“A vida pública e política piorou muito”, diz Manuel Salgado na sua carta de demissão
Há um “clima de sectarismo” que prejudica “a qualidade da democracia”, afirma o vereador na carta que enviou a Medina, renunciando ao mandato.
Na carta que escreveu ao presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, renunciando ao mandato de vereador, Manuel Salgado defende que “a vida pública e política piorou muito ao longo destes 12 anos” em que exerceu o seu mandato no executivo municipal.
No texto, a que o PÚBLICO teve acesso, Salgado sustenta que “o clima de sectarismo, a possibilidade de manipulação dos media”, bem como “a difusão da mentira, da violência, e até do ódio, através das redes sociais” são situações que “dificultam o diálogo sereno, o confronto de argumentos e a discussão aprofundada dos fundamentos e propostas”.
O vereador afirma que “em última instância, quem perde é a qualidade da democracia, ao contrário daquilo que pensava – e todos podíamos desejar – aquando do advento desta nova forma de comunicação”.
Fazendo um breve balanço do período em que foi vereador, Salgado diz que “foram 12 anos muito gratificantes, mas também desgastantes”. Pormenorizando, as razões do desgaste que diz ter sofrido, o vereador aponta as “invejas e inimizades que se criam no exercício destas funções”, mas também fala em “suspeitas, insinuações e anátemas que nos pretendem colar”.
Já do lado positivo sublinha estar grato “pelas alegrias que foi possível proporcionar a moradores de algumas das áreas mais excluídas da cidade”. Refere também o “legado” que deixou “no planeamento urbanístico, na reabilitação urbana, e numa nova forma de viver a cidade, expressa na valorização e qualificação do espaço público”.
Dirigindo-se a Medina, na carta datada de 15 de Julho, o vereador diz ter sido “uma honra e um grande prazer trabalhar sob” o seu “comando, tal como já fora trabalhar com o António Costa”. E afirmando ter sido “uma honra poder servir Lisboa e os lisboetas”, com “sentido público e fiel” as suas ideias, garante que continuará “a fazê-lo, já não no contexto de vereador da Câmara Municipal de Lisboa”, garantindo: “Lisboa será sempre uma causa na minha vida”.
Não fala da SRU
Mas, na carta a Medina, Salgado não menciona o desejo de se manter como presidente da Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU), que manifestou em declarações ao Expresso: “Estou disponível para continuar, se tiver a confiança da Câmara”, disse.
Salgado entrou como vereador na Câmara de Lisboa, nas autárquicas intercalares de 2007, como candidato na lista do PS liderada por António Costa, que foi então eleito presidente da Câmara de Lisboa.
Lembrando que quando das últimas autárquicas de Dezembro de 2017 tinha colocado a questão da sua saída a meio do mandato, Salgado explica que a razão da renúncia advém da interpretação que faz da lei de limitação de mandatos.
Ou seja, esta “só impõe limitação de mandatos ao presidente” da câmara, justifica que, “por princípio”, considera “importante renovar os decisores e os procedimentos, abrindo novas perspectivas e permitindo novos olhares sobre os projectos da cidade”.
O agora vereador demissionário recorda, na carta, a anterior colaboração “com Jorge Sampaio, nas funções de presidente da CML”, e depois a sua participação no “Comissariado para a Revitalização da Baixa-Chiado, sob a coordenação de Maria José Nogueira Pinto”.
Salienta também que “enquanto professor convidado do Instituto Superior Técnico, ao longo de vários anos, em conjunto com alunos” e “assistentes”, fez “variadíssimas propostas”, algumas das quais teve “a oportunidade e felicidade de vir a concretizar enquanto vereado”.
Expressando “um grande agradecimento” aos que com ele “colaboraram” - destacando “muito em especial os funcionários da Câmara, e todos os técnicos e munícipes”, Salgado sublinha que aprendeu muito com técnicos, com vereadores “do executivo ou da oposição” e com os moradores. Reconhecendo mesmo que corrigiu projectos perante críticas que recebeu de moradores, “mudando muitas vezes de opinião e percebendo que nem sempre as prioridades das pessoas são aquelas que imaginávamos”.