Falha na lei permite a 200 ex-políticos acumularem subvenções vitalícias e reformas sem limite
Magistrados explicam que se trata de um “enredo jurídico complexo”. Embora o Governo tenha posto fim às subvenções mensais vitalícias em 2005, existem ainda ex-políticos a beneficiarem desta lacuna na legislação.
Uma falha na lei tem permitido aos antigos políticos acumularem, sem limite, subvenções vitalícias e pensões de reforma, avança esta segunda-feira a TSF. O problema está relacionado com uma lei que remeteu ao longo de oito anos para uma legislação que estaria revogada.
Embora o Governo tenha posto fim às subvenções mensais vitalícias em 2005, juízes ouvidos pela TSF explicam que “podem ainda existir titulares de cargos políticos em situação de elegibilidade para requererem o direito à subvenção”. Segundo os magistrados, trata-se de um “enredo jurídico complexo, originado pela fragilidade do processo legislativo”.
Dados oficiais de Novembro de 2018 (enviados pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social à TSF), mostram que existem ainda 322 beneficiários de subvenções mensais vitalícias para ex-políticos, dos quais 216 beneficiam de uma acumulação de pensão e subvenção que acaba por ser superior ao salário dos ministros — o limite que esteve revogado ao longo de oito anos.
Em Junho de 1987, o Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargo Políticos foi alterado de forma a prever um “limite” para a acumulação da subvenção mensal vitalícia com as pensões de aposentação ou de reforma. Embora o limite estivesse previsto, este valor não esteve contemplado na legislação até 1995, altura em que uma nova lei instituiu o ordenado de um ministro como limite da acumulação.
Porém, esta falha na lei (que, durante oito anos, não estabeleceu um limite) continua a ter repercussões hoje em dia, uma vez que os ex-políticos que já tinham direito à subvenção vitalícia sem limite continuam a beneficiar desse direito, explica fonte do Tribunal de Contas à TSF.
Há um ano que o alerta para o problema está numa auditoria do Tribunal de Contas (focando-se nos ex-deputados da Assembleia Legislativa da Madeira), que recomendou ao Parlamento clarificar a legislação. Porém, este esclarecimento ainda não foi feito.
“Estamos perante um limite estabelecido mas não quantificado e, por isso, impossível de efectivar”, refere a auditoria, ao mesmo tempo que recomenda ao Parlamento que clarifique a lei de forma “a não subsistirem possíveis dúvidas de qual a norma aplicável quanto à sujeição ao limite na acumulação da subvenção mensal vitalícia com pensão de aposentação ou reforma”.
Segundo a TSF, só recentemente é que a auditoria chegou à Assembleia da República, pelo que o Parlamento irá agora avaliar o esclarecimento da lei de acordo com as recomendações do Tribunal de Contas.
A falha foi observada em 2014, quando a Secção Regional da Madeira do Tribunal de Contas fez uma avaliação às subvenções vitalícias pagas aos deputados regionais. Os dados mostraram que, em 2011, existiam 16 ex-deputados regionais madeirenses a beneficiar desta lacuna, o que, no total, correspondia a mais 180 mil euros por ano do que o valor que deveriam receber caso o limite (correspondente ao ordenado de um ministro) estivesse em vigor.