Ataque da Al-Shabab em hotel na Somália faz 26 mortos e 56 feridos

Os atentados do grupo islamista sucedem-se, apesar de o grupo já ter perdido o controlo do território que chegou a controlar. A Al-Shabab tem desenvolvido novas capacidades militares e é uma das principais ameaças terroristas em África.

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Um atentado em Mogadiscíu em 2018 FEISAL OMAR/Reuters

É uma das principais ameaças terroristas em África e esta sexta-feira voltou a prová-lo. Minutos depois da explosão de um carro armadilhado, combatentes da Al-Shabab entraram no hotel Medina, na cidade portuária de Kismayo, no Sul da Somália, e mataram 26 pessoas, deixando outras 56 feridas. É o mais recente atentado de uma organização terrorista que quer instaurar um Estado islâmico na Somália e que actua para além das suas fronteiras.

“A operação está terminada. Os quatro atacantes foram mortos”, disse na manhã deste sábado à Reuters o major Mohamed Abdi Told, 14 horas depois do início do atentado. “Entre os mortos estão estrangeiros: três quenianos, um canadiano, um britânico, dois norte-americanos e três tanzanianos. Há dois cidadãos chineses feridos”, disse o presidente do estado de Jubaland, ​Ahmed Madobe, em conferência de imprensa.

Morreram também um político local, candidato à presidência da província de Jubbada, que participava numa reunião de clãs para preparar as eleições de Agosto. Existe a possibilidade desta reunião ter sido o alvo do grupo islamista. 

Os ataques desta milícia são frequentes na Somália, sobretudo em Mogadiscíu, a capital, apesar da presença de tropas da União Africana e de capacetes azuis da ONU. Kismayo, a terceira maior cidade do país, viveu um período de tranquilidade depois da expulsão da Al-Shabab da região.

Sem um governo central eficaz há 20 anos e marcada pela pobreza e fome extremas, a Somália tornou-se terreno fértil para o surgimento de uma das mais mortíferas organizações terroristas no continente africano. Nascida dos escombros da União de Tribunais Islamitas, que chegou a controlar a capital e foi derrotada pela Etiópia na invasão de 2006, a Al-Shabab combateu os invasores usando um discurso nacionalista e islamita, acabando por expulsá-los do país.

Os jihadistas criaram raízes e voltaram a contestar a autoridade do governo interino até uma missão da União Africana, apoiada pelas Nações Unidas, ter entrado no país em 2007. Os seis mil soldados africanos, provenientes do Uganda, Etiópia, Burundi, Quénia e Djibouti, expulsaram a Al-Shabab de Mogadiscíu em 2011.

Pressionados, os jihadistas iniciaram uma estratégia de guerrilha e atentados, extravasando o conflito para lá das fronteiras somalis. Continuaram a controlar grandes parcelas de território somali – chegaram a dominar um terço, cobrando taxas em postos de controlo e por segurança “forçada” – onde os soldados da União Africana não conseguiram manter o controlo por falta de efectivos.

“A organização terrorista somali Al-Shabab conquistou e administrou território bem antes do Daesh o ter feito”, escreveu Joshua Meservey, especialista em África e Médio Oriente, na revista Foreign Affairs.

Em 2017, a missão da União Africana retirou mil soldados do teatro de operações mas, mais tarde, o Conselho de Segurança da ONU adiou uma nova redução de tropas até 2019 devido ao agravar da situação. Entretanto, os atentados tornaram-se cada vez mais comuns e os Estados Unidos deram início a ataques selectivos com drones, para decapitar a liderança – conseguiram-no em 2014 com a morte do líder Ahmed Abdi Godane.

Uma morte que não produziu o efeito esperado de iniciar uma luta interna pelo poder entre a ala nacionalista e a jihadista. A jihadista levou gradualmente a melhor e a liderança foi assumida por Ahmed Umar, também conhecido por Abu Ubaidah, com a organização a manter-se unida e a desenvolver novas capacidades.

Em 2017, “a Al-Shabab rejuvenesceu as suas capacidades militares, garantiu mais território do que tinha desde 2010 e estabeleceu capacidades de media cada vez mais sofisticadas e resilientes”, escreveram Stig Jarle Hansen e Christopher Anzalone, especialistas em África e Médio Oriente, na Foreign Affairs. “Desenvolvimentos que criam dúvidas sobre as afirmações dos serviços secretos somali e queniano de que a Al-Shabab estava à beira do colapso”.

Ao longo dos anos, a organização começou a operar além-fronteiras - em 2010, um atentado coordenado de bombistas suicidas matou 74 pessoas em Kampala, capital do Uganda. Os seus alvos preferenciais, dentro e fora da Somália, são os Estados que participam na missão da União Africana, atacando bases militares, edifícios governamentais e locais frequentados por cooperantes e civis, como hotéis e centros comerciais.

“Estamos a enviar uma mensagem para todos os países dispostos a enviar tropas para a Somália, de que vão enfrentar ataques nos seus territórios”, afirmou na altura do primeiro atentado um porta-voz da Al-Shabab, citado pelo New York Times.

Os atentados foram-se sucedendo e não há mês em que a Al-Shabab não reclame responsabilidade por atentados. Carros armadilhados, ataques com combatentes e bombistas suicidas são os métodos usados. Um dos ataques mais mortíferos foi levado a cabo por quatro jihadistas na Universidade de Garissa, no Quénia, que, disparando indiscriminadamente, mataram 148 pessoas, 142 delas estudantes.

Mas o ataque mais mortífero da organização foi em Outubro de 2017, quando a explosão de um camião armadilhado num hotel próximo de edifícios do governo em Mogadiscíu matou mais de 200 pessoas. Já este ano, um atentado contra um complexo de luxo na capital do Quénia, Nairóbi, matou 21 pessoas em Janeiro.

Porém, a Al-Shabab, filiada na Al-Qaeda desde 2012, vê-se agora pressionada numa outra frente. A sua hegemonia islâmica na Somália está a ser contestada pelo Daesh, que nos últimos anos tem tentado criar raízes no Norte da Somália. As duas organizações têm-se envolvido em duros confrontos.

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