O que está a acontecer entre o Irão e os EUA no Estreito de Ormuz?
Acção e reacção, anúncios e desmentidos: o Estreito de Ormuz está a ser palco de uma série de incidentes pouco claros com petroleiros numa altura em que as sanções dos EUA atingem sobretudo a venda do petróleo iraniano.
Os EUA anunciaram o abate de um avião não tripulado (drone) iraniano no estreito de Ormuz na quinta-feira - o Irão desmentiu que tenha perdido algum aparelho. É o mais recente incidente no estreito, que é o mais importante ponto de passagem marítima do mundo: é a única via dos países do Golfo para o oceano aberto, e o local por onde passa mais de um sexto da produção global de petróleo e mais de um terço do gás natural liquefeito, nota a emissora pan-árabe Al-Jazira. É “a carótida do mundo”, como lhe chama a Foreign Affairs.
O que se está a passar no Estreito de Ormuz?
Uma série de incidentes, desde um abate de um drone iraniano pelos EUA numa “operação defensiva” (Teerão nega), a apreensão de um petroleiro pelo Irão (que Teerão diz ser rotina), três navios iranianos a tentar impedir a passagem de um navio britânico (diz Londres, Teerão nega), uma apreensão de petroleiros iranianos pelo Reino Unido, suspeitos de transportar petróleo em violação das sanções, um abate de um drone norte-americano pelo Irão, e ainda actos de sabotagem noutros petroleiros, que foram logo atribuídos ao Irão, mas que este também nega.
O que tem isto a ver com a tensão Irão-EUA?
Os EUA dizem ter “provas credíveis” de planos para o Irão atacar as suas forças no Golfo, que estão a postos para qualquer tentativa iraniana para encerrar o Estreito de Ormuz.
Os dois países estão num período de especial tensão após a retirada dos EUA do acordo sobre o nuclear iraniano, no ano passado.
Como está o Irão a responder às sanções?
O Irão esperava que o facto de os países europeus, Rússia e China quererem manter o acordo sobre o nuclear fosse suficiente para contrabalançar os efeitos das sanções americanas, mas não é isso que está a acontecer. A pressão dos EUA sobre empresas que tenham negócios com o Irão é tanta que a maioria das multinacionais não quer arriscar perder o acesso ao mercado americano.
O Irão ameaçou que se não conseguisse exportar o seu petróleo, encerraria o Estreito para que mais ninguém na região pudesse fazê-lo. Os EUA têm uma força marítima a postos para assegurar que o Irão não cumpre a ameaça.
Os vários incidentes estão a ser vistos como um lembrete do poder iraniano sobre o estreito e um modo de Teerão aumentar a pressão para um alívio das sanções.
Os incidentes são, então, responsabilidade do Irão?
Podem ser, ou não. Do lado do sim: “O objectivo seria mostrar à comunidade internacional que a sua aquiescência com as sanções secundárias não é livre de custos e mostrar à Administração Trump que em vez de impedir as políticas ‘malignas’ do Irão, as atitudes americanas estavam a incentivá-las”, disse Barbara Slavin, especialista em Irão do centro de estudos Atlantic Council (com sede em Washington), citada pela Al-Jazira.
Do lado do “não”: Max Abrahms, professor de ciência política na Northeastern University em Boston, diz que “a pergunta é porque razão iria o Irão cometer um ataque destes, que apenas prejudica o Irão no palco mundial e ajuda os seus inimigos. E também há razão para cepticismo devido à pouca fiabilidade das informações dos serviços secretos americanos” desde que foi usada informação falsa para justificar a invasão do Iraque. A rápida atribuição de culpas dos EUA ao primeiro acto de sabotagem pareceu dar peso a este argumento.
Qual é o maior risco?
Nenhum dos lados quer uma guerra, que teria enormes consequências para o Irão, os EUA e a região (em Israel por exemplo, que deveria ser alvo do movimento xiita libanês Hezbollah, apoiado pelo Irão). O maior risco é de uma escalada não intencional, com erros de avaliação de um ou ambos dos lados.
Corre-se o risco de as provocações – sejam da autoria de quem forem – levarem a uma resposta maior do que a esperada.
E qual é, entretanto, o estado do programa nuclear do Irão e o acordo do qual os EUA saíram?
Os europeus, russos e chineses tentam ainda salvar o acordo. O Irão está a pressionar dando pequenos passos no seu programa nuclear, com mais enriquecimento de urânio e mais centrifugadoras a funcionar. Isto é importante porque o país diz que o programa serve para fins civis, com um enriquecimento de urânio a um grau baixo.
O acordo foi feito para permitir um enriquecimento para este tipo de uso, mas impedir que o país chegasse a ter urânio mais enriquecido e em quantidade suficiente para usar numa arma atómica. Sem o acordo – que neste momento parece muito difícil de salvar – há muito menos restrições para que o Irão chegue a este estádio. O que Israel já disse que não permitirá (e que atacaria antes de o seu rival chegar ao ponto de ter uma arma atómica pronta a usar).