Câmara dos Comuns aprova proposta para travar “Brexit” sem acordo e Corbyn rejeita eleições antecipadas
O primeiro-ministro britânico propôs marcar eleições antecipadas para 15 de Outubro depois de ter sido derrotado numa proposta que trava o “Brexit” sem acordo. Em resposta, o líder da oposição, Jeremy Corbyn, disse que só admite falar sobre isso quando a proposta de lei entrar em vigor.
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, desafiou a oposição a aprovar a marcação de eleições antecipadas para o dia 15 de Outubro, depois de a Câmara dos Comuns ter aprovado uma proposta de lei que tem como objectivo impedir um “Brexit” sem acordo no dia 31 de Outubro. Para que isso acontecesse, era preciso que dois terços dos deputados votassem a favor, mas o líder da oposição, Jeremy Corbyn, afastou a hipótese de eleições antecipadas até que a proposta de lei aprovada esta quarta-feira entre em vigor.
Para ser lei, a proposta para travar um “Brexit” sem acordo tem ainda de ser aprovada na Câmara dos Lordes – o que pode acontecer até segunda-feira, ainda que a minoria pró-"Brexit” na câmara alta do Parlamento possa atrasar o processo.
Como na Câmara dos Lordes não há prazo para encerrar debates, os membros do Partido Trabalhista apresentaram uma moção para que esta proposta de lei em particular seja aprovada até às 17h de sexta-feira; mas os membros do Partido Conservador já apresentaram dezenas de propostas de alteração a essa moção, que não têm hipóteses de ser aprovadas mas que podem arrastar o processo até ao fim-de-semana. O objectivo dos apoiantes de Boris Johnson é travar uma votação final até ao início da próxima semana, quando entrar em vigor a suspensão de um mês decidida pelo primeiro-ministro na semana passada.
Depois da aprovação na Câmara dos Comuns, o último passo é a promulgação pela rainha, o que poderá acontecer na segunda-feira. Depois disso, segundo Jeremy Corbyn, o Partido Trabalhista estará disposto a marcar eleições antecipadas para o dia 15 de Outubro.
Revolta contra Johnson
A proposta de lei que trava um “Brexit” sem acordo foi posta a votação contra a vontade do primeiro-ministro e contou com o apoio de pelo menos 21 deputados do seu Partido Conservador.
Se entrar em vigor, a lei obrigará o primeiro-ministro a pedir um novo adiamento do prazo final do “Brexit”, de 31 de Outubro para 31 de Janeiro de 2020. Para não ter de pedir esse novo adiamento, o primeiro-ministro terá de fazer uma de duas coisas até 19 de Outubro: ou convencer o Parlamento a aprovar um novo acordo de saída com a União Europeia, ou a sair sem qualquer acordo. Mas ambas as hipóteses são remotas, dada a composição actual da Câmara dos Comuns.
Boris Johnson diz que a proposta de lei em causa equivale a uma rendição do Reino Unido à vontade da União Europeia e que a sua aprovação apenas vai activar mais um “adiamento sem sentido”. Johnson argumenta que tirar de cima da mesa uma das hipóteses (a saída sem acordo) diminui a capacidade negocial do Reino Unido com a União Europeia. E garantiu também que estão a ser feitos progressos com Bruxelas, apesar de ninguém, a não ser no seu Governo, confirmar essa versão.
O primeiro-ministro já tinha anunciado que iria apresentar ao Parlamento uma moção para a convocação de eleições antecipadas assim que a proposta de lei fosse aprovada na Câmara dos Comuns, o que aconteceu ao fim da tarde desta quarta-feira.
Mas para que as eleições possam ser antecipadas, a moção de Boris Johnson teria de ser aprovada por dois terços da Câmara dos Comuns, e o Partido Conservador perdeu nos últimos dias a sua curta maioria de apenas um deputado.
O líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn, disse na terça-feira que só aceita ir a votos depois de a proposta de lei que está em votação na Câmara dos Comuns entrar em vigor – ou seja, não daria a Boris Johnson uma maioria de dois terços para convocar eleições esta quarta-feira, mas poderá fazê-lo na próxima segunda-feira.
Alguns responsáveis do Partido Trabalhista estão a tentar convencer Corbyn a apenas aceitar eleições antecipadas depois de 31 de Outubro – quando já estiver certo que não é possível um “Brexit” sem acordo. Isto porque não confiam em Boris Johnson para manter a data de 15 de Outubro para as eleições – temem que o primeiro-ministro prometa agora aquela data e que depois a adie.
Procura de nova maioria
O primeiro-ministro britânico quer manter a sua promessa de tirar o Reino Unido da União Europeia no dia 31 de Outubro, com ou sem acordo, mas não tem maioria na Câmara dos Comuns para isso. Na terça-feira, pelo menos 21 deputados do Partido Conservador aprovaram a moção que deu origem à proposta de lei em debate esta quarta-feira, desafiando Boris Johnson.
Também na terça-feira, o deputado conservador Phillip Lee abandonou a bancada da maioria e passou para os Liberais Democratas, que se opõem ao “Brexit”. Para além disso, Boris Johnson puniu os deputados rebeldes tirando-lhes a capacidade de votar em nome do Partido Conservador – o que, na prática, reduz ainda mais a margem de manobra para a sua estratégia.
Por esta altura, o Partido Conservador só pode contar, no máximo, com 299 votos para qualquer iniciativa, incluindo os dez do Partido Unionista Democrático – muito longe de uma maioria de dois terços.
Ao convocar eleições antecipadas, Boris Johnson espera conquistar uma maioria confortável com deputados conservadores alinhados com a sua estratégia de “Brexit” com ou sem acordo. Se isso acontecer, poderá propor a esse novo Parlamento que aprove uma saída sem acordo – nesse caso, a lei que foi aprovada esta quarta-feira prevê que o pedido de adiamento possa ser retirado pelo primeiro-ministro, e o Reino Unido poderia voltar a ficar em risco de um “Brexit” sem acordo.
Suspensão do Parlamento mantém-se
Na semana passada, Boris Johnson decidiu suspender o Parlamento entre 10 de Setembro (a próxima terça-feira) e 14 de Outubro, dizendo que quer antecipar a apresentação ao país das suas propostas de Governo. Os críticos acusam-no de querer tirar mais de um mês de discussões aos deputados para encontrarem uma solução para o “Brexit”, dando-lhe mais tempo para cumprir a promessa de deixar em aberto um “Brexit” sem acordo.
Essa suspensão foi contestada em tribunal, em três processos distintos. Esta quarta-feira, os tribunais escoceses disseram que a suspensão é legal e que pode prosseguir. Aguardam-se ainda as decisões dos tribunais da Irlanda do Norte e de Inglaterra.
Foi o anúncio da suspensão do Parlamento que levou a oposição, e pelo menos 21 deputados conservadores, a apresentarem a proposta para travar um “Brexit” sem acordo que foi aprovada esta quarta-feira na Câmara dos Comuns.