Protestos causam o caos no aeroporto de Hong Kong

Após um sábado de duros confrontos com a polícia nas ruas da megacidade, centenas de manifestantes concentraram-se no aeroporto este domingo para o tentarem bloquear.

Aeroporto Internacional de Hong Kong
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Manifestantes tentam bloquear a auto-estrada de acesso ao aeroporto,Manifestantes tentam bloquear a auto-estrada de acesso ao aeroporto Kai Pfaffenbach/REUTERS
,Protestos contra lei de extradição de Hong Kong em 2019
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Passageiros tiveram de arrastar as bagagens por longas distâncias, porque as estradas de acesso ao aeroporto estavam cortadas JEROME FAVRE/EPA
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Polícia antimotim em perseguição de manifesfante,Polícia antimotim em perseguição de manifesfante Kai Pfaffenbach/REUTERS,Kai Pfaffenbach/REUTERS
Aeroporto Internacional de Hong Kong
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Manifestantes correm para montar barricadas Kai Pfaffenbach/REUTERS
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Passageiro tenta abrir caminho entre barricadas improvisadas no interior do aeroporto JEROME FAVRE/EPA

Foi o caos este domingo no aeroporto internacional de Hong Kong. Manifestantes pró-democracia invadiram-no em protesto e erigiram barricadas, enquanto os funcionários do aeroporto montaram barreiras e a polícia antimotim avançou contra eles. Pelo menos 26 voos foram cancelados, diz o South China Morning Post.

Sem conseguirem entrar na zona das partidas e pressionados pela polícia antimotim, os manifestantes erigiram barricadas com o que tinham à mão – barreiras de trânsito e carrinhos de aeroporto – e mantiveram o terreno. Tentaram entrar no aeroporto, mas os funcionários barricaram-no e a tensão subiu, com gritos e empurrões de ambos os lados. 

“Se perturbarmos o aeroporto, mais estrangeiros vão ler notícias sobre Hong Kong”, resumiu uma manifestante de 20 anos sobre os protestos à Reuters. Foi por isso que os manifestantes levaram a contestação ao governo de Carrie Lam e a Pequim até lá há algumas semanas, perturbando e ocupando o aeroporto por vários dias, mesmo depois de um tribunal os ter proibido

Sabendo que a polícia acabaria por investir, os manifestantes bloquearam os acessos, partiram depósitos com material de combate a incêndios para tirarem os extintores e atiraram pedras para o chão, numa tentativa de atrasar a progressão dos veículos da polícia. Não resultou e os agentes, a pé, lá avançaram, obrigando-os a recuar até ao complexo comercial de Tung Chung, a algumas centenas de metros, onde construíram mais barricadas e acabando por atear-lhes fogo.

Contudo, a perturbação na zona das partidas foi suficiente para que 26 voos fossem cancelados e centenas de passageiros tivessem de percorrer mais de um quilómetro a pé até à zona das partidas. 

“Se se quer mudar algo, é preciso lutar por isso, mas também há que se fazer sacrifícios”, disse o norte-americano David ao South China Morning Post.

Refugiados em Tung Chung, os manifestantes viram a polícia ganhar terreno, neutralizando as barricadas em chamas, até lá chegar. Quem protestava já tinha começado a dispersar sem saber como chegar a casa – se a pé, à boleia ou nos muito poucos transportes públicos em funcionamento.

“Não temos qualquer ideia sobre como ir embora. Estamos presos”, disse um manifestante que usava máscara à Reuters. A polícia começou a suspender os transportes públicos para impedir que os manifestantes abandonem a zona, carregando de seguida sobre eles. Aconteceu este sábado e, por pouco, iria acontecendo também este domingo.

Enquanto a polícia não avançou, os manifestantes juntaram-se na estação de comboio de Tung Chung e danificaram-na significativamente: partiram os vidros das bilheteiras, destruíram as máquinas de bilhetes, danificaram as portadas, grafitaram o chão e até descarregaram a raiva numa bomba de água, inundando o chão. As câmaras de vigilância, usadas pelas autoridades para identificar os manifestantes, também foram destruídas, algo já normal nos mais de três meses de protestos, considerados a pior crise política das últimas décadas na região.

“Os manifestantes violentos bloquearam ruas em vários pontos de Tung Chung, queimaram barricadas e a bandeira nacional [chinesa] e causaram grande congestão no trânsito”, lê-se num comunicado da polícia de Hong Kong.

A polícia é acusada de usar força desproporcional contra o movimento pró-democracia. “Quero falar pelos direitos humanos e democracia. Não há razão para a polícia magoar os manifestantes. Nem sequer diferencia entre manifestantes e observadores”, denunciou Lau, trabalhador de 29 anos no sector da saúde, ao South China Morning Post. “É por isso que hoje não uso máscara ou capacete para me proteger. Apenas nos queremos reunir aqui e fazer ouvir as nossas opiniões”, continuou.

“Não estou assustado por muitos cidadãos de Hong Kong já terem sido apanhados. Sei que não estou sozinho”, confessou  ao Guardian Lui Cheung, jovem de 17 anos, enquanto recuava de Tung Chung.

Os protestos deste domingo aconteceram depois de no sábado a polícia e os manifestantes se terem envolvido nos mais duros confrontos de rua até ao momento na megacidade, depois de uma marcha pacífica ter terminado. Os manifestantes cercaram o quartel-general da polícia e o edifício do governo, atirando-lhes bombas incendiárias, e a polícia avançou sobre eles, destruindo as barricadas erigidas à medida que progredia no terreno. Balas de borracha, canhões de água, gás lacrimogéneo e cassetetes foram as armas usadas pelas autoridades, com os manifestantes a ripostarem com barricadas a arder, bombas incendiárias e o arremessar de objectos vários.

Houve até casos em que alguns polícias sacaram das suas armas de serviço e dispararam tiros de aviso contra os manifestantes, algo que se tem tornado cada vez mais recorrente de semana para semana de protestos nas ruas de Hong Kong.

As autoridades activaram ainda a unidade de elite da polícia anti-motim, os Raptors, criados em 2014, e estes perseguiram os manifestantes onde os encontravam, detendo-os agressivamente. E, pela primeira vez, a polícia usou canhões de água com tinta azul para identificar quem protestava, facilitando a sua detenção.

As autoridades dizem ter detido 63 pessoas. A intensidade dos confrontos é perceptível no número de pessoas hospitalizadas: 41 até às duas horas da manhã de domingo (9h00 em Portugal), entre os quais 11 com gravidade.

A possibilidade de uma intervenção militar chinesa na região administrativa especial é cada vez maior, apesar dos prejuízos que essa decisão teria para Pequim. O regime chinês tem milhares de soldados concentrados em Shenzhen, na fronteira com Hong Kong, e têm realizado com frequência exercícios antimotim, alegadamente em preparação da comemoração dos 70 anos do Partido Comunista Chinês, a 1 de Outubro.

A acontecer uma intervenção militar chinesa, a Lei Básica de Hong Kong estipula que esta deve ser pedida pela chefe de governo da região, Carrie Lam. Porém, a imprensa tem avançado que Lam não quer uma intervenção e tem apostado na capacidade da polícia de Hong Kong em lidar com a situação, optando pela via da repressão, uma vez que Pequim a proibiu, diz o Guardian, de ceder a qualquer exigência dos manifestantes. O diálogo político tem pouca margem para florescer. 

Os protestos começaram há mais de três meses contra uma lei de extradição, entretanto suspensa mas não enterrada, e depressa se generalizaram na oposição ao Governo de Lam e influência de Pequim na região, que acusa de a tentar controlar. Hong Kong passou para soberania chinesa sob o princípio “um país, dois sistemas” em 1997.

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