de destacar que o verdadeiro culpado pelo mistério dos plásticos desaparecidos são os humanos. Como tal, criou cenários das emissões futuras e deixa alguns alertas. Se as emissões de plástico continuarem com o ritmo actual, os plásticos flutuantes poderão quadruplicar até 2050. E, mesmo que se conseguisse parar de lançar plásticos no oceano até 2020, os microplásticos poderiam ainda duplicar devido à degradação do plástico flutuante mais antigo já no oceano.

“Deveremos trabalhar em políticas para acabar com as emissões de plástico o mais depressa possível, bem como removê-lo do oceano”, avisa Laurent Lebreton. O investigador fez parte da equipa da Fundação The Ocean Cleanup que lançou em Setembro de 2018 um sistema em forma de serpente – o Sistema 001 – para recolher plástico da Grande Mancha de Lixo do Pacífico. Contudo, não se conseguiu praticamente recolher plástico nesta expedição finalizada em Janeiro e o sistema acabou até por se partir. Ao longo da expedição, houve várias críticas ao Sistema 001, porque poderia estar a recolher organismos agarrados ao plástico e não se preocupava em terminar com as emissões de plástico no oceano. Mesmo assim, a Fundação The Ocean Cleanup está a desenvolver um novo modelo do sistema para tentar diminuir o plástico flutuante.

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