Clima meu, clima meu: haverá algo mais belo do que eu?

A natureza é mesmo quem mais chora com os nossos comportamentos e nós não nos apercebemos disso ou não nos queremos aperceber, por tão focados estarmos no reflexo da nossa imagem no lago.

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MIGUEL MANSO

À semelhança do que acreditamos ter com Narciso acontecido, corremos hoje o risco de, continuando geocêntricos como somos, ser extintos mais cedo do que esperamos: tudo porque nos limitamos a pensar em nós e a admirar a nossa própria existência, com foco no que é imediato.

As emissões de dióxido de carbono atingiram, em 2018, o ponto mais alto da história. Nos últimos 100 anos, com maior foco para o período que sucedeu a Revolução Industrial, a temperatura média global terrestre aumentou cerca de 0,8 graus Celsius. Animais como o golfinho, o coala e o lince-ibérico podem vir a correr risco de extinção. Apesar disto, nem tudo são más notícias. E, hoje, o que aqui me traz é o desejo de alertar e pedir que mais seja feito mas também aplaudir os pequenos passos que já foram dados.

De acordo com a ONU, em Julho de 2018 mais de 128 países (dos 195 que a mesma organização reconhece) tinham implementado alguma regulação relativa aos sacos de plástico, ora de proibição, ora de fortalecimento de impostos que incidem na produção e consumo dos mesmos. Paris (a par de outras cidades, entre as quais a própria Lisboa) tem políticas de redução da circulação de carros movidos por combustíveis fósseis em vigor. Copenhaga tem mais bicicletas do que pessoas e Bengaluru transformou 6000 autocarros em veículos de gás natural comprimido.

Podia falar de Leonardo DiCaprio ou Al Gore mas, quer pela idade, quer pela escala que tem atingido, não podia deixar de referir aquilo que, de forma mais mediática, a madura Greta Thunberg preconiza desde o final de 2018. Um brilhante exemplo; como também o são os movimentos que alertam para as consequências do excessivo consumo de carne (pela forma como os animais que a geram são criados).

O que são meia dúzia de aulas perdidas comparadas com o que diariamente destruímos nos nossos oceanos? Quão bem nos sabe um belo bife todos os dias, se isso significar toneladas de água consumidas e quantidades abismais de gases emitidos pela exploração animal?

Gostava de dizer que, também nesta crise, não precisamos de radicalismos. Mas, na verdade, acho que é precisamente de mudanças comportamentais, legislativas e comerciais radicais que, neste momento, necessitamos — mais do que nunca.

Acho importante, principalmente para quem quer informar-se sobre o que é isto do ambiente sofrer e de sermos culpados disso, que se veja o aclamado documentário Cowspiracy e se compre, via online por menos de 8 euros, o recente livro de Greta Thunberg — No One is Too Small to Make a Difference —, onde estão reunidos os seus discursos. Como tudo o que é mediático, as recomendações que fiz poderão ser algo sensacionalistas mas saber será, sempre, poder.

A natureza é mesmo quem mais chora com os nossos comportamentos e nós não nos apercebemos disso ou não nos queremos aperceber, por tão focados estarmos no reflexo da nossa imagem no lago em que calmamente vemos a nossa imagem reflectida mas pouco reflectimos. A questão é que também esse lago poderá desaparecer e, com ele, a possibilidade de nos admirarmos – enquanto indivíduos e como um todo social.

Isto já nos foi, várias vezes, recordado: nomeadamente pelo Papa Francisco, por intermédio da inédita Encíclica Papal Sobre o Cuidado da Casa Comum, publicada em Maio de 2015, pouco tempo antes da Conferência da ONU em Paris sobre a mesma temática.

Há, sem dúvida, fake news, também a respeito do ambiente. Há, sem dúvida, pessoas e movimentos mal-intencionados. Há, sem dúvida, posturas questionáveis. Há, sem dúvida, uma vontade enorme de um conjunto de pessoas verdadeiramente preocupado mudar o mundo, chavão que nunca foi tão importante concretizar.

Jovens e adultos, manifestemo-nos: no sentido literal da palavra mas, sobretudo, modificando comportamentos. Decisores políticos e comerciais, façam o mesmo. Bem sabemos do tamanho poder que nas nossas mãos reside: o de contribuir para a existência de um futuro para todos que é, inevitavelmente, sinónimo da nossa própria sobrevivência.

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