EUA querem deter e deportar milhares de imigrantes sem documentos nos próximos dias
Operação da polícia de imigração norte-americana tinha sido adiada em Junho e deverá arrancar no domingo. Imagens de famílias a serem separadas, e o conhecimento antecipado dos raides, podem frustrar os planos da Administração Trump.
A partir de domingo, os agentes do serviço de imigração dos EUA vão fazer raides em dez grandes cidades norte-americanas para deterem pessoas que já receberam ordem de deportação, incluindo famílias inteiras.
A operação vai centrar-se em pelo menos 2000 imigrantes sem documentos, mas o resultado pode não ser o esperado pelos defensores da política de “tolerância zero” da Administração Trump. Para além de uma possível revolta pública, em reacção a imagens de famílias a serem separadas, muitos imigrantes começaram a preparar-se para esta operação há semanas, quando o Presidente Donald Trump a anunciou no Twitter.
Se o plano for executado no terreno tal como foi desenhado pela Casa Branca, os agentes vão ter de localizar e deter cerca de 2000 imigrantes sem documentos cujos processos foram analisados em poucos meses. Neste grupo há adultos que estão nos EUA sozinhos, mas também há famílias inteiras e pais de crianças que já nasceram no país.
Segundo o New York Times, são pessoas que entraram nos EUA no Outono do ano passado e que foram notificadas em Fevereiro para saírem do país. Muitas delas não compareceram em tribunal na data marcada pelas autoridades, e por isso ficaram expostas a um processo de deportação mais rápido.
Aviso no Twitter
Esta operação foi anunciada pela primeira vez a 18 de Junho e tinha início marcado para a semana seguinte.
Nesse dia, o Presidente Trump disse no Twitter que os agentes do ICE (Immigration and Customs Enforcement, a polícia que faz cumprir as leis de imigração no interior dos EUA) iriam começar a deportar “milhões de imigrantes ilegais que entraram de forma ilícita nos Estados Unidos”.
“Eles serão expulsos à medida que forem entrando”, declarou Donald Trump.
Mas as divergências de opinião no topo das várias agências de imigração do país (umas responsáveis pelo controlo nas fronteiras, outras no interior das cidades, por exemplo), têm dificultado os planos do Presidente Trump.
Em Abril, a saída da responsável pela Segurança Interna, Kirstjen Nielsen, em ruptura com Trump, pôs em evidência esses obstáculos. Segundo a CNN, Nielsen chegou à conclusão de que Trump “estava cada vez mais desequilibrado” nas suas ideias para a segurança na fronteira, com pedidos “irracionais e até impossíveis”. Segundo a responsável, seria impossível cumprir algumas ordens da Casa Branca sem violar a Constituição.
O Presidente Trump acabaria por adiar a operação anunciada a 18 de Junho, dando duas semanas ao Partido Democrata e ao Partido Republicano para se entenderem sobre uma nova política de asilo e imigração – um entendimento que escapa ao Congresso há mais de uma década, e que ninguém espera que aconteça numa altura em que as duas partes estão ainda mais distantes uma da outra.
Nesta quinta-feira, o jornal New York Times noticiou que os raides do ICE vão mesmo ser lançados, a partir do próximo domingo.
Falta de condições
Mas o anúncio antecipado do Presidente Trump, em Junho, deu tempo aos imigrantes em causa para se protegerem da deportação imediata. Ainda que os agentes do ICE possam localizar e deter pessoas na rua ou em outros espaços públicos, não podem detê-las nas suas casas se elas não abrirem a porta.
Para além disso, há outros dois grandes obstáculos ao trabalho dos agentes do ICE: por um lado, a polícia tem agentes a menos e um orçamento curto para cumprir, dentro da lei, todos os passos de um processo de deportação; por outro lado, é possível que alguns dos imigrantes sem documentos estejam acompanhados por filhos que já nasceram nos EUA, o que pode originar cenas dramáticas.
Nestes casos, os agentes do ICE terão de ficar com as crianças num quarto de hotel até que um outro familiar apareça para tomar conta delas, o que pode limitar ainda mais a capacidade da agência no terreno.
Para além dos raides de deportação, as péssimas condições nos centros de detenção na fronteira, em particular nos estados do Arizona e do Texas, também chocam os opositores do Presidente Trump. Nas últimas semanas, grupos de advogados, médicos, activistas e congressistas do Partido Democrata têm testemunhado situações de sobrelotação em celas onde há crianças sem acesso a refeições quentes, adultos sem espaço para se sentarem ou deitarem durante vários dias, e falta de condições mínimas de higiene.
Em parte, o problema foi provocado pelo aumento do número de pessoas a passarem a fronteira no último ano, muitas em família. As políticas de imigração mais apertadas defendidas pela Administração Trump chocam com a falta de condições nos centros de detenção, construídos para acolherem adultos não acompanhados.
Mas os números da deportação de imigrantes sem documentos estão ainda abaixo do que aconteceu durante a Administração Obama. Até Maio, foram deportadas quase 280 mil pessoas, cerca de metade com condenações por crimes – uma definição muito abrangente que inclui o próprio crime de entrada no país sem autorização, e que não implica que as pessoas em causa tenham cometido crimes violentos.
O maior número de deportações em apenas um ano ocorreu em 2012, durante a presidência de Barack Obama, quando foram deportadas 409.849 pessoas. Durante os dois mandatos de Obama foram deportados três milhões de imigrantes sem documentos.