O duro dilema do segredo bancário

O que ficaria o país a ganhar ou a perder se os responsáveis pelos créditos perdidos fossem expostos na praça pública? Para lá do afago à boa consciência, talvez as perdas sejam maiores do que os ganhos.

É natural que os cidadãos queiram saber o nome dos titulares dos empréstimos que entre 2007 e meados do ano passado obrigaram o Estado, ou, por outras palavras, os contribuintes, a injectar na banca 23.800 milhões de euros. E a normalidade desse desejo justifica-se ainda mais quando sabemos que muitos desses empréstimos foram feitos ao sabor de favores políticos ou de guerras de poder completamente despidas de qualquer racionalidade económica e financeira. Tornar público o nome e o rosto dos autores seria, assim, uma forma de expor comportamentos danosos e de exibir publicamente responsabilidades.

Para lá deste impulso, porém, há uma série de cautelas e de protecções legalmente consagradas que nos obrigam a considerar o impacte da violação do sigilo bancário. Sob o legítimo sentimento de que neste problema arriscamo-nos a fomentar a impunidade e o abuso dos devedores há um limiar de racionalidade que recomenda a resposta a uma singela pergunta: o que ficaria o país a ganhar ou a perder, se os responsáveis pelos créditos perdidos fossem expostos na praça pública? Para lá do afago à boa consciência, talvez as perdas sejam maiores do que os ganhos.

Para começar, já sabemos quase tudo sobre quem foram os bancos, os seus gestores e os destinatários dos créditos delirantes concedidos nesses anos em que uma clique do poder político tentou tomar de assalto o poder financeiro. Depois de vários processos judiciais ou de comissões parlamentares de inquérito, o essencial é público e alcançável pelo escrutínio e julgamento dos cidadãos. Sabemos também que as dívidas tituladas por personalidades dessa clique estão longe de representar a maioria do dinheiro aplicado pelo Estado no salvamento da banca.

Uma grande parte dessa dívida incobrável foi contraída por cidadãos comuns ou por empresas respeitáveis que ousaram investir e foram apanhadas no turbilhão da crise. Cá, como em todos os países da Europa, a banca sofreu não tanto porque os seus clientes são burlões encartados ou oportunistas militantes, mas porque emprestou sem poder prever a possível devastação das falências ou do desemprego.

Revelar o nome dos grandes devedores alimentados pela influência política e proteger os cidadãos que falharam, perdendo por vezes fortuna pessoal, implica a definição de uma fronteira muito volátil. E expor na praça pública quem investiu em contraciclo seria também um forte desincentivo para quem pede dinheiro à banca para comprar casa ou melhorar a sua empresa. Por isso, mesmo que haja muita gente que merecesse ver a sua responsabilidade revelada, a sensibilidade das consequências talvez recomende calma em nome do interesse da economia e do país.

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