De bicicleta também se reivindica a abertura ao tráfego da A26

O lanço da A26 entre o nó de Grândola e Ferreira do Alentejo está concluído há mais de dois anos e continua encerrado ao trânsito. Custou 35 milhões de euros.

Foto
Manifestantes não puderam percorrer o troço da A 26 encerrado ao trânsito DR

A manhã estava apenas no começo, mas o dia “quentinho” já se fazia anunciar quando Carlos Azedo, professor na Escola Secundária de Serpa, iniciou, às 7h30, a estirada velocipédica de 70 quilómetros até ao lugar de Malhada Velha, lugar no concelho de Ferreira do Alentejo. Objectivo: iniciar uma acção de protesto contra o atraso na abertura ao tráfego automóvel no lanço da A26, uma via de 12 quilómetros concluída há mais de dois anos mas que permanece encerrada, por alegados “constrangimentos técnicos” relacionados com a falta de um sistema de portagem. A sua construção custou 35 milhões de euros.

Na passagem por Beja, Carlos Azedo leva na sua roda mais meia dúzia de ciclistas solidários com a luta que diz ir manter “enquanto for vivo”. O pelotão retoma a marcha com o sol a queimar as costas e o asfalto a ferver sob as rodas das bicicletas. Fernando José Catrapona, confessa ao PÚBLICO que está a viver a “ternura dos 70” anos, mas pedala que se farta. Fazer, numa manhã, uma centena de quilómetros “não custa nada”. Diz que a bicicleta "é o melhor comprimido” que encontrou para a diabetes, problema de saúde que lhe fazia a vida negra, antes de optar pela roda pedaleira.

À frente dos ciclistas segue, de mota, José do Nascimento, dirigente do PS de Beja, a fazer o papel de batedor. Admite que o momento é oportuno para reivindicar a abertura do troço da A 26 ao trânsito automóvel, lembrando que se está “em período de pré-campanha eleitoral” e até seria oportuno que a estrada fosse aberta sem portagem.

Nova paragem em Ferreira do Alentejo na expectativa de que mais aderentes pudessem aderir ao protesto. Ma, mesmo sendo o protesto organizado a um sábado, ninguém apareceu. “Está tudo de férias”, comenta-se no pelotão em jeito de prémio de consolação. O gesto de estender a mão para a garrafa de água tornou-se mais frequente, mas o destino já se avista, na extensa paisagem plana que antecede as margens do rio Sado, linha que separa os distritos de Beja e de Setúbal.

GNR montou barreira no local

À medida que a caravana ciclista se aproxima com o propósito de percorrer os 12 quilómetros do lanço da A26, vai-se tornando mais distinta a barreira que a GNR ergueu para impedir a passagem de quem quer que seja.

“Isto agora é polícia e guarda por todo o lado quando a gente protesta contra o que está mal” reage a meio tom de voz, um elemento do pelotão. Pragmático, Carlos Azedo, deixou claro que apesar de não poderem concretizar o objectivo que os tinha trazido até à Malhada Velha, a acção “não foi inglória. O dia está ganho porque provámos que existimos”, vincou o professor. Bebe um golo de água, limpa o suor com um dos braços e expressa o que lhe vai na alma. “O que me desagrada e incomoda é a desonestidade e incompetência dos políticos”, frisando aos presentes que “foram os cidadãos que pagaram a estrada. Haja respeito pelas pessoas!”, acentua.

Lembra, a propósito, já ter perdido “um grande amigo” no troço de estrada que segue paralela à A26. São vários os acidentes mortais que se registaram num traçado “tenebroso” com faixas de rodagem estreitas, sem escapatórias, lombas acentuadas e curvas perigosas. É por onde circula o trânsito de e para Beja, e ele conhece bem o trajecto, que faz com frequência. “E de cada vez que passo, vem-me à memória os que perderam a vida, por não terem uma estrada em condições, enquanto ali ao lado, a pouco mais de uma centena de metros, está o lanço da A 26, concluído há mais de dois anos mas que continua encerrado” observa.

O capitão Jorge Massano que comandava os sete militares do Destacamento Territorial de Aljustrel, ouviu calmamente os desabafos dos manifestantes mas lembrou-lhes que não podiam circular no troço da A26 por estar interdito. E pediu-lhes que “compreendessem” a posição da GNR. 

O ex ministro do Planeamento e das Infra-estruturas Pedro Marques tinha concedido à Sociedade Portuguesa para a Construção e Exploração Rodoviária, S.A. (SPER) a quem foi atribuída a subconcessão da rede viária do Baixo Alentejo um prazo, até 14 de Março de 2019, para a subconcessionária iniciar a obra da portagem. Se o incumprimento se mantivesse o Estado exerceria, então, a sua acção tutelar e tomar posse da obra, mas o contencioso subsiste: a A26 continua sem portagem.

Durante o debate da petição com 26 mil assinaturas apresentada pelo Movimento Merece +, discutida na Assembleia da República em Julho de 2019, o deputado do PCP João Dias, eleito por Beja, disse que no projecto inicial da A 26 “as portagens não estavam previstas” frisando que o troço deve funcionar como um equipamento “com duas faixas de rodagem em cada sentido e sem portagem.”

Carlos Azedo não vai desistir do seu protesto. “Enquanto for vivo virei aqui todos os meses”. A próxima jornada de luta está marcada para o dia 28 de Setembro e espera que dessa vez tenha mais acompanhantes. No dia em que o troço abrir ao trânsito automóvel, o professor que encontrou no “ciclo-activismo” um modo de intervenção cívica promete abrir uma garrafa de champanhe que tem reservada para essa ocasião.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários