Primárias argentinas são uma grande sondagem para as eleições de Outubro
Desde 2011 que os argentinos escolhem os candidatos de cada partido. Como todas as formações políticas têm candidatura única, este domingo aferir-se-ão popularidades. O Presidente não está na melhor posição. Cristina Kirchner está de volta.
Votar é obrigatório na Argentina. Mesmo para as eleições primárias disputadas este domingo estão convocados os 33.841.837 eleitores do país. Dos 18 aos 70 anos, quem não exercer o seu direito de voto ou justifica ou é multado. Os mais velhos podem optar, tal como os jovens de 16 e 17 anos. É assim desde 2011, ano do primeiro sufrágio disputado depois da reforma política de 2009, com as Primárias Simultâneas Abertas e Obrigatórias. Desta vez, os argentinos votam nos candidatos presidenciais, parlamentares (renovam-se 130 assentos na Câmara de Deputados e 24 no Senado) e a governadores das províncias de Buenos Aires, Catamarca e La Rioja e ao executivo da cidade de Buenos Aires.
Os nove partidos e formações políticas que pretendem disputar a Presidência a 27 de Outubro optaram por fórmulas únicas de candidatos, não dando aos eleitores a possibilidade de escolher entre dois ou mais postulantes. Daí que apenas duas coisas estarão em jogo em termos da corrida à Casa Rosada: a aferência de popularidade nesta grande sondagem nas urnas e que candidaturas não terão popularidade suficiente para superar a barreira de 1,5% dos votos para ir a jogo em Outubro.
O mais provável, a julgar pelas sondagens, é que das dez candidaturas restem apenas cinco para 27 de Outubro e só duas com verdadeira capacidade de disputar a vitória. De um lado Mauricio Macri, o actual Presidente que se recandidata pela Juntos pela Mudança (com o senador Miguel Ángel Piccheto para vice-presidente), do outro Alberto Fernández, candidato peronista, que leva como companheira de lista a ex-presidente Cristina Fernández de Kirchner.
Fernández, antigo chefe de gabinete (espécie de primeiro-ministro) de Néstor Kirchner e depois de Cristina Kirchner, tem liderado sistematicamente as intenções de voto, embora Macri venha paulatinamente encurtando distâncias, deixando antever uma mais que provável segunda volta a disputar a 24 de Novembro. E uma que a julgar pelos inquéritos de opinião pode garantir a reeleição do candidato da direita (que antes de ser chefe de Estado liderou o governo da cidade de Buenos Aires e foi presidente do Boca Juniors, um dos mais populares clubes de futebol da América Latina).
A lei eleitoral argentina proíbe as sondagens na última semana da campanha. As últimas 12 foram publicadas todas no dia 2 de Agosto e 11 delas atribuíam a vitória a Fernández, com uma diferença de entre 1% e 7,4%. Só uma delas dava o favoritismo a Macri, com uma distância de três pontos percentuais.
De acordo com o diário Clarín, a média das sondagens dá uma diferença de 2,75% favorável ao candidato peronista da Frente de Todos, com 39,48%, contra 36,73% de Macri. Um cenário cada vez mais consistente com uma segunda volta entre o actual Presidente e a sua antecessora. Ainda que esta agora seja apenas número dois, a percepção é de um novo confronto Macri/Kirchner.
Voto polarizado
Desde 1999, quando Fernando de la Rúa (48,37%) venceu Eduardo Duhalde (38,28%), que não se via uma eleição em que dois candidatos acumulassem entre si tantas intenções de voto, polarizando o sufrágio. Estas primárias poderão até convencer o eleitorado de que tudo se resume a dois candidatos e isso reflectir-se nos resultados de 27 de Outubro, com os votos tão concentrados que Macri ou Fernández poderão conseguir vencer sem precisar de segunda volta, bastando-lhe conquistar 45% mais um voto.
Roberto Lavagna, antigo ministro da Economia, surge em terceiro lugar nas sondagens, mas sem qualquer possibilidade de se imiscuir na luta dos dois. As sondagens dão-lhe um máximo de 10,8% e um mínimo de 3,9%, com uma média de 7,7%. Pouco para fazer diferença numa primeira volta, mas importante na segunda, porque para onde forem os eleitores do ex-ministro de Nestor Kirchner poderá transformar-se num campo vitorioso. E não podemos supor que por esta relação, Lavagna apoiará Fernández numa disputa a dois com Macri. O peronismo é um movimento suficientemente heterogéneo para dele sair um neoliberal como Carlos Menem (Presidente nos anos 1990) e populistas de esquerda como os Kirchner.
No entanto, aquilo que Alberto Fernández conseguiu, mesmo sendo por oposição a Macri, foi juntar um conjunto díspar de apoios entre os movimentos progressistas e os fortes sindicatos que permitem antever uma capacidade congregadora que poderá continuar a somar apoios até Outubro. Como escreve Martín Granovsky no diário Página/12, Fernández juntou um “saco de gatos”, como lhe teria chamado Néstor Kirchner (falecido em 2010), “mas sem saco de gatos não governas, és uma seita”.