O PS e o “pesadelo” da maioria absoluta
Daqui até Outubro, mais do que desejos sinceros sobre a maioria absoluta, o que ouviremos do PS são meias verdades. Nas quais, felizmente, ninguém acredita
Disse Carlos César: o PS precisa de uma “grande maioria”; pede Ana Catarina Mendes: o PS merece uma “maioria absolutamente inequívoca"; esclarece o ministro Luís Capoulas Santos: “é menos constrangedor um Governo que tem uma maioria absoluta do que um Governo que para tomar qualquer decisão tem que permanentemente estar a negociar essas soluções”. Casa dia que passa os socialistas aumentam o seu contorcionismo para não dizerem em público aquilo que todos já percebemos que lhes vai no sentimento: o PS quer uma maioria absoluta para se livrar dos parceiros que o apoiaram no Parlamento. E só o não diz abertamente por duas e singelas razões: para evitar perder a face e reconhecer o imaginoso artificialismo da “geringonça” e porque sabe que o país morre de medo por associar um Governo maioritário ao infeliz legado de José Sócrates.
Temos por isso de nos habituar a dar pouco valor ao que dizem as lideranças socialistas e encaixar as suas palavras numa metalinguagem que nos salva da inocência ou da ilusão. Se ninguém do PS ousa dizer que merece ou quer a maioria absoluta, são cada vez mais os que afirmam sem rodeios não querer a solução actual. Disse Carlos César que se o PS desse voz a tudo o que querem os seus “parceiros”, mais dia, menos dia, “nós tínhamos um país com uma mão à frente, outra atrás de novo e voltávamos ao tempo da bancarrota”. Acrescentou esta semana Capoulas Santos que o maior aborrecimento em ter de negociar sempre soluções obriga o PS a “torcer as suas próprias ideias”. O PS que fez de gatinho para resistir até ao fim da legislatura, engolindo “inércias” e “bloqueios” (César dixit), pode agora mostrar as suas garras e mostrar que o que no passado foi bom, passa a ser um horror para o futuro.
Mas se esta prova da inexistência da gratidão na política serve para o PS desejar intimamente uma votação que lhe permita descartar novas “posições conjuntas”, dizê-lo abertamente é um risco. Porque o PS sabe que essa atitude só faz sentido se a sua mensagem for suficientemente aberta (ou centrista) para disputar o eleitorado flutuante mais próximo do PSD. E sabe também que, sendo esse o caminho mais provável para a sua secreta ambição, percorrê-lo implica a entrega do eleitorado mais à esquerda no colo de Catarina Martins e Jerónimo de Sousa. Habituemo-nos, portanto. Daqui até Outubro, mais do que desejos sinceros sobre a maioria absoluta, o que ouviremos do PS são meias verdades. Nas quais, felizmente, ninguém acredita.