Roy Batty queria viver. Nada mais. Como replicant, a sua esperança de vida de quatro anos cedo se revelou demasiado curta.
Sequioso por mais tempo neste universo e em tantos outros, Roy Batty nunca foi apenas uma máquina, um cyborg, um replicant. Não, Roy Batty foi muito mais, um homem entre homens à procura, como todos nós, de dizer não à morte na demanda pela vida. E para fugir à morte, Roy matou e roubou e fugiu em direcção à Terra e aos seus criadores, na esperança vã da sobrevivência.
Perseguido por Rick Deckard, polícia blade runner especializado em eliminar replicants, Roy acaba por subjugar Deckard depois de um confronto entre os dois no topo de um telhado numa noite de chuva intensa. Está sempre a chover. É sempre de noite.
Magnânimo, Roy poupa a vida a Deckard, içando-o em peso de um fim certo depois da queda deste do telhado. Ao mesmo tempo, Roy pergunta a Deckard se alguma vez este soube o significado de se ser um escravo. Mas já é tarde e Roy sabe disso. O fim dos seus quatro anos está próximo, uma questão de segundos, e então, em jeito de desafio e revelando toda a sua humanidade, Roy profere, entre pausas (atrevo-me a traduzir?): “O que eu vi vocês não podem conceber. Naves de combate em chamas nos Ombros de Orionte. Raios-C a resplandecer o espaço mais escuro no Portal de Tannhäuser. Todos esses instantes perdidos no tempo, como lágrimas à chuva. Chegou a hora de morrer.”
Descrito como um dos mais épicos discursos da história do cinema, senão o mais épico, coube a Rutger Hauer a genialidade de, na noite anterior às filmagens desta cena final, reescrever drasticamente as palavras de David Peoples, argumentista de Blade Runner, realizado por Ridley Scott. Por sua livre iniciativa, e sem pedir a ninguém permissão para entrar na História.
Quanto a Deckard, está ainda hoje em fuga com Rachel, o replicant por quem se apaixonou, os dois sem saberem quanto tempo têm ainda pela frente. Deckard será o primeiro a partir quando, de repente, perceber ser ele próprio um replicant...
E se Roy, Deckard e Rachel procuraram o tempo que agora chegou ao fim, já Rutger Hauer ficou para sempre nestas lágrimas à chuva.