Marcelo avisa motoristas sobre a greve: “Não basta que os fins sejam legítimos”

Referindo-se ao assunto “em abstracto”, o chefe de Estado assinalou que “todas as greves impõem sacrifícios, maiores ou menores”, e sublinhou que “o problema está na ponderação”.

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Marcelo defende que direito à greve “deve utilizar os meios mais adequados para que os fins tenham sucesso" Miguel Manso

O Presidente da República avisou nesta terça-feira que “não basta que os fins” que levam a uma greve “sejam legítimos” e defendeu ser necessário que “os meios não venham prejudicar os fins”, ao comentar a greve dos motoristas.

“Há que ter em atenção que não basta que os fins sejam legítimos, que as aspirações sejam legítimas ou justas, é preciso depois que os meios não venham prejudicar os fins, isso obriga a uma ponderação permanente entre aquilo que se quer realizar e satisfazer e os sacrifícios impostos a outros membros da comunidade”, disse Marcelo Rebelo de Sousa.

Referindo-se ao assunto “em abstracto”, o chefe de Estado assinalou que “todas as greves impõem sacrifícios, maiores ou menores”, e sublinhou que “o problema está na ponderação”.

“E é isso que eu penso que uma análise muito lúcida impõe que seja feito sempre”, vincou.

Falando aos jornalistas antes de dar uma aula na Faculdade de Direito de Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa lembrou a recente viagem que fez de camião, entre o Porto e Lisboa, ocasião em que teve oportunidade de tomar conhecimento de algumas queixas da classe.

Marcelo Rebelo de Sousa sustentou que “o direito à greve é um direito que a Constituição prevê e a lei prevê”, mas alertou que “esse direito é um direito que, para ser eficaz, deve utilizar os meios mais adequados para que os fins tenham sucesso”.

O Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) e o Sindicato Independente de Motoristas de Mercadorias (SIMM) convocaram uma greve para o dia 12, por tempo indeterminado, e acusaram a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (Antram) de não querer cumprir o acordo assinado em Maio, que pôs fim a uma greve que deixou os postos de abastecimento sem combustíveis.

Na óptica do Presidente da República, “aquilo que quem promove lutas laborais deve sempre procurar é o melhor meio para conseguir chegar ao objectivo, e o melhor meio, em muitos casos, até se encontrar esgotado, é o meio do diálogo, o meio da conversa, o meio da mediação ou da manutenção de um processo de tentativa de convergência de pontos de vista”.

“Qual é a melhor maneira para realizar certos objectivos? [...] deve ser continuar a negociação, promover a negociação, nomeadamente se há outras entidades sindicais que estão a negociar e a obter algumas vantagens, ou deve ser ir para a greve?”, questionou o chefe de Estado.

Segundo o Presidente, outra das questões que deve ser ponderada e que “importa muito” é “como é que os portugueses vêem a greve”.

“Porque uma coisa é uma greve que é vista como dirigida contra os patrões, ou contra os patrões e o Estado, outra coisa é uma greve vista como sendo contra os patrões, o Estado e muitos portugueses”, sublinhou, assinalando que “se isso acontece, se de repente há na sociedade portuguesa um sentimento, uma reacção”, se a sociedade se “sentir refém da luta, deixa de se identificar com a luta”.

“E, ao não identificar-se com a luta, aqueles que prosseguem fins em muitos aspectos legítimos e justos, passam a ter contra si, não o patronato e na opinião deles o Estado, mas eu diria a generalidade dos portugueses ou um número muito elevado de portugueses”, avisou, acrescentando que, “a partir desse momento, inverte-se a lógica, os meios começam a comprometer os fins”.

Se isso acontecer, continuou Marcelo Rebelo de Sousa, “aquilo que é um conjunto de ideias que mereciam ser acolhidas, passa a não ter acolhimento por uma reacção de muitos portugueses, de um número enorme de portugueses, contra os meios escolhidos, porque acham que o sacrífico é excessivo”.

Esta é uma análise feita “em geral”, mas que “tem presente” a “simpatia” com as “preocupações do sector”, justificou o Presidente da República, notando estar a ser “frio e isento” e que “neste, como noutros casos, é sempre uma pena quando, havendo boas razões a defender, essas razões são perdidas ou comprometidas ou sacrificadas por causa do excesso de meios utilizado”.